Uma oportunidade para recomeçar a vida após o cárcere com o apoio dos poderes públicos locais e da sociedade civil. É essa a missão do Escritório Social, estrutura fomentada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde 2016 que teve uma nova unidade inaugurada na segunda-feira (4/11), desta vez em Roraima. O aperfeiçoamento e a expansão dos Escritórios Sociais pelo país é uma das áreas de atuação do programa Justiça Presente, parceria inédita entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com o apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), para enfrentar problemas estruturais do sistema prisional e socioeducativo do país.
Após sair do sistema prisional, os interessados podem procurar o Escritório Social e ter acesso a uma rede de serviços de apoio como qualificação profissional, moradia, documentação e saúde. Em Roraima, o Escritório Social funcionará na sede da Assembleia Legislativa, que cedeu estrutura e pessoal para atuar no local, na região central de Boa Vista. A infraestrutura conta com recepção e duas salas para atendimento individualizado. Oito servidores cedidos pelo Legislativo trabalharão no Escritório Social. O Judiciário e o Executivo local também fazem parte da parceria.
Representando o presidente do CNJ, ministro Dias Toffoli, o secretário-geral do Conselho, Carlos Vieira von Adamek, destacou que a atual gestão apoia o Escritório Social como forma de cumprir a Lei de Execuções Penais. “Quando o apenado conquista o direito de retornar à sociedade, é importante que tenha alternativas para reconstruir a vida. Isso vai beneficiar não somente ele, mas as famílias, as comunidades e a sociedade em geral, pois com um atendimento qualificado por meio do Escritório Social, as chances desse egresso do sistema carcerário ser reincidente vão diminuir e a Justiça será mais efetiva”, observou.
O coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF/CNJ) e juiz auxiliar da Presidência do CNJ, Luís Geraldo Lanfredi, explicou que o Escritório Social funcionará como um espaço autorreferenciado para as pessoas egressas do sistema carcerário. “O retorno à sociedade daquele que deixa a prisão é sempre problemático: falta tudo, não há suporte, nem apoio, e esta fase do cumprimento da pena é talvez a mais significativa (e a menos efetiva) para o fim de quebrar o ciclo de violência e de vivência na clandestinidade de pessoas que apenas buscam uma chance, real e efetiva, uma oportunidade e condições para se estabilizarem sem a necessidade do recurso ao crime. O Estado deve-lhes essa providência, atenuando-lhes vulnerabilidades crônicas. Esse suporte é o que os Escritórios Sociais buscam disseminar: permitir a ressignificação a partir da singularidade de cada apenado, encaminhando-lhes a partir do potencial e da capacidade que todos têm de produzir e ocupar posições socialmente úteis. Esse é o sentido de reintegração social que se busca com essa política”, comentou.
O pioneirismo do CNJ ao incentivar ações voltadas a egressos em um país que não possui política articulada sobre o tema foi destacado pelo presidente do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR), desembargador Mozarildo Cavalcanti. “Recebemos esta medida como mais que uma obrigação, e sim com muita empolgação. Apoiamos totalmente, pois acreditamos na proposta de criar estruturas para a reinserção social dos egressos”, declarou. Coordenador do Grupo de Monitoramento do Sistema Carcerário (GMF) local, o corregedor-geral de Justiça, desembargador Almiro Padilha, garantiu o apoio e o acompanhamento do TJRR junto às ações do Escritório Social, destacando a importância da medida de expansão pelo programa Justiça Presente.
O presidente da Assembleia Legislativa de Roraima, deputado Jalser Renier, destacou a importância da parceria entre os poderes públicos locais, ponto também citado pelo secretário Estadual de Segurança Pública, coronel Olivan Pereira. “Esse projeto tem tudo para ser bem-sucedido. Juntos não vamos medir esforços para que possamos trabalhar na ressocialização daqueles que já cumpriram sua pena e que precisam recomeçar a vida”.
Formações
Além da expansão por todo o país, com novas inaugurações programadas na Paraíba, Alagoas, Rio de Janeiro, Piauí, Bahia e Tocantins até o fim do ano, o programa Justiça Presente também realiza uma série de eventos regionais de formação em Escritórios Sociais até o final de novembro. O objetivo das formações é disseminar metodologias de trabalho e mobilizar atores relevantes que permitam alavancar a implantação de uma política nacional voltada aos egressos – são cerca de 50 participantes capacitados por evento.
As formações disseminam as metodologias de mobilização de pré-egressos e singularização desenvolvidas pelo Justiça Presente, assim como estratégias de mobilização da sociedade civil e do Poder Público e abordagem dos marcadores sociais de diferenças, principalmente gênero e raça. “O Supremo Tribunal Federal já declarou a situação das unidades prisionais no Brasil como um quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas. Sem uma ação articulada entre o Judiciário, o Executivo, o Legislativo e a sociedade, esse quadro nunca vai ser enfrentado de forma que traga resultados. Estamos fomentando essa articulação”, explicou a assessora sênior do Justiça Presente, Luana Basílio, durante a formação em Roraima.
Além de Roraima, onde houve o evento de formação entre 23 e 25 de outubro com Amazonas, Rondônia e Acre, o Justiça Presente já realizou processos formativos no Paraná (9 e 11 de outubro) com Santa Catarina e Rio Grande do Sul; Espírito Santo (16 a 18 de outubro), com São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais; Piauí (dias 29 e 31 de outubro), com Amapá, Ceará, Maranhão e Pará. A programação continua na Paraíba (6 a 8 de novembro), com Alagoas, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. Por fim, o Distrito Federal reunirá Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins entre os 18 e 20 de novembro.
De acordo com o coordenador do eixo de promoção da cidadania do Programa Justiça Presente, Felipe Athayde, um dos objetivos desses encontros é a construção dessas metodologias de forma colaborativa, ouvindo os atores que atuam diretamente com as pessoas egressas. “Precisamos desse diálogo exatamente para que as pessoas tragam também aportes de como fazer essas metodologias funcionarem, e isso foi muito rico aqui no grupo”, afirmou, durante a formação no Paraná.
Iuri Tôrres
Agência CNJ de Notícias com informações do TJPR e TJRR