Concordância Verbal

Quando se trata de verbo, é muito difícil separar a forma (morfologia) da função (sintaxe). Talvez haja forma pura nas tabelas de conjugação verbal. Ao se tratar de aspecto verbal, por exemplo, forma, função e também significado (semântica) tornam-se indissociáveis. O tema desta semana é concordância verbal e a proposta é racionar sobre mecanismos morfossintáticos de concordância.

A regra geral de concordância verbal é esta: o verbo concorda com o núcleo do sujeito. À definição tradicional, incluiu-se a palavra “núcleo”, fundamental quando os sujeitos sintáticos são formados por mais de duas palavras. Só pode ser núcleo do sujeito sintático a palavra que seja substantivo ou esteja substantivada (ou seja, tenha um artigo ocorrendo à sua esquerda) sem preposição à esquerda desse substantivo.

Acha essa definição de núcleo do sujeito complicada? E essa história de sujeito preposicionado? Sabe onde isso se manifesta com firmeza? Na voz passiva. Só há voz passiva de verbo transitivo direto, não é? E por quê? Porque, como a preposição do verbo não pode desaparecer, se houvesse voz passiva de verbo transitivo indireto, haveria sujeito preposicionado. Exemplos:

– “Maria gosta muito das crianças” – voz ativa.

– “Das crianças são gostadas por Maria” – voz passiva hipotética inexistente em língua portuguesa.

Quer outro exemplo de vedação ao núcleo do sujeito preposicionado? Em orações como a clássica “Está na hora de a onça beber água”, deve-se separar a preposição do artigo para se garantir que a preposição não subordine o núcleo do sujeito. Outro exemplo: “O fato de o diretor estar presente garantiu a tranquilidade da conversa”.

Assim, considerando-se esses princípios e essa regra geral, em orações como “A maioria das pessoas não fez o relatório”, o verbo deve ficar no singular. Vamos raciocinar juntos:

1) Qual é o sujeito? “A maioria das pessoas”.
2) Quais palavras do sujeito são substantivos? “maioria” e “pessoas”.
3) Há preposição à esquerda de alguma delas? Sim, à esquerda de “pessoas”.
4) Então, o núcleo do sujeito é “maioria”.
5) O núcleo está no singular ou no plural? Singular.
6) Então, o verbo fica no singular.

Agora, outra situação que causa dúvida: quando há a palavra “que” empregada como pronome relativo. Exemplo: “As pessoas que participaram da reunião são estas”. Vamos raciocinar juntos:

1) Quantos e quais são os verbos do período? “participaram” e “são”.
2) Então, há dois núcleos do sujeito.
3) Qual é o sujeito de “são”? É um substantivo no plural.
4) Então, o sujeito de “são” é “pessoas”.
5) Qual é o sujeito de “participaram”? É um substantivo no plural. Poderia ser “pessoas”?
6) Seria, se não houvesse um “que” no meio do caminho…
7) Então, o sujeito de “participaram” é o pronome relativo “que” cujo antecedente é o substantivo “pessoas”, no plural.

Portanto, para confirmar a concordância de verbos cujo sujeito é um pronome relativo, é preciso saber qual é o antecedente desse pronome.

A intenção aqui é destacar que concordância verbal é um processo morfossintático-semântico bem amarrado na estrutura da oração que se desenrola raciocinando-se em termos sintáticos. Não vale ficar adivinhando ou chutando, em tentativa e erro. Vale pensar sobre as palavras, sua forma e significado, e buscar quem combina com quem.

Por fim, nesta semana, o outro pronome relativo: “quem”. Aqui, não há controvérsia no padrão culto da nossa língua: verbo sempre deve ocorrer na terceira pessoa do singular, como no exemplo: “Não fui eu quem fez o bolo”. Você consegue explicar o motivo de ser mais frequente a forma “Não fui eu que fiz o bolo”?

Quer mais explicações? Quer sugerir tema? Quer raciocinar junto? Quer questionar o raciocínio? Escreva para dicasdeportugues@cnj.jus.br.

Uma semana com concordâncias!

Carmem Menezes
Revisora de Textos da Secretaria de Comunicação Social