O enfrentamento ao assédio sexual e moral é uma luta de todas as pessoas que desejam uma sociedade mais justa e equânime. Esse preceito orientou a palestra “Assédio sexual e moral nas Forças Armadas” durante o I Seminário sobre Direito e Justiça Militar no Brasil realizado na terça (21) e quarta-feira (22/9). Promovido em formato híbrido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com o apoio do Superior Tribunal Militar (STM) e da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados da Justiça Militar da União (Enajum), o evento reuniu cerca de 300 participantes.
Um panorama sobre a questão nas Forças Armadas foi apresentado pela juíza substituta da 1ª Auditoria do Conselho da Justiça Militar (CJM) Mariana Aquino. Ela expôs dados de estudo sobre assédio sexual em instituições militares, detalhando que esses abusos são classificados como crimes militares extravagantes, com pena de detenção de um a dois anos.
A magistrada afirmou que as mulheres seguem sendo as principais vítimas. Conforme a pesquisa, algumas vítimas de assédio sexual nas Forças Armadas relataram dificuldade em denunciar os abusos por terem sido cometidos, em várias situações, por pessoa em posição superior na hierarquia militar e também por temerem represálias. De acordo com o levantamento, das quase 2 mil entrevistadas, 74% já sofreram algum tipo de assédio sexual no trabalho.
Mariana Aquino explicou que nem todo elogio, flerte ou paquera configura assédio sexual e que seu limite é dado pela opressão. “Existe um limite e esse limite é o constrangimento. Quando é algo recíproco, e acontece muito de as pessoas se envolverem no ambiente de trabalho, onde passamos a maior parte do tempo, não há problema algum. Agora, se há constrangimento, se não há reciprocidade ou se há superioridade hierárquica, obviamente a questão muda.”
A juíza recomenda que as vítimas de assédio sexual façam, independentemente da forma como os abusos ocorram e em qualquer situação, seja no trabalho ou não, registros detalhados das abordagens para fundamentar relatos e provas. Nas instituições militares, as possibilidades de denúncia são a comunicação por escrito à autoridade militar superior, ao Ministério Público ou ao Ministério Público Estadual nos casos ocorridos em polícia militar e por meio do Ligue 180.
Especificamente nas Forças Armadas, Mariana tem sugerido a realização de aulas sobre violência de gênero nos cursos de formação, palestras periódicas sobre o tema e cartilhas a fim de disseminar informações sobre abordagens que podem ser caracterizadas como abuso sexual.
Hierarquia e disciplina
A ministra do STM Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha explicou que militares não se encontram imunes a situações de assédio moral e a questão requer cuidados considerando a estrutura da carreira caracterizada pela hierarquia e disciplina. Nesse contexto, os comandantes possuem responsabilidade vital por caber a eles a apuração das alegações ocorridas sob suas respectivas administrações.
Ao detalhar as condutas classificadas como assédio moral, a ministra fez um alerta para o fato de que não se pode confundir submissão ao comando exercido dentro dos legítimos limites da autoridade com a submissão ao assédio moral. “O rigor inerente à profissão das armas, exercido no contexto da legalidade, não há de ser encarado como assédio moral de onde decorre a relevância da questão para o direito militar porque, em contrapartida, a estrutura verticalizada pode em tese, sim, propiciar ambiente para coações e constrangimentos psicológicos.”
A conselheira do CNJ Tânia Reckziegel, que presidiu a mesa do painel e integra a Comissão Permanente do CNJ de Aperfeiçoamento da Justiça Militar, afirmou que o assédio moral e sexual são problemas que atingem a todas as pessoas e que é preciso mobilização para que sejam combatidos. Ela frisou que o Conselho está atendo ao problema e citou como iniciativa relevante a aprovação da Política de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, Sexual e da Discriminação a ser observada pelos órgãos de Justiça. “Esse é um problema que atinge a todos, no Judiciário, nas Forças Armadas e, como desembargadora do trabalho, posso confirmar que também nas relações privadas. E precisamos todos estarmos unidos para combater esse problema que é muito grave.”
Luciana Otoni
Agência CNJ de Notícias
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