O ministro Carlos Alberto Reis de Paula, do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e integrante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), vai deixar o cargo de conselheiro em março quando assumirá a presidência do TST. No CNJ, ele preside a Comissão de Gestão Estratégica, Estatística e Orçamento cujo desafio é convencer os magistrados da importância do planejamento na administração dos tribunais. Para ele, a gestão estratégica é fundamental para “mudar a Justiça” e tornar a prestação jurisdicional mais eficiente. Em entrevista à Agência CNJ de Notícias, o ministro elencou os passos necessários para que os tribunais desenvolvam uma gestão profissional de seus recursos. Veja os principais trechos da entrevista.
Qual a importância da gestão estratégica para os tribunais?
Eu não me canso de dizer que o CNJ veio para mudar a Justiça brasileira. Um dos maiores fenômenos atuantes nessa mudança é colocar para os 90 tribunais do País que não se administra sem planejamento. A gestão tem de envolver o planejamento estratégico, que tem várias nuanças. Quem estuda administração, sobretudo administração pública, sabe que temos de fazer diagnósticos e, a partir destes, estabelecer objetivos, fixar os meios e fazer o acompanhamento para saber se estamos ou não caminhando em direção aos objetivos. Isso é de extraordinária importância. Para a gestão estratégica é preciso usar estatísticas, números valiosos, porque a partir daí você pode estabelecer as metas. Como mexemos com dinheiro público, tem de haver orçamento.
Os tribunais brasileiros já estão conscientes quanto à importância do planejamento e da gestão?
Temos de fazer uma diferenciação, porque há a Justiça Federal e a Estadual. Quando digo Justiça Federal, digo a Justiça Federal, a Justiça do Trabalho, a Justiça Eleitoral, os tribunais superiores e o Supremo Tribunal Federal, que está fora da jurisdição do CNJ. Em relação à Federal, temos o orçamento federal e a presença do CNJ fica mais fácil; já a Estadual vai depender de cada estado. O que temos de fazer é estabelecer rumos para o planejamento estratégico que se articulem com o governo estadual.
Fala-se que o juiz não é administrador, mas tem de administrar, principalmente quando assume a presidência de um tribunal. Isso está mudando?
O juiz não é administrador. Na prova para ingresso na magistratura não se exige conhecimento de administração. Mas o juiz tem de se qualificar para ser um administrador. A nossa Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento dos Magistrados do Trabalho (Enamat) realiza cursos visando à formação, ao aprendizado daqueles que vão assumir a administração dos tribunais do Trabalho. Nós temos de viver o Brasil novo. O administrador tem de conhecer um pouco de administração, tem de ter formação, tem de entender de orçamento, tem de entender de empenho, de licitação, de gestão de pessoas. Não precisa ser especialista, mas ele dirige o trabalho, então tem de entender.
Há quanto tempo a Enamat promove esses cursos?
Desde que fui diretor da Enamat, em 2007, realizamos cursos de formação para aqueles que vão se tornar administradores de cada segmento do Poder Judiciário. No quadro de disciplinas que temos na escola, temos disciplina sobre administração das varas. O juiz substituto tem de entender como se administra uma vara, porque o juiz presidente da vara administra uma vara. As escolas federais foram criadas com a Emenda Constitucional n. 45, de 2004. Por orientação do CNJ, todos os tribunais estaduais devem ter escolas para formação e aperfeiçoamento dos magistrados. Vários as têm. A partir da Emenda n. 45, o juiz tem o dever de se formar e aperfeiçoar, não só no estágio probatório, mas durante todo período em que exercer a função jurisdicional. A sociedade tem o direito de cobrar a formação e o aperfeiçoamento do magistrado.
A comissão que o senhor preside no CNJ tem também atribuições relacionadas ao orçamento, que costuma ser um problema para os tribunais. Como o CNJ pode ajudar os tribunais a negociar melhor seus orçamentos?
Orçamento existe por se tratar de dinheiro público. Só posso gastar dentro da previsão orçamentária. Não posso gastar dinheiro de pessoal para comprar móveis, construir prédios. O orçamento no Brasil, na minha ótica, tem grave pecado: tirando algumas vinculações, como saúde e educação, há questão fundamental: o nosso orçamento não é vinculativo, é programático. Por exemplo, o orçamento pode prever que o governo tem de construir três milhões de casas, mas pode ser que não aplique nada, porque o orçamento é autorizativo. Os tribunais estaduais dependem das assembleias legislativas. O Orçamento da União deste ano, quando encaminhado pelo Supremo Tribunal Federal ao Executivo, previa reajuste de quase 8% para os magistrados no próximo ano. A presidenta da República o encaminhou ao Congresso com a ressalva de que daria só 5%, mas o Legislativo tem a palavra final e vai aprovar 5%. O problema é que orçamento é uma obra política. Então, depende da cabeça de cada Poder, se o Poder valoriza, ou não, o Judiciário. Aí está a resposta nos problemas enfrentados pelos 26 tribunais de Justiça dos estados.
Há vários anos o Judiciário Federal pede aumento de salário. O senhor acha possível conseguir melhorar os salários?
Não vai conseguir. Nós estamos sem aumento de salário há seis anos. O governo está propondo um reajuste e está nos tratando como se fôssemos servidores públicos. Está dando 5%, mesmo índice concedido aos servidores públicos federais. Nós estamos há seis anos sem reajuste, nossa defasagem chega a vinte e tantos por cento. O governo não vai dar aumento, vai dar reajuste. Mas isso é também obra de política, sob a coordenação do presidente do CNJ, também presidente do Supremo, mas a atuação de natureza política é feita na condição de presidente do CNJ.
O CNJ deveria, então, assumir a articulação política?
Deveria fazer. Nós criamos uma Comissão Permanente de Articulação Federativa e Parlamentar, presidida pelo conselheiro Bruno Dantas, da qual eu faço parte. Essa articulação também não visa ao aumento da dotação orçamentária. A questão de orçamento é do presidente do CNJ, com apoio e respaldo dos conselheiros. Isso é questão institucional, não é da comissão.
Em março o senhor assume a Presidência do TST. A experiência no CNJ vai ajudar de alguma forma o seu trabalho como presidente?
Sou professor da UnB (Universidade de Brasília) e me aposentei no dia 3 de dezembro. Vou me desligar do CNJ no dia seguinte à minha posse no TST, que será em 5 de março, porque terei na presidência do TST mandato de dois anos, mas só cumprirei por pouco mais de 11 meses (por causa aposentadoria compulsória aos 70 anos). Qual foi a importância do CNJ? Eu sou um homem abençoado: fui diretor da escola, após fui corregedor-geral da Justiça do Trabalho, cresci como juiz, conheci a Justiça do Trabalho brasileira na atuação correicional, para ajudar os tribunais a ter gestão. Fui para o CNJ e convivi com 14 colegas da mais alta qualidade técnica e profissional e seriedade, sobretudo nos compromissos constitucionais. Conheço um pouco da Justiça brasileira em todos os seus segmentos. É um privilégio. Conheci muito, mas tenho ainda muito a aprender na minha vida.
O presidente do TST é também presidente do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Há impedimento à sua continuidade no CNJ?
Por questão regimental, o conselho é presidido pelo presidente do TST. O Conselho Superior da Justiça do Trabalho é um CNJ em miniatura, só que não tem poderes correicionais. O corregedor que temos aqui integra o quadro do tribunal. Não há impedimento legal a que o presidente do tribunal continue no cargo de conselheiro, mas há inviabilidade prática. Usando uma linguagem que as pessoas conhecem, eu não gosto de fazer nada à meia boca. Eu não conseguirei ser presidente do TST, cargo que pretendo exercer 24 horas por dia, com o mandato de conselheiro do CNJ. O conselho me absorve muito: presido uma comissão e participo de outras duas, tenho de atender a advogados e partes, tenho de acompanhar processo, não temos recesso, continuo levando o computador para casa. Não há no meu gabinete um processo atrasado. Não consigo manter isso sendo presidente do tribunal. O presidente do TST é coordenador da Justiça do Trabalho como presidente do conselho. Vou coordenar 24 tribunais regionais; incluindo os terceirizados, são quatro mil servidores só aqui em Brasília.
Gilson Luiz Euzébio
Agência CNJ de Notícias