Receber e regularizar a situação de estrangeiros que pedem refúgio no Brasil e, principalmente, assistir juridicamente e de forma gratuita casos de racismo, xenofobia e exploração da força de trabalho sofridos por este grupo de imigrantes vulneráveis socialmente. Essa foi a iniciativa finalista na categoria Advocacia da 12ª edição do Prêmio Innovare, que identifica, premia e dissemina práticas inovadoras realizadas por magistrados, membros do Ministério Público estadual e federal, defensores públicos e advogados públicos e privados de todo Brasil.
O trabalho foi realizado por 15 advogados voluntários de Curitiba (PR) que, desde 2013, formam o núcleo jurídico da ONG Casa Latino-Americana (Casla). Semanalmente, o grupo acolhe cerca de 12 demandas, realiza triagem por temas, atende caso a caso e ministra aulas sobre legislação brasileira aos refugiados. Tudo pautado em prerrogativas de organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU).
Os principais problemas apontados dizem respeito a violação de direitos trabalhistas e do consumidor, racismo e xenofobia. Os pedidos têm como solicitantes, em sua maioria, sírios, haitianos, congoleses, nigerianos e latinos não-brasileiros. Segundo a ONU, atualmente existe um contingente de 160 milhões de migrantes no mundo. Por dia, mais de 15 pessoas procuram informações ou pedem auxílio à Casla, excluindo-se deste montante as demandas jurídicas.
A ONG conta com o apoio do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), do Ministério da Justiça, e da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que por meio de seu Centro de Línguas (Celin) criou um curso de português para estrangeiros, uma vez que um dos maiores obstáculos a serem enfrentados na adaptação à nova cultura é o idioma.
Segundo Nádia Floriani, advogada da Casla e presidente da Comissão dos Direitos de Refugiados e Imigrantes das Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná (OAB-PR), não existem políticas públicas migratórias no Brasil, o que torna esse público extremamente vulnerável. “Infelizmente não é ofertado ao imigrante o ensino do português nas escolas públicas brasileiras, em âmbito estadual e municipal. Também não existem soluções para a questão da moradia. Nós, brasileiros, por exemplo, precisamos de fiador para uma locação de imóvel, imagina para eles como é se deparar com este tipo de situação. Hoje eles vivem em albergues da municipalidade pelo prazo máximo de um mês”, diz.
Fabíola Colle, advogada da Casla, conta que atualmente a ONG acompanha mais de 100 pedidos dos imigrantes, desde pedidos de refúgio e regularização de documentos, passando por procedimentos de união familiar até questões trabalhistas e criminais que correm judicialmente. “Fazemos um acompanhamento junto à Agência do Trabalhador e à Polícia Federal para tentarmos ajudá-los a se recolocarem no mercado de trabalho, por exemplo”.
Relatos – Muitos refugiados são explorados em indústrias do estado do Paraná, onde são submetidos a sistemas degradantes de trabalho com baixos salários. Por não dominarem a língua e não conhecerem as leis brasileiras, muitos são ludibriados por comerciantes e acabam contratando planos de telefonia, cartão de crédito, tv a cabo, aluguel, etc. com cláusulas e preços abusivos. Por isso a ação da ONG Casla constitui-se um apoio importante.
“No Paraná, há muito preconceito religioso e de raça. São constantes as denúncias de intolerância por cor, etnia e nacionalidade. Mais recentemente, tivemos relatos de agressões físicas a mulheres muçulmanas, após os atentados em Paris. Isso nos surpreendeu”, relata Fabíola Colle.
“Infelizmente, tem alguns brasileiros que pensam que estes estrangeiros vêm para o Brasil para tirar seus empregos. Por isso, tentamos conscientizar a comunidade de que eles vêm para contribuir para o desenvolvimento econômico do país e enriquecer a nossa cultura”, comenta a advogada Nádia Floriani.
Refúgio – Segundo o Ministério da Justiça (MJ), é considerado refugiado o cidadão que se encontra fora do seu país por causa de fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política, participação em grupos sociais ou violação generalizada de direitos humanos e que não possam (ou não queiram) voltar para casa.
A Convenção da ONU sobre Refugiados, de 1951, e seu Protocolo (de 1967), são os fundamentos da proteção de refugiados em que se baseiam inúmeras leis e práticas internacionais. No Brasil, a matéria é regulada pela Lei nº 9.474, de 22 de julho de 1997, que criou o Conare, vinculado ao MJ.
Andréa Mesquita
Agência CNJ de Notícias