Em pleno Século XXI, cerca de 43% dos brasileiros vivem em cidades sem rede de tratamento de esgoto, segundo o Ministério das Cidades. Na Região Nordeste, o índice atinge quase 70%. A situação precária chamou a atenção de defensores públicos do Maranhão, vencedores da última edição do Prêmio Innovare, na categoria Defensoria Pública, com o programa “Hipervulneráveis e o acesso ao saneamento básico: do esgoto ao mínimo existencial”. O programa consiste na identificação de bairros carentes de São Luís que não contam com redes coletoras de esgoto e abastecimento regular de água, e busca de soluções na companhia de abastecimento do estado.
“Os hábitos mais simples do cotidiano da pessoa pobre, como almoçar e descansar após a refeição se tornam indignos, por conta do odor fétido causado pelo esgoto a céu aberto na porta de suas casas”, afirma Alberto Bastos, defensor público há quase seis anos e idealizador do projeto. Ele explica que, apesar de ter 404 anos de fundação, a capital maranhense ainda convive com problemas medievais, com a falta de tratamento de esgoto.
Apesar da situação precária, o Núcleo de Defesa do Consumidor, onde ele atua, não recebia demandas relativas ao grave problema. “A ideia do projeto surgiu pelos dados estatísticos alarmantes noticiados na imprensa local sobre a péssima qualidade dos serviços de saneamento básico ofertados. Inicialmente, foi atuação proativa dos membros da Defensoria Pública”, conta o defensor.
Em pouco mais de um ano, a ação já beneficiou três grandes bairros, atendendo mais de 4 mil pessoas. Gente como Augusto Cesar, um aposentado de 65 anos, cadeirante que dividia uma casa simples com a esposa, filhos, netos e convivia com a falta de saneamento.
Portador de doença renal crônica, ele era submetido ao tratamento constante de diálise e contava com a ajuda de familiares e vizinhos para atravessar, na cadeira de rodas, o esgoto que corria em frente à residência.
Em conversa com a equipe da Defensoria Pública, o aposentado afirmou não ter qualquer esperança de ver mudança naquela situação. Em dezembro do ano passado, no entanto, após a intervenção dos defensores junto à Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema), o esgoto passou finalmente a ser coletado. “Ele ficou tão feliz com a resolução do problema que tomou banho de chuva na noite do Réveillon”, conta Augusto Cesar.
São histórias como a de seu Augusto que motivam a continuidade do trabalho, que tem como parceiros alunos e professores do curso de engenharia civil de uma faculdade privada, do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Maranhão e da Ouvidoria Externa da Defensoria Pública do estado.
Saúde pública – Além de afetar a dignidade das pessoas, a falta de saneamento básico é considerada um problema de saúde pública, pois expõe a população a doenças em virtude do contato diário com ambientes insalubres. De acordo com o idealizador do projeto, a ação pode ser replicada com facilidade em outras localidades. “Basta ter uma instituição de ensino superior com curso de engenharia para realizar um convênio para elaborar laudos técnicos aptos a respaldar requerimentos de implementação dos serviços de saneamento básico”, resume Augusto Cesar.
O Prêmio – Criado em 2004, o Prêmio Innovare é considerado a mais importante premiação da Justiça brasileira. Em 12 anos, foram cerca de cinco mil práticas inscritas e mais de 150 delas premiadas. A realização é do Instituto Innovare, da Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, da Associação de Magistrados Brasileiros, da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Associação Nacional dos Procuradores da República e da Associação Nacional dos magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), com o apoio do Grupo Globo.
Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias