Novas competências para a gestão

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Veja alguns casos: último prazo para o fechamento de metas. No primeiro ano, Carlos perdeu a apresentação de balé da filha, mas as metas foram alcançadas. No segundo ano, as metas aumentaram. Carlos cancelou as férias com a família e, mesmo assim, não alcançou as metas. No ano passado, ele apagou a luz do escritório e saiu. O que vai ser neste ano?

 

Paulo Henrique sempre chegou antes de todos e era o último a sair do escritório. Começou a participar de um programa de qualidade de vida no qual lhe foi desafiado aprender a delegar. No início, confiou em Marina a conclusão do relatório. O resultado não foi satisfatório para ele. Não falou nada a ela e voltou a centralizar tudo. Começou a chegar mais cedo e a sair mais tarde ainda. Não sabe nada do programa de qualidade de vida.

Nicolas estudou em uma das melhores universidades do país. Impecável na conclusão de suas tarefas, mas não consegue formar equipes. Vê sugestões como críticas e ideias diferentes das suas como ameaças. Na última avaliação teve nota dez em competência técnica e insuficiente em relacionamento. A empresa não sabe se vai manter o contrato com ele.

Rafael contava que Márcia teria feito os contatos com os clientes. Que Roberto traria as planilhas preenchidas. Dali esperavam o fechamento da proposta. A reunião terminou sem acordo e com muitas desculpas. A proposta não foi enviada. Perderam o prazo e o cliente.

Você já se viu ou reconhece algumas das situações acima? O que elas têm em comum? O que está faltando? Depois de muito observar os dramas que nos afligem, percebo que o mais amplo deles, o mais recorrente e o mais difícil de ser enfrentado, é o domínio das relações. Na vida corporativa ou no domínio dos afetos a coisa não é diferente. A esposa não consegue mais entender o marido; o filho adolescente é um estranho em casa; as coisas que antes eram engraçadas agora irritam; os amigos perderam a graça; a(o) namorada(o) perdeu o encanto; a convivência não desperta mais interesse; e o trabalho, que era a grande escapada, deixou de ser motivador. Aliás, grande parte das demissões e rupturas acontecem por deficiências relacionais e não técnicas. Ao me aprofundar nesses contextos, descubro que o pano de fundo de todos eles é a falta de inteligência relacional. Mas, afinal, o que é isso?

O conceito de inteligência vem do latim Inte Legire, ler dentro, que, associado ao conceito de relacionamento, gera nova possibilidade: Inteligência Relacional, cuja ideia é a capacidade de ler dentro dos relacionamentos; ver como eles se estruturam e como são suas dinâmicas, de modo a capacitar a intervenção nelas, visando construir resultados mais efetivos. Tal compreensão os capacita a intervir nessas relações tornando-as mais efetivas, tendo em vista os resultados que se deseja em todos os domínios da vida pessoal, social e corporativa.

Para se desenvolver a inteligência relacional, existem diversas metodologias. A que quero lhes apresentar foi proposta por Ivone Hidalgo.Trata-se de cinco dimensões que se interligam, nas quais o contexto deve ser entendido de forma a possibilitar uma intervenção segura para gerar resultados:

Gestão da Realidade  Esta competência nos desafia a entender o que, de fato, está acontecendo. Qual o contexto em que estamos inseridos e como os fatos estão sendo percebidos. Nesse domínio, o gestor deve ser capaz de separar fatos de interpretações e discernir o que é responsabilidade dele e o que depende de outros. Também compõe a gestão da realidade ser capaz de ter clareza das debilidades e competências instaladas. O desafio é identificar o contexto sem justificativas, desculpas ou explicações. Na maioria das vezes temos muita dificuldade de entender (e aceitar) que as coisas que acontecem conosco são consequência do modo como atuamos (ou deixamos de atuar). Gerir a realidade é perceber que somos os protagonistas das histórias que nos ocorrem. É claro que ingovernabilidades (coisas que não dependem de nós) ocorrem, mas, feita uma honesta avaliação da história e do contexto, vamos perceber que é uma exceção. A regra é que os resultados sejam uma consequência direta do modo como atuamos (conteúdos e formas) em decorrência daquilo que somos. Gestão da realidade é entender isso profundamente.

Gestão das Possibilidades  Nesse domínio duas coisas devem ocorrer em sequência: primeiro, o estudo sobre o que é possível, dadas as condições que estão postas, em seguida, sobre o que desejamos a mais ou melhor. Esse exercício de expectativas nos leva a entender se o que é possível já é o desejável ou se desejamos algo a mais que exigirá condições que ainda não estão presentes. O princípio que subjaz a esse momento diz o seguinte: se você não quer nada a mais, ou melhor, não há que se fazer nenhum esforço extra. No entanto, quem quer algo a mais ou melhor, deve esforçar-se mais e criar as condições necessárias para que o “algo a mais” ocorra. A noção básica desse nível é sermos capazes de ver a diferença entre a competência instalada (em nós, na empresa, unidade de trabalho, etc) e a competência desejada. Muitas pessoas, nesse momento, argumentam que se não há possibilidades instaladas, o máximo que vai ocorrer é frustração. Veja bem, se nós nos contentássemos com o que temos, provavelmente estaríamos ainda nas cavernas. Todo o desenvolvimento humano, pessoal, social ou corporativo deve-se a pessoas que são capazes de ver possibilidades onde outros só veem limitações. Ver possibilidades para além daquelas que a situação permite nos capacita a cuidar do que podemos, e desenvolver competências para alcançar aquilo que “ainda” não podemos. Isso nos remeterá à próxima fase.

Gestão das Ações e dos Resultados  Analisar se o que temos obtido está de acordo com nossas expectativas e condições de satisfação. Se não, há aí um enorme espaço para discutir a efetividade das ações. Essa análise é que permite entender que muitas vezes os problemas se repetem porque não mudamos nosso fazer. Se você não muda, o resultado também não muda. Se você deseja que algo diferente ocorra, você deve fazer algo diferente. É parte dessa fase construir “ações novas” para alcançar objetivos novos. Tratar problemas e desafios novos com ações antigas é uma fórmula para o fracasso e a frustração. Por fim, gerir ações e resultados é construir indicadores que nos sinalizem a todo tempo nosso progresso (ou não) para nos permitir, em tempo real, fazer as devidas correções de rota ou as celebrações de resultados.

Gestão dos Relacionamentos  Aqui temos de fazer algumas perguntas para nos encaminhar em um processo de desenvolvimento: com quem preciso me relacionar para dar conta de algo que desejo? Com quem preciso deixar de me relacionar? Que mudanças relacionais preciso fazer para conseguir tal objetivo? Qual o grau de confiança que tenho nas pessoas que me cercam nas atividades pessoais, corporativas e sociais? Como lido com a autoridade e com as limitações das pessoas? Essas e muitas outras perguntas podem ser feitas para que eu tenha noção exata do que acontece comigo. Inúmeros projetos com excelente base técnica, propostas inovadoras, ações muito inteligentes ficam nas gavetas, não são aprovadas, nem sequer considerados, não porque sejam “ruins” ou tecnicamente frágeis; mas porque o nível relacional requerido não é suficiente. Muitos executivos investem tempo e recursos em sua formação técnica. Isso é louvável. Mas a pergunta que faço: quanto tempo você tem investido em construir relacionamentos efetivos, profundos, sinceros, sérios? Isso requer profunda habilidade social e diferenciação dessa habilidade que desejamos ampliar, do conhecido “puxa saquismo”, que é a pior forma de relacionamento.

Gestão da Aprendizagem  Geri-la significa ser capaz de entender o que aprendemos com todo o processo vivido. Requer o registro histórico de todos os momentos que passamos, tudo que vivenciamos, toda a informação adquirida, todos os problemas enfrentados, toda a emocionalidade envolvida, de modo gerar conhecimento. Do ponto de vista do desenvolvimento humano essa gestão é a que mais resultados traz a longo prazo. Na verdade, trata-se de se criar um hábito com o qual vamos nos qualificando para analisar problemas e tomar decisões como maior efetividade, em menor tempo, com menor custo e gerando conhecimento efetivo. Alguém já disse que quem não aprende com os erros cometidos por si ou por outrem, corre sério risco de cometê-los novamente. Gerir a aprendizagem é considerar cada experiência da vida como um forte insumo para os próximos passos, rumo ao futuro.

Homero Reis é Consultor Sênior e Coach Master na Homero Reis e Consultores

Fonte: Você RH