Excluir a justiça criminal do debate sobre segurança pública é contribuir para a ineficiência dos dois sistemas, avaliou o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes. Ele falou com magistrados e servidores de tribunais de todo o país durante palestra realizada na última sexta-feira (27/9) no II Encontro Nacional dos GMFs. O evento foi promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do programa Justiça Presente, para discutir desafios e estratégias para a solução de problemas estruturais do sistema prisional e socioeducativo.
O ministro lamentou a divergência entre o que prevê a Constituição e a realidade do país quanto ao tratamento às pessoas privadas de liberdade, que segundo ele, “caminhou para estado de anomia, violência e negligência”. Segundo Mendes, ao ignorar as pessoas que estão sob custódia do estado, criou-se o ambiente para as organizações criminosas que agem de dentro dos presídios, piorando o quadro de segurança pública. Ao relembrar a criação dos mutirões carcerários durante sua gestão no CNJ em 2008, o ministro afirmou que o principal problema era o alto número de prisões provisórias que cria um passivo “altamente constrangedor” e uma “situação de descontrole”.
O ministro destacou julgamentos importantes da Suprema Corte em relação ao tema, como a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347, que em 2015 declarou o estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário, permitindo uma série de ações para superação da crise. Segundo o conselheiro do CNJ Márcio Schiefler Fontes, que participou da mesa de debate, este julgamento permitiu, por exemplo, a consolidação das audiências de custódia em todo o país e a liberação de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen).
Mendes pontuou, ainda, a importância de ações de atenção à pessoa egressa do sistema penitenciário, como o programa Começar de Novo, que passará por atualização dentro do programa Justiça Presente. “Uma preocupação é com a estabilidade do que logramos. Precisamos dar estabilidade às instituições, com um perfil permanente. Foi neste contexto que surgiu o DMF [Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas], possibilitando que gestões futuras do CNJ pudessem desenvolver outros trabalhos, como as audiências de custódia”, exemplificou.
De acordo com o ministro, o CNJ colocou o tema prisional na agenda política do país e os desenvolvimentos recentes, como o programa Justiça Presente, têm potencial de promover a revisão da própria justiça criminal e sua forma de atuar. Ele sugeriu ação de forma integrada, instigando magistrados a olharem além das próprias decisões. “A justiça tem imensos desafios, mas, se fizesse qualquer recomendação, seria ‘Preocupe-se com sistema de justiça criminal, pensemos, de forma macro e micro, no sistema de justiça criminal’”, concluiu.
Justiça Presente
O II Encontro Nacional dos GMFs é uma realização do programa Justiça Presente, parceria entre CNJ, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Ministério da Justiça e Segurança Pública para enfrentar os problemas estruturais do sistema penal e socioeducativo. O programa trabalha em soluções customizadas à realidade de cada unidade da federação, incentivando o protagonismo dos atores locais para mudanças sustentadas com resultados visíveis em curto e médio prazo.
Iuri Tôrres – Agência CNJ de Notícias