“A democracia a nível global vive tempos nublados. O mundo atravessa um período de recessão democrática, um momento crítico para a democracia e a liberdade. Em minha opinião, é o mais crítico desde o início da terceira onda democrática, que faz mais de quatro décadas. Todos os principais índices coincidem em sinalizar que a democracia na América Latina está passando pelo pior momento nos últimos 15 anos”.
Os alertas foram dados pelo professor Daniel Zovatto, diretor regional para a América Latina e Caribe do Instituto Internacional para Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA Internacional), que apresentou, nessa terça-feira (17/5), a palestra “Democracia e Eleições na América Latina e os Desafios das Autoridades Eleitorais”, na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília. O TSE é membro parceiro do IDEA Internacional desde 2016.
Zovatto afirmou que o surgimento de líderes autoritários e o auge do populismo em todas as regiões do mundo vêm motivando um intenso debate sobre o estado de saúde e da qualidade da democracia. Ele revelou que os principais informes mostram que a deterioração democrática é global e afeta todas as regiões do mundo e todas as democracias, tanto as mais novas quanto as que se consideravam consolidadas. Hoje, 70% da população mundial vivem em regimes autocráticos, contra 49% uma década atrás.
O diretor destacou a grande heterogeneidade de regimes políticos e da qualidade da democracia na América Latina, onde, dos 20 países, somente o Uruguai é qualificado como democracia de alto desempenho. E nove, entre eles o Brasil, está estacionado em um nível de desempenho médio ou baixo. “No caso específico do Brasil, todos os principais índices sobre a qualidade da democracia mostram um constante e preocupante nível de erosão democrática.”
“Um exame cuidadoso permite identificar um quadro regional de democracias fatigadas e irritadas como consequência de uma crise de confiança da cidadania nos partidos e nas elites políticas tradicionais, uma crise de representação e um crescente mal-estar social devido à falta de resultados”, afirmou o diretor regional do IDEA Internacional, citando dados políticos regionais.
Ataques
Zovatto classificou como extremamente preocupante a crescente onda de ataques aos organismos eleitorais na América Latina. “De fato, embora esses organismos tenham mostrado na maioria dos casos – embora existam exceções importantes – um bom nível de resiliência eleitoral, independência e profissionalismo, o trabalho não é sem desafios e ameaças.”
“Saibam que não estão sozinhos nesta batalha em defesa da democracia e da integridade eleitoral no Brasil. Da IDEA International, sentimos grande respeito e admiração por esta Corte, pelos ministros e pelo trabalho que realizam com profissionalismo, imparcialidade e independência. Conhecemos muito de perto o sucesso da urna eletrônica durante os últimos 26 anos, um mecanismo de votação que consideramos confiável, seguro e auditável”, finalizou Daniel Zovatto.
O presidente do TSE, ministro Edson Fachin, destacou a importância da presença do diretor regional do IDEA Internacional no Tribunal. “O Brasil está naturalmente inserido no sistema internacional e os acontecimentos daqui influenciam o cenário global e por ele são igualmente influenciados. De maneira mais evidente, a evolução política e social da nossa região, a América Latina, não pode deixar de ser parte integrante de nossa própria evolução.”
O ministro citou a invasão do Capitólio, em Washington, em 6 de janeiro de 2021; os reiterados ataques sofridos pelo Instituto Nacional Eleitoral do México; e as ameaças, inclusive de morte, sofridas pelas autoridades eleitorais peruanas no contexto das últimas eleições presidenciais como “exemplos do cenário externo de agressões às instituições democráticas, que não nos pode ser alheio”. “É um alerta para a possibilidade de regressão a que estamos sujeitos e que pode infiltrar-se em nosso ambiente nacional — na verdade, já o fez.”
Fachin afirmou que convém refletir sobre as recentes conturbações causadas pela contagem manual de votos impressos. Ele recordou que as discórdias quanto aos resultados das eleições presidenciais do primeiro turno no Equador, em fevereiro de 2021, e do segundo turno no Peru, alguns meses depois, sem falar a dos Estados Unidos, “evidenciam os transtornos a que podem conduzir a apuração de cédulas de papel”.
Nesses contextos regionais, o presidente do TSE assinalou que vários dias, até semanas, se passaram sem que pudesse ser divulgado o resultado definitivo, encorajando pedidos de recontagem e recursos judiciais de todos os lados, quando não o conflito puro e aberto. “A ninguém interessa reprisar essa realidade no nosso país.”
“O mundo observa, com atenção, o processo eleitoral brasileiro de 2022. Somos, hoje, uma vitrine para os analistas internacionais, e cabe à sociedade brasileira garantir que levaremos aos nossos vizinhos uma mensagem de estabilidade, de paz e segurança, e de que o Brasil não mais aquiesce a aventuras autoritárias”, destacou Fachin.
Por esse motivo, o ministro informou que a Justiça Eleitoral brasileira está convidando, de maneira inédita, todos os organismos e centros especializados internacionais relevantes para atuarem como observadores das Eleições 2022: a Organização dos Estados Americanos (OEA); o Parlamento do Mercosul; a Rede Eleitoral da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP); a União Interamericana de Organismos Eleitorais (UNIORE); o Centro Carter; a Fundação Internacional para Sistemas Eleitorais (IFES); e a Rede Mundial de Justiça Eleitoral.
Fachin revelou que o TSE entrou em acordo para que o IDEA Internacional, por meio da sede em Estocolmo, na Suécia, apoie a vinda ao Brasil, antes e durante as eleições, não apenas desses organismos, mas de diversas autoridades europeias e de outros continentes que tenham interesse em acompanhar de perto o processo eleitoral brasileiro de outubro. O presidente do TSE informou que o objetivo é ter mais de cem observadores internacionais no Brasil para acompanhar o processo eleitoral.
Fonte: TSE
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