Comissão externa da Câmara traz propostas para repactuação do acordo de Mariana (MG)

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Reunião com a Comissão Externa da Câmara dos Deputados de Acompanhamento e Fiscalização da Repactuação do Acordo Referente ao Rompimento da Barragem de Fundão. Foto: Luiz Silveira/CNJ
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O conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello recebeu, na terça-feira (15/3), uma comitiva de deputados e representantes das vítimas do rompimento da Barragem do Fundão. Os deputados integram a comissão externa da Câmara dos Deputados que acompanha a repactuação do acordo firmado para reparar danos causados pelo desastre ocorrido em 2015, em Mariana (MG). O processo de mediação é realizado no Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão, sob a condução do conselheiro.

Bandeira de Mello considerou algumas das propostas “em sintonia” com o que já está sendo discutido na repactuação. Um programa de formação e capacitação profissional para as famílias que perderam profissão, ocupação e renda em função da magnitude do desastre ambiental foi um dos pontos de convergência entre o que foi pensado ao longo do processo da repactuação e as propostas apresentadas pelo grupo de vítimas.

“O dano socioambiental é indiscutível, assim como a necessidade de se reativar a economia da região e de se reinserir economicamente a população. Quanto aos detalhes do programa de formação, podemos discutir se será nos moldes de programas anteriores, se teremos o apoio do Pronatec, da Embrapa ou do Sistema S”, afirmou o conselheiro. A ideia é que um membro por família tenha direito a cursar uma formação profissionalizante. Enquanto estiver aprendendo uma nova profissão, essa pessoa terá uma bolsa suficiente para sustentar a família e, ao concluir o curso, terá acesso a microcrédito com juros subsidiados ou negativos para abrir um negócio, se fizer a opção por empreender.

Uma proposta que interessou ao conselheiro garantiria a segurança alimentar das famílias da região, por meio de compras diretas dos agricultores familiares e do comércio local. “Precisamos que vocês detalhem as propostas a partir de agora: definir quanto cada família receberá, calcular as quantidades, os tipos de alimentos que serão adquiridos e distribuídos, entre outros itens da proposta.”

Participação

Os participantes do encontro defenderam a adoção da estrutura do acordo de reparação às vítimas da tragédia de Brumadinho (MG), ocorrido em 2019 quando a Barragem na Mina Córrego do Feijão se rompeu e a avalanche que se seguiu matou 270 pessoas e afetou a vida de 25 municípios da Bacia do Rio Paraopeba. De acordo com os representantes, é fundamental incluir as vítimas do crime socioambiental nas decisões sobre o uso dos recursos previstos no acordo, a exemplo do que ocorreu durante a negociação sobre Brumadinho.

Membro da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Silvio Netto classificou como “imprescindível” ao processo de repactuação assegurar a presença das vítimas do desastre, por meio de uma gestão autônoma, participativa e auditável. “Não podemos permitir que os interesses diretos dos atingidos pelo crime de Brumadinho não sejam acomodados na repactuação.”

Para o integrante da direção nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Joceli Andrioli, a intenção do grupo é empoderar as comunidades que sofrem as consequências do desastre até hoje – testes revelaram a presença de metal pesado no sangue tanto em Minas Gerais quanto no litoral do Espírito Santo, segundo Andrioli. “Queremos ser os autores das ações de recuperação e reparação. Sem participação popular, não funciona para ninguém.”

Expedito Lucas da Silva, representante da comunidade de Bento Ribeiro, distrito do município de Mariana que desapareceu sob a lama que sucedeu ao rompimento da Barragem de Fundão, confessou viver com graves sintomas de ansiedade e depressão. Disse ter testemunhado a destruição do convívio familiar e comunitário, além de ter visto amigos morrerem antes de serem reassentados. “Vocês precisam ver nosso sofrimento para poder nos ajudar. Nós somos leigos, mas sabemos o que queremos. Não são rios de dinheiro, só o suficiente para fazer a gente reviver.”

Apoio

O coordenador da comissão externa da Câmara dos Deputados, deputado federal Rogério Correia, endossou a reivindicação dos moradores das áreas atingidas por mais participação no processo de repactuação. “Até hoje, não tem uma casa com gente morando dentro em Bento Rodrigues. A situação do rio é catastrófica. Os movimentos querem participar de forma mais ativa, com propostas, e não só depoimentos sobre o desastre.”

Outros membros da comissão externa que também foram ouvidos na reunião, os deputados federais por Minas Gerais Leonardo Monteiro e Padre João relataram a situação a destruição do meio ambiente nas localidades onde vivem. “Em Governador Valadares, as pessoas não têm coragem de beber água fornecida e o esgoto é jogado 100% in natura no rio”, afirmou Monteiro. Segundo Padre João, “as enchentes que aconteceram este ano levaram a lama contaminada com minério para dentro das casas das pessoas”.

O conselheiro Bandeira de Mello destacou que os deputados terão uma audiência com o presidente do CNJ e do Supremo Federal (STF), ministro Luiz Fux, no dia 29 de março. Foi o ministro Fux quem ordenou que o processo de mediação fosse realizado pelo Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão.

No fim do mês, Bandeira de Mello visitará Minas Gerais, onde se encontrará com lideranças dos movimentos de moradores das áreas atingidas. A onda de lama tóxica percorreu mais de 600 quilômetros pelo leito do Rio Doce, de Mariana até Regência (ES), onde entrou no mar pela foz do rio, 17 dias depois do rompimento da barragem. Na segunda quinzena de abril, o conselheiro planeja visita ao Espírito Santo, para encontrar moradores afetados pelo desastre.

Manuel Carlos Montenegro 
Agência CNJ de Notícias

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