
Depois de termos visto os lugares onde nossa língua se faz presente pelo mundo, nesta semana vamos enfocar um lado pouco “fofo” da nossa língua: poder, preconceito e assujeitamento.
Voltemos uns séculos, à época dos descobrimentos: uma nau com uns 50 portugueses atraca em terras com 6 milhões de índios. Qual língua permanece após os contatos entre os povos? Século XVIII: Marquês de Pombal decreta a proibição de se falar língua geral em ambientes públicos. A pena? Cortar a língua do cidadão. O motivo? Garantir a prevalência do português. 1808: a família real portuguesa chega ao Rio de Janeiro para ficar. Como você acha que todos os cariocas queriam falar? A quem “imitar”?
Século XXI, novela. Se a empregada doméstica tem sotaque, qual é ele? Você já viu algum “caipira”, falando como caipira, rico?
Isso tudo não é à toa. A língua – qualquer que seja ela – sempre foi usada pelas classes dominantes para manter a estratificação social. Certos falares/sotaques são facilmente associados a certas classes sociais. O que você pensa quando ouve alguém lendo uma palavra errada?
Isso é desde sempre. Desde a formação do latim vulgar no lugar do latim erudito. Dá para perceber que a qualificação de “vulgar” e “erudito” já discrimina?
Então, é importante dizer o seguinte: certo e errado, quando se trata de língua portuguesa, são conceitos que dependem do contexto. Porque o mais importante é a adequação. Em tudo na vida. A noção de erro não pode estar associada à classe social. Se um executivo diz “reunião à nível de empresa” está tão errado quando o feirante que diz “as laranja tá tudo doce”.
Há estudos consistentes que apontam que o português do Brasil e o português de Portugal são línguas diferentes, assim como a língua portuguesa não é o espanhol. E por que tudo continua junto? Por questões políticas. Sem o Brasil, a língua portuguesa não seria língua oficial da União Europeia, por exemplo.
Assim, acabe com o seu preconceito linguístico; não discrimine quem não teve acesso ao português padrão; respeite os sotaques e as variações linguísticas; e batalhe para que todos neste país sejam como você: não só alfabetizados, mas também letrados, e com qualidade. Para que todos sejamos poliglotas na própria língua.
Mais sobre isso? Aqui, aqui e aqui.
Sugestões de temas para o próximo ano? Envie para dicasdeportugues@cnj.jus.br.
Uma semana já no espírito do Natal!
Carmem Menezes
Revisora de Texto da Secretaria de Comunicação Social
