Se a realidade psicológica e social da mulher encarcerada já é difícil, pior ainda é a aplicação de um correto serviço de atendimento à saúde – tanto curativa quanto preventiva – para esta população feminina, o que exige desafios e busca por maior infraestrutura. De acordo com especialistas, é importante, nestes casos, levar em conta peculiaridades como ciclos hormonais e de fertilidade das mulheres e aspectos sensíveis como a atenção e preocupação constante demonstrada pelas apenadas em relação aos filhos. Tais colocações foram apresentadas na tarde desta quarta-feira (29/6) durante o Encontro Nacional do Encarceramento Feminino, que está sendo realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília. De acordo com magistrados, profissionais e especialistas que discutem a questão da saúde das mulheres nas prisões ao lado de juízes auxiliares, técnicos, assessores e conselheiros do CNJ, trata-se de um problema que requer maior compromisso social por parte de profissionais como assistentes sociais, psicólogos e, sobretudo, juízes de execução criminal. “Já ouvi de colegas a citação de que estudaram demais para serem juízes de execução criminal e viver nos presídios”, afirmou a magistrada Nidea Sorci, do Estado de São Paulo.
Iceberg – Para o médico Eduardo Crosara, que integrou a equipe multidisciplinar de saúde no presídio Francisco de Assis em Uberlândia/MG o grande desafio dos profissionais de saúde que trabalham com apenadas é a própria forma como se aplica o sistema nacional de saúde nas penitenciárias. “Enfrentamos dificuldade semelhante a de se deparar com um iceberg no meio do mar”, disse. Segundo ele, tais dificuldades dizem respeito a condições de confinamento, insalubridade dos ambientes, doenças crônicas generalizadas, equipamentos escassos para a realização de exames e falta de material para higiene feminina – o que piora ainda mais a situação física e de saúde destas mulheres.
Crosara afirmou, ainda, saber de médicos que diante da carência de remédios oferecem analgésicos para tratar de determinados problemas de saúde que as apenadas estão sentindo, sem que seja tratada a verdadeira doença que as acomete. Ele afirmou que um melhor atendimento social e psicológico das presidiárias ajudaria, consideravelmente, a melhorar a sua situação física e de saúde como um todo.
Diferenças – A juíza Nidea Sorci, por sua vez, afirmou que existe a assistência e prestação de saúde às mulheres apenadas “intra e entre” muros e a precariedade se estende ao sistema prisional como um todo. Mas revelou que a grande dificuldade ainda consiste nas diferenças entre homens e mulheres. “Para os homens presos a prioridade de necessidades, pela ordem é sexo, trabalho e depois saúde. Para as mulheres a ordem muda e as prioridades passam por saúde em primeiro lugar e depois trabalho. As presas sofrem muito mais com o encarceramento do que os homens porque se preocupam mais com os filhos, com a forma como deixaram os filhos e as pessoas com quem os deixaram”, enfatizou.
A magistrada ainda destacou que, apesar de existir um bom número de consultas médicas agendadas e um atendimento às mulheres presas, a assistência à saúde às apenadas não é suficiente e o ideal era que lhes fossem oferecidas condições para uma medicina efetivamente curativa. O que foi completado pelo padre Valdir João Silveira, coordenador da Pastoral Carcerária. O religioso disse que deveria haver uma cobrança maior por parte das instituições públicas junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que se inspecionasse mais os presídios.
Silveira fez uma crítica à atuação dos juízes ao afirmar que para ingressar na magistratura deveria ser exigido aos postulantes ao cargo durante o concurso noções mais fortes de estudos sociais e economia – “para que os juízes fossem mais comprometidos com a camada social que está, atualmente, nos presídios”. O painel teve a coordenação da juíza Andremara dos Santos, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA).
Hylda Cavalcanti
Agência CNJ de Notícias