Criados há 25 anos pela Lei nº 9.099/1995 para desburocratizar o acesso à justiça, os Juizados Especiais enfrentam um dilema. Os princípios da simplicidade, informalidade, oralidade, economia processual e celeridade que envolvem esses órgãos passaram a ser priorizados para resolver problemas cotidianos de qualquer cidadão, de forma rápida, eficiente e gratuita. Mas a procura excessiva a esse instrumento da Justiça tem prejudicado o seu funcionamento.
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Preocupado com a sobrecarga dos Juizados Especiais, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) reuniu nesta quinta-feira (13/8) magistrados de todo o país para debater como aprimorar os juizados e mantê-los fiéis aos princípios que lhe deram origem. “Os juizados especiais são importante instrumento de democratização de acesso à Justiça, na medida em que sua origem teve como objetivo atender aos anseios dos cidadãos, principalmente os mais desprovidos, que buscam a solução de seus conflitos por meio da prestação de uma tutela rápida, econômica e segura”, afirmou a conselheira do CNJ Candice Lavocat Galvão Jobim.
Os Juizados Especiais são conhecidos por serem uma alternativa para a solução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo – muitas vezes resolvidas por conciliação. Entretanto, hoje eles já respondem por 35% dos processos apresentados à Justiça anualmente. Em 2019, foram 7 milhões de conflitos que chegaram à Justiça pela via dos Juizados Especiais. E o tempo médio de duração de uma ação nos juizados especiais da Justiça Estadual está aumentando desde 2015, passando de um ano e um mês para um ano e nove meses, em 2019.
A conselheira coordena desde setembro de 2019 o Grupo de Trabalho destinado à elaboração de diagnósticos e de estudos e à proposição de melhorias na estrutura e na atuação dos Juizados Especiais Estaduais, Federais, Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública. Mudanças administrativas, como na indexação das informações relativas à movimentação do processo, e legislativas, como um anteprojeto de lei para mudar o regime de custas, estão entre os resultados das discussões do grupo, integrado por representantes de diferentes instâncias e ramos da Justiça.
Um terceiro produto do grupo foi a proposta de criar, por meio de resolução do CNJ, uma “coordenadoria nacional dos juizados especiais, com o propósito de desenvolver, fomentar e supervisionar iniciativas em caráter permanente para aprimorar os serviços prestados nos juizados especiais”, afirmou Candice Jobim.
O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, representando o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, destacou que a intenção do seminário não é apenas comemorar os 25 anos da Lei nº 9.099/95, mas sobretudo contribuir para que o Poder Judiciário possa cada vez mais se consolidar no papel de garantidor dos direitos fundamentais, que lhe foram confiados pela Constituição Federal.
Segundo o ministro, a criação dos Juizados Especiais representou uma verdadeira revolução no sistema jurisdicional brasileiro, liberando-o das amarras formais e conservadoras do processo tradicional. “A Lei nº 9.099/95 foi a precursora do movimento de incentivo à conciliação e mediação, que hoje é importante instrumento em todas as esferas do Direito e essencial à conclusão pacífica dos conflitos.”
Humberto Martins citou também a edição da Recomendação nº 37/2019 da Corregedoria Nacional de Justiça, que dispõe sobre a instalação e a implementação da Justiça Itinerante. E destacou a decisão do Plenário do CNJ que assegurou ao cidadão não assistido por advogado o direito de peticionar diretamente pelo PJe, no âmbito dos juizados especiais cíveis, com um certificado digital.
Agilidade
O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, defendeu menos “ritos burocráticos” para cumprir o objetivo dos Juizados Especiais de solucionar causas importantes de forma mais ágil. “Não se justifica uma decisão de um Juizado Especial com 10, 15 laudas. Tudo deve sintético. Mais que isso, rápido. Os Juizados Especiais estão congestionados, muitas vezes por burocracias. É fundamental que levemos em conta o tempo. O tempo é fundamental no sucesso. Repugna o bom senso que causas aguardem decisão há 2 anos. Retornemos às origens, à simplicidade. Precisamos pensar no objetivo dos Juizados Especiais, que é a celeridade. A celeridade é que dá eficácia. Eficácia é que dá prestígio à Justiça.”
A presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Renata Gil, afirmou que o grande desafio da Justiça é a efetividade de suas decisões. “Analisando o sistema de Juizados Especiais, temos mecanismos para acelerar essa efetividade e entregar um tempo reduzido de processo, que é o que a população espera de nós.”
Segundo o presidente da Ajufe, Eduardo Brandão, a importância dos Juizados Especiais Federais foi reafirmada no contexto da pandemia. “Ficou demonstrado na pandemia como são essenciais os Juizados Especiais, sobretudo na concessão de benefícios previdenciários e emergenciais.”
O conselheiro Henrique Ávila, que também integra o Grupo de Trabalho dos Juizados Especiais, destacou a importância dos juizados especiais para a política nacional da conciliação, inaugurada pelo CNJ em 2010. “A Lei 9.099/95 é indissociavelmente vinculada à política nacional da conciliação. O acesso à justiça era um antes da Lei 9.099 e se tornou outro depois da lei. É evidente que precisa de avanços. Como toda instituição jurídica, é preciso evoluir e temos trabalhado nisso.”
Segundo o subprocurador-Geral da República, Alcides Martins, o advento dos juizados representou um marco institucional na história do Estado brasileiro, em resposta aos problemas da morosidade e falta de acesso à Justiça no país. “Os juizados especiais reduziram as desigualdades entre jurisdicionados, com a isenção de custas e de taxas processuais e dispensando a obrigatoriedade de constituição de advogados para que um cidadão recorra à Justiça.”
De acordo com o promotor de Justiça do Acre, Oswaldo D’Albuquerque, o CNMP instituiu por meio da Resolução nº 118/2015, a política nacional incentivo à composição no Ministério Público, o que levou o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte a se destacar nas práticas restaurativas. “O MP-RN implantou nas suas rotinas formações técnicas e criou núcleos locais de assessoramento técnico permanentes, em que são transmitidas técnicas de negociação, mediação e conciliação, que são utilizadas em audiências dos juizados especiais”, afirmou. D’Albuquerque, que também é conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), representou o presidente do órgão, o procurador-geral da República, Augusto Aras.
Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias
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