Um trabalho que teve início há quase um ano deu suporte para a manutenção do atendimento às mulheres vítimas de violência em Canoas (RS) mesmo durante a pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Na semana da Justiça pela Paz em Casa, a juíza Fabiana Pagel da Silva, titular do Juizado da Violência Doméstica e Familiar da comarca, unidade do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), há cinco anos, fez um balanço do trabalho realizado neste período.
“Tivemos a ampliação da convivência familiar durante este ano e isso favoreceu o afloramento dos padrões de gênero entre o casal e a violência decorrente disso, especialmente do padrão de gênero de cuidadora da mulher, que pode fazer com que ela privilegie os interesses dos familiares em detrimento da sua própria saúde mental. Às vezes, esta situação faz com que ela não peça ajuda, mesmo quando sofre uma violência por parte do marido, pois considera que essa violência decorre de problemas do trabalho, problemas financeiros dele e que ela teria que perdoar e relevar o marido. Esse tipo de padrão de cuidado pode, não apenas influenciar nos números de violência doméstica durante a pandemia, mas fazer com que a mulher se coloque numa situação de risco que, devido ao isolamento social, não chega ao conhecimento da rede de enfrentamento”, alerta a magistrada.
Uma das atitudes tomadas em maio do ano passado foi a parceria entre o Judiciário local e a ONG Themis, que possibilitou criar uma rede de proteção individual às vítimas que já possuem medida protetiva. Através do apoio das Promotoras Legais Populares (PLPs), o monitoramento dos casos vem sendo realizado por telefone. Em casos especiais, que requerem a presença, elas encaminham a demanda aos serviços da rede que seguem prestando atendimento emergencial, como Brigada Militar, Patrulha Maria da Penha, postos de saúde e hospitais.
As PLPs são mulheres da comunidade que recebem formação sobre questões culturais e jurídicas relativas à violência doméstica e de gênero. Em Canoas, elas estão distribuídas em diversos bairros e são responsáveis pela formação de uma rede de proteção individualizada das vítimas em situação de violência encaminhadas pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar da cidade. As informações a respeito dos casos tratados são sigilosas.
A juíza ainda falou sobre o andamento do trabalho durante estes meses, já que no início da pandemia tramitavam 6 mil processos físicos na comarca. “Tivemos que nos adaptar rapidamente, já que o fluxo da rede de Canoas era centralizado nas audiências de acolhimento e verificação, nas quais as partes podiam contar as suas histórias. Nessa ocasião, era possível verificar a necessidade de ampliação e modificação das medidas e realização de encaminhamento de rede. Fazíamos cerca de 30 audiências por dia.”
Ela conta que, quando houve a retomada das audiências, em plataforma digitais, “elas não puderam seguir nesse mesmo número. Agora houve a implantação do eproc na área da violência doméstica, que é algo que temos que comemorar muito, pois os pedidos já ingressam de forma virtual. E, com tudo isso, tivemos que modificar também a forma de atuação dos grupos de apoio, que estão sendo realizados de forma on-line, assim como o atendimento psicológico.”
Grupos Reflexivos
A assistente social do Juizado de Canoas, Ana Cristina Schünemann, também conseguiu manter os encontros realizados com casais envolvidos em casos de violência doméstica. O Grupo Ser Casal, criado em 2017 com apoio do curso de Psicologia da Ulbra, continuou ativo mesmo de forma remota. Seis casais realizaram 12 encontros ao longo do ano. “A maioria teve boa participação, com mais de 70% de presença. Os que participaram mostraram interesse e reagiram positivamente às propostas que levamos.”
E para 2021, já foi firmada parceria com a Universidade La Salle para manter o atendimento dos Grupos Reflexivos de Gênero com homens agressores envolvidos em violência doméstica. “A Universidade já está fazendo a triagem e seleção dos integrantes e o primeiro grupo on-line já deve começar neste semestre.”
Fonte: TJRS