Trabalho e estudo dão eixo à rotina dos presos nas melhores prisões de São Paulo. Das 281 unidades locais, apenas três são avaliadas como excelentes por juízes, segundo dados do Geopresídios, sistema mantido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Todas são centros de ressocialização e duas delas empregam 100% dos internos.
Em Rio Claro, por exemplo, o centro de ressocialização (CR) emprega os 241 detentos. Duas empresas internas e sete externas usam a mão de obra, respectivamente, de 111 e de 74 deles. Outros 56 detidos ocupam postos dentro do presídio, como cozinha, limpeza e jardinagem.
Nem sempre foi assim. “Há cinco anos, não conseguíamos ter todos trabalhando. Procuramos os empresários, mostramos a eles que podem acreditar nas pessoas. Foi um trabalho de convencimento, de quebra de paradigmas. Hoje, a procura é maior que a oferta”, detalha Márcio dos Santos, diretor técnico do presídio desde 2008.
Para captar contratos, a direção do centro telefonava para empreendedores. “Chamávamos para conhecer a unidade, ver como é. Ficam espantados quando chegam, dizem que nem parece presídio”, relata Santos. Fatores locais também jogam a favor: a cidade abriga fábrica, que contrata presos, com a maior planta de transformação de PVC do mundo.
Ao fim do expediente, mais de dois terços dos internos — 170 dos 241 — estudam no CR. Nove professores estaduais dão as aulas, de segunda a sexta, das 18h às 22h. Os réus fora de sala já concluíram o ensino médio, nível máximo de formação ofertado no local. Para eles, a direção prioriza cursos profissionais.
Quadro similar é encontrado no primeiro e maior CR, em Bragança Paulista. Os 262 internos estão empregados — cerca de 230 deles dentro do presídio. “As empresas internas são as mesmas desde a abertura, em 2000. Sempre conseguimos que todos os presos trabalhassem”, diz Solange Silva, diretora técnica do centro.
Antes de torna-se centro de ressocialização, a prisão aplicava o modelo APAC em parceira com organizações não governamentais. Muitos contatos profissionais surgiram à época, segundo a diretora. Com o tempo, empresários souberam da mão de obra via boca a boca. “Um passa para o outro. Elogiam o trabalho e a economia”, relata.
Por lei, o reeducando pode receber 75% do salário mínimo pelo serviço. Empregar detentos, além do pagamento menor, reduz outros custos. Como a Consolidação das Lei do Trabalho (CLT) não se aplica ao apenado, o empregador livra-se de obrigações com férias, 13º salário e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
Entre ensino formal ou técnico, 115 internos estudam no CR bragantino. Por sua vez, a assistência social interna baixou a taxas mínimas — por vezes, nula — o total de réus que não volta após saídas temporárias. “A condição do preso é importante para nós. Ele paga a pena, mas com dignidade. Fazemos o possível pelo trabalho e estudo”, diz Solange.
No maior mutirão carcerário até então, em 2011, o CNJ visitou o centro. “É positivo quando o conselho vem à unidade. Gostaram do que viram”, lembra a diretora. Para ela, o Judiciário facilita a atuação dos CRs. “O trabalho dos juízes nos ajuda na pena e na ressocialização. O preso também quer que o processo dele ande”, afirma.
Análise define ingresso nos centros de ressocialização
Nenhum dos 22 CRs possui avaliação negativa de juízes: além dos três excelentes, 12 estão bons e sete regulares. Em média, eles têm cerca de 200 vagas e operam abaixo do limite. Padrões automáticos de inclusão, adotados em prisões para provisórios, não são seguidos neles. Em vez disso, alojam presos após análise objetiva e subjetiva.
São aceitos apenas réus primários. Se condenados, não podem ter recebido pena superior a dez anos e, se provisórios, não ter expectativa de pena superior ao mesmo prazo. Eles tampouco podem responder a nenhum outro processo criminal. Entre as condições, o interno deve morar, no máximo, 200 quilômetros distante da unidade.
Cada detido também é entrevistado antes do ingresso. Participam da conversa assistente social, psicólogo e os diretores de segurança e de disciplina CR. Membros de facções criminosas são vetados.
Inspeção de juízes verifica serviços prestados aos presos
Dois dos centros com conceito excelente — Rio Claro e Limeira — são inspecionados pelo juiz Luiz Augusto Barrichello, titular da 2ª Vara Criminal de Limeira. “A classificação tem a ver com o próprio modelo dos CRs. Tenho outros dois deles sob minha jurisdição, que temos tentado melhorar”, informa o magistrado.
O porte dos centros preserva a qualidade do serviço, ao ver de Barrichello. “Antes de mais nada, o atendimento está na lei. Em unidades maiores, é difícil manter o mesmo nível de suporte. Nos CRs, o interno recebe todo tipo de assistência. Claro que não é perfeito, varia entre eles”, conta o juiz.
Em Limeira, 190 dos 227 presos (84%) trabalha, conforme a Secretaria da Administração Penitenciária. Mais da metade deles (117) estuda, em ensino formal ou técnico. A unidade oferta cursos de corte de cabelo, informática e padaria artesanal. “Todos preferem deixar o preso ocupado. É difícil, mas queremos que mais deles trabalhem”, diz Barrichello.
Vistoriar as unidades contribui para a prestação dos serviços. “A inspeção é indispensável. O juiz constata, in loco, o que acontece e tem poder para tomar providências”, afirma o magistrado. Já foi preciso, por exemplo, oficiar a prefeitura de Rio Claro para que médico visitasse o CR. “Quando o Estado quer, consegue dar assistência.”
Isaías Monteiro
Agência CNJ de Notícias