Justiça Restaurativa: encontro troca experiências no Mato Grosso do Sul

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Teve início nesta quinta-feira (21), no Tribunal de Justiça, o II Encontro de Justiça Restaurativa em Mato Grosso do Sul. O evento permite a troca de experiências entre os participantes e tem como finalidade a capacitação e posterior treinamento de voluntários multiplicadores para passarem a atuar nesta técnica de diálogo.

Promovido pelo Tribunal de Justiça de MS, em uma parceria da Coordenadoria da Infância e da Juventude (CIJ) com a Escola Judicial de Mato Grosso do Sul (Ejud-MS), o Encontro contou em sua abertura com a presença do decano do TJMS, Des. Claudionor Miguel Abss Duarte, que representou o presidente do TJ, Des. Divoncir Schreiner Maran, e o diretor-geral da Ejud, Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso, na solenidade.

Após a apresentação do Coral do TJMS, foi exibido um vídeo em homenagem e gratidão às autoridades e aos servidores do Poder Judiciário de MS que tornaram possível a efetivação do Programa Justiça Restaurativa no Estado, um dos poucos, segundo o Conselho Nacional de Justiça, que instituíram o programa e cumpriram a Meta 8.

Representando a juíza coordenadora da Infância e da Juventude de MS, Katy Braun do Prado, para a apresentação inicial do programa Justiça Restaurativa em MS falou o juiz Mauro Nering Karloh, titular da Vara da Infância e Juventude de Campo Grande.

Em sua fala, o magistrado traçou o panorama de como se encontra a Justiça Restaurativa em MS, desde a sua implantação, com a Justiça Juvenil, passando depois com a Justiça Escolar nas escolas estaduais, e mais recentemente nas escolas municipais. “Nosso objetivo é tentar sensibilizar as pessoas de que é uma caminhada longa, mas que a gente precisa avançar cada vez mais para implantar a Justiça Restaurativa não apenas em Campo Grande, mas em todo o Estado de Mato Grosso do Sul”.

Em seguida, o juiz Leoberto Brancher, coordenador estadual do programa Justiça para o Século XXI do TJ do Rio Grande do Sul e referência nacional no assunto, proferiu a palestra de abertura do evento, com o tema “Os Caminhos percorridos para a implantação de uma sociedade restaurativa rumo à construção de uma Comunidade Pacificadora”.

Em sua explanação, Brancher contou a sua trajetória como coordenador do programa Justiça para o Século XXI em Porto Alegre até a criação do Programa Voluntários da Paz, em Caxias do Sul. “O Rio Grande do Sul é pioneiro nesse processo de implantação de abertura de um caminho nacional para a Justiça Restaurativa. Isso iniciou com estudos mais individuais em 1999, a primeira parte eu pessoalmente envolvido desenvolvi em 2002, mas foi a partir de 2005 que nós iniciamos um programa mais organizado, estruturado de implantação, como parte do projeto nacional, promovendo práticas restaurativas no sistema de justiça brasileiro”.

De acordo com o palestrante convidado, na medida que a experiência do TJRS foi amadurecendo, também foi havendo um amadurecimento da ideia no âmbito nacional. “A partir de 2014, o Tribunal me delegou a tarefa de formular e conduzir um projeto. Trabalhei por dois anos e meio junto à Corregedoria-Geral de Justiça, incumbido exatamente dessa função, de implantar a Justiça Restaurativa no 1º Grau de jurisdição da nossa justiça estadual. A partir desse projeto então nós implantamos 12 unidades no ano de 2015, 8 em 2016, e estamos implantando 13 no ano de 2017. No Judiciário do Rio Grande do Sul a escolha foi no sentido de que o lugar da Justiça Restaurativa na nossa instituição é dentro dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs)”.

Para o juiz Leoberto, a Justiça Restaurativa tem um componente de ativação da cidadania no sentido de que ela cria compromissos das pessoas tomarem atitudes e fazerem as coisas melhor. “Ela não é só voltada enquanto modo de pensar, enquanto filosofia de justiça, ela não é só voltada à resolução de conflitos. A resolução de conflitos é um desdobramento desse modo de pensar e agir com relação a situações difíceis, mas nós podemos ter situações difíceis que não são necessariamente conflitivas. Nós podemos ter uma sala de aula tumultuada, e nós podemos buscar harmonizar a convivência nessa sala de aula mediante metodologias de diálogo estruturado pelas técnicas da Justiça Restaurativa. Então ela acaba trazendo alguns ganhos secundários, porque aquilo que se desenvolve para entrar numa solução de conflito grave, seja uma tentativa de homicídio, em que o réu vai conversar com a sua vítima, ela exige muita habilidade para conduzir e a tecnologia de condução desse encontro desenvolvida pra situações de tão extrema exigência, se torna muito útil quando você vai trabalhar situações mais leves”.

“A Justiça Restaurativa é um modelo de pensamento, uma filosofia operativa, ela promove uma mudança de ponto de vista, uma mudança da forma de pensar, mas ela também instrumentaliza como uma diferente maneira de agir, que é útil de uma maneira transversal, mas que tem no Poder Judiciário um foco propagador. A ideia é de que a gente consiga criar essa nova cultura, que é uma cultura de pacificação. Mas é uma cultura de pacificação pela autonomia dos sujeitos, as próprias pessoas são responsáveis. Não é o juiz, não é o promotor, não é o advogado que vai ser o resolvedor do conflito. É a pessoa que vai se sentir capaz e fortalecida para encarar a sua própria realidade e fazer a sua própria solução”, destacou Leoberto Brancher.

Sobre a realização do II  Encontro de Justiça Restaurativa em Mato Grosso do Sul, o palestrante destacou que o movimento de Justiça Restaurativa hoje, no Brasil e no mundo, é um embrião de uma nova cultura. “Abrir as portas de uma Corte de Justiça para a comunidade fazer parte, pensar, se sentir parte, se sentir pertencente, se sentir corresponsável pela administração da Justiça, não no sentido jurisdicional, mas no sentido autocompositivo, é uma estratégia de sobrevivência do Poder Judiciário. E é também uma estratégia de legitimação da função de justiça. Nós não daremos mais conta hoje de absorver o volume de litígios que recebemos, segundo os velhos mecanismos procedimentais, que são caros, complexos e altamente especializados. Mas ao mesmo tempo a gente tem recebido massas de ajuizamentos de pequenas questões. Este é o caminho de um movimento de transformação no Judiciário. E o Judiciário de Mato Grosso do Sul dá mostras de uma atitude inovadora e bastante vanguardista ao promover esse Encontro”.

Programação – O  II Encontro de Justiça Restaurativa em Mato Grosso do Sul segue sua programação nesta sexta-feira (22), a partir das 8 horas, com mais duas personalidades no assunto Práticas Restaurativas, e apresentação cultural juvenil de adolescentes que participaram das práticas restaurativas.

O Dr. Phd Prof. Marcelo Pelizzolli abordará o tema “A Comunicação Não-Violenta: Método de prevenção e resolução de conflitos”. Ele é organizador de mais de 16 livros pela Universidade Federal de Pernambuco. Facilitador com experiência no sistema carcerário em Recife/PE. Coordenador do espaço de Diálogo e Reparação da UFPE, professor dos Cursos de Mestrado em Saúde Coletiva e em Direitos Humanos, além de formação em Constelação Familiar e Comunicação Não-Violenta.

Pelizzolli tem ainda formação internacional em Terapia Sistêmica Familiar, em Orgonomia (Reich), em CNV com M. Rosenberg, e em Círculos de Diálogo com Kay Pranis. Formação em Internal Family Sistems Therapy, coordenador do Espaço de Diálogo e Reparação da UFPE e Coordenação do Núcleo de Justiça Restaurativa de Pernambuco.

Na tarde de sexta-feira será a vez da psicóloga e professora com enfoque na metodologia de facilitação de mudanças educacionais, Mônica Mummi, diretora do Laboratório de Convivência e capacitadora em Justiça Restaurativa e Procedimentos Restaurativos, tendo implantado os polos irradiadores do Estado de São Paulo e agora no Rio de Janeiro. Mônica abordará o tema “Círculos de Construção de Paz – Instrumento para Cultura de Paz Restaurativa”.

Ao todo, o Encontro conta com mais de 400 inscritos, dentre profissionais liberais (advogados, psicólogos, assistentes sociais e pedagogos), membros do Ministério Público e Defensoria Pública, da rede pública de educação estadual e municipal (secretárias, diretores e coordenadores de escolas públicas), além da participação de funcionários de escolas privadas, da Secretaria de Segurança Pública, agentes penitenciários e agentes socioeducativos.

Saiba mais – Justiça Restaurativa é um programa da Coordenadoria da Infância e da Juventude subdividido em Justiça Restaurativa na Escola e Justiça Restaurativa Juvenil.

A Justiça Restaurativa na Escola atende 26 escolas, sendo 21 da Rede Estadual de Educação e 5 da Rede Municipal de Educação, com previsão de ampliação para mais quatro escolas e extensão para a rede estadual de Dourados. É executado em ações conjuntas entre o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, Secretaria Estadual de Educação – SED e a Secretaria Municipal de Educação – SEMED.

Entre as principais atividades desenvolvidas pelo programa estão ações preventivas, por meio de diálogos restaurativos com os alunos, visando trabalhar questões relacionadas à violência na escola, além de resolução de conflitos, reunião com os pais e capacitação de multiplicadores. A equipe é muito pequena para as proporções quantitativas de alunos e para isso é necessária a adesão de voluntários.

A equipe da Justiça Restaurativa na Escola é composta de pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, servidores do Tribunal de Justiça e professores que realizam diariamente visitas às escolas, nos turnos matutino e vespertino, para os atendimentos de resolução de conflitos e o desenvolvimento das ações preventivas. Sendo cinco cedidos pela SED e quatro cedidos pela SEMED.

O programa da Justiça Restaurativa Juvenil é executado em conjunto entre o Tribunal de Justiça e a Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) para os casos judicializados. Atende adolescentes infratores de pequeno potencial ofensivo no resgate dos valores, realizando acordos consensualizados, sendo  apresentado como um novo modelo de justiça, que busca soluções pacíficas, cujo foco está em prevenir conflitos, propiciando a execução de uma justiça mais educativa.

A Justiça Restaurativa objetiva, além da resolução de conflitos e da prevenção de processos, instaurar a Cultura da Paz, incentivando o respeito à vida, o ouvir e compreender o outro por meio dos valores declarados.

Fonte: TJMS