A construção da Plataforma P-58 da Petrobras, no Polo Naval de Rio Grande, no Rio Grande do Sul (RS), gerou cerca de 18 mil postos de trabalho diretos (4,5 mil) e indiretos (13,5 mil). No entanto, após a conclusão da obra, anunciada no final de 2013, cerca de 7,5 mil trabalhadores, dos quais pelo menos a metade era de terceirizados, foram demitidos. Conflito posto, o governo estadual buscou o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4) para mediar a negociação entre patrões e empregados e evitar caos social. O resultado foi tão positivo que rendeu à corte trabalhista gaúcha o V Prêmio Conciliar é Legal, concedido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na categoria Demandas Complexas ou Coletivas.
A conciliação envolveu o Estaleiro CQG-QUIP, dezenas de empresas terceirizadas, sindicatos de trabalhadores e órgãos como o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Delegacia Regional do Trabalho (DRT), o Sistema Nacional de Empregos (Sine) e a Caixa Econômica Federal (CEF), que montou um posto no local para agilizar o saque do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e do seguro-desemprego dos demitidos. O estaleiro acabou assumindo todas as responsabilidades financeiras que as contratadas não honraram.
O juiz Carlos Alberto Zogbi Lontra, que conduziu cinco das sete reuniões de mediação, conta que, além do estaleiro, havia cerca de 50 outras empresas menores atuando na construção da P-58. “Havia quarteirização e até quinteirização de atividades e muitas dessas prestadoras de serviço sumiram sem pagar os direitos trabalhistas de seus empregados. Ainda assim, conseguimos, primeiro, que o consórcio responsável, o CQG-QUIP, assumisse a responsabilidade pelo pagamento dessas verbas rescisórias”, lembra.
Outro resultado positivo da mediação foi o pagamento das despesas de viagem de cerca de cinco mil trabalhadores de outros estados, registrados pelos empregadores como se fossem residentes em Rio Grande. Esse tipo de fraude, explica Lontra, é uma estratégia adotada por empresas que se eximem da responsabilidade pelo deslocamento dos trabalhadores para diminuir seus custos. “Imagine um contingente dessa magnitude sem emprego, de um dia para o outro, e sem dinheiro para voltar aos seus estados de origem ou até suprir suas necessidades básicas”, avalia Lontra.
Dos outros 2,5 mil demitidos, pelo menos 2 mil foram imediatamente contratados pelo Estaleiro Ecovix, vencedor da licitação para construção de novas plataformas no local. Outros cerca de 500 funcionários foram encaminhados para empregos diversos pelo Sine. Ao todo, foram sete reuniões de conciliação. Duas delas coordenadas pela presidente do TRT4, Cleusa Regina Halfen.
Lontra ressalta que mesmo tendo resolvido as situações mais urgentes, o acordo preservou o direito dos trabalhadores de recorrerem à Justiça para buscar reparação de perdas que entendam não ter sido sanadas na mediação. “Hoje, há pouco mais de cem processos tramitando, mas, se não tivesse havido a conciliação, seriam milhares”, pondera o juiz.
Reconhecimento – O reconhecimento da importância do trabalho desenvolvido pelo TRT4 para a disseminação de práticas de mediação e conciliação no âmbito do Judiciário foi recebido com alegria por toda a equipe envolvida. “Mais do que buscar reconhecimento, inscrevemos essa prática para divulgá-la como um modelo que pode ser adotado por outras regiões, outros tribunais, enfim, pela sua relevância, pois ela foi importante sobretudo por evitar graves problemas sociais e um congestionamento do Judiciário”, pondera.
O sucesso da mediação inspirou a aplicação do mesmo modelo em outros dois casos de demissão em massa. Qualquer uma das partes envolvidas pode solicitar a mediação do Juízo de Conciliação do TRT4. O primeiro objetivo do tribunal, nesses casos, é tentar evitar a despedida anunciada. Não sendo possível, os esforços passam a ser feitos para garantir o pagamento das verbas rescisórias pela empresa ou pelo tomador do serviço.
Menções honrosas – A corte trabalhista da 4ª Região também recebeu menção honrosa na categoria Tribunal Regional do Trabalho do Prêmio Conciliar É Legal, com o acordo feito pelo Juízo Auxiliar de Conciliação com a Universidade da Região da Campanha (URCAMP), mantida pela Fundação Attila Taborda, com sede em Bagé (RS). A negociação resultou na quitação do passivo trabalhista da instituição, que gerava bloqueios e penhoras judiciais, e lhe permitiu pôr a folha de pagamento dos trabalhadores em dia.
Já na categoria Demandas Complexas ou Coletivas, a menção honrosa foi para o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) por audiência de conciliação em matéria ambiental de alta complexidade. A prática resolveu um conflito que já durava décadas e envolvia cerca de 1,5 mil famílias que haviam adquirido terrenos na praia de Ibiraquera, no município de Imbituba (SC). A área foi loteada nos anos 70 e abrangia terreno de marinha e área de preservação permanente da Baleia Franca.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região também foi reconhecido como o tribunal federal do país com maior índice de composição na Semana Nacional de Conciliação 2014, realizada entre 24 e 28 de novembro. Durante o período, foram realizadas 5,5 mil audiências que resultaram em 2.408 acordos, movimentando cerca de R$ 28 milhões.
Premiação – Lançado em 2010, alinhado à Resolução n. 125/2010 do CNJ, o Prêmio Conciliar é Legal é uma iniciativa do Comitê Gestor Nacional da Conciliação, coordenado pelo conselheiro Emmanoel Campelo, e reconhece práticas de sucesso, estimula a criatividade e dissemina a cultura dos métodos consensuais de resolução dos conflitos em todo o país.
A avaliação e o julgamento das práticas inscritas privilegiam eficiência, restauração das relações sociais, criatividade, satisfação do usuário, alcance social e desburocratização. Nesta quinta edição houve premiação em oito categorias: Tribunal Estadual; Tribunal Regional do Trabalho; Juiz Individual; Instrutores de Mediação e Conciliação; Advocacia; Demandas Complexas ou Coletivas, Sociedade Civil e Ensino Superior.
Elizângela Araújo
Agência CNJ de Notícias