Novos dados do sistema prisional reforçam políticas judiciárias do CNJ

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Foto: G. Dettmar CNJ
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A divulgação da redução inédita na superlotação do sistema prisional brasileiro em 2020 após altas históricas evidenciou a importância de políticas estruturantes e coordenadas para transformações permanentes. Desde 2019, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vem trabalhando ações de forma colaborativa com atores-chave de diferentes instituições e níveis federativos por meio de parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e apoio do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), hoje o programa Fazendo Justiça.

Os dados divulgados nesta semana pelo Monitor da Violência são os mais recentes sobre o sistema prisional em escala nacional, e foram coletados junto aos governos locais via Lei de Acesso à Informação. A análise se deu com parceria entre o site G1, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo. De acordo com o levantamento, em um ano, o número de pessoas presas – em regime fechado ou semiaberto – caiu de 709,2 mil para 682,2 mil, enquanto a superlotação foi de 67,5% para 54,9%.

A redução da superlotação sob uma perspectiva de fortalecimento do monitoramento e da fiscalização do sistema carcerário é um dos pilares do termo de cooperação técnica assinado entre CNJ e PNUD ainda em 2018. “A racionalização no campo penal para transformações necessárias e urgentes no campo da segurança pública passa necessariamente pela questão da superlotação. Só há políticas públicas efetivas com um sistema manejável e com recursos adequados. Uma massa carcerária inchada e desatendida é exatamente o contrário do que a sociedade precisa”, avalia o supervisor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Medidas Socioeducativas, conselheiro Mário Guerreiro.

Mesmo com a redução da superlotação, que segundo o Monitor da Violência também resulta do aumento de 17 mil vagas no sistema, a variação positiva de 0,7% do número de prisões provisórias depois da queda registrada anteriormente confirma que a porta de entrada segue como um ponto de atenção. Por meio do Fazendo Justiça, o CNJ atua para o fortalecimento de políticas alternativas à prisão, incluindo monitoração eletrônica e justiça restaurativa, assim como pela qualificação das audiências de custódia. “O fenômeno do aprisionamento é complexo, envolvendo diferentes atores e incentivos. A escalada dos números nas últimas décadas, no entanto, provam que esse caminho é inviável sob uma perspectiva de desenvolvimento sustentável e inclusivo”, pondera Mário Guerreiro.

De acordo com o professor da Escola da Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e coordenador do departamento de Justiça e Segurança Pública do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Rodrigo Azevedo, os fatores que resultam na redução do encarceramento podem ser múltiplos, mas é importante destacar a atuação de quase duas décadas do CNJ no campo das políticas judiciárias para se chegar a esses resultados. “Desde os mutirões carcerários nos anos 2000 até a parceria atual com o PNUD e o Depen, atualmente o programa Fazendo Justiça, o CNJ tem atuado nacionalmente para induzir políticas judiciárias com foco na redução da superlotação e combate aos maus tratos, entre outras ações estruturantes essenciais de atenção ao apenado e ao egresso”, avalia.

Para a coordenadora da Unidade de Governança e Justiça do PNUD, Moema Freire, a parceria que hoje resulta no programa Fazendo Justiça foi um divisor de águas ao permitir que o Judiciário desenvolvesse novas metodologias e ações piloto inovadoras com foco na superação dos desafios estruturantes do sistema penal no país. “Um dos focos do programa é justamente um olhar para a porta de entrada, e essa redução tem um efeito demonstrativo dos importantes resultados que vem sendo alcançados pelo programa no Brasil”, analisa.

Segundo Moema Freire, o programa colabora diretamente pelo avanço do Brasil rumo às metas pactuadas nas Nações Unidas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e tem levantado interesse em outros países da região. “O reconhecimento desses resultados por meio da redução no numero de presos colabora ainda mais para o fortalecimento do programa e sua disseminação nacional e internacional”, pontua.

Além do custo social causado pela prisão, que reforça exclusões e reduz oportunidades para os apenados e para seus familiares com impactos negativos para o desenvolvimento do país, o gasto para manter o sistema também preocupa gestores públicos. A média nacional por preso é de cerca de R$ 2,5 mil, além do gastos para criação de novas vagas. Somente com a redução da população carcerária apontada pelo Monitor da Violência, por exemplo, a economia potencial aos cofres públicos pode chegar a pelo menos R$ 810 milhões anuais. “Abundam estudos e exemplos internacionais de que políticas de prevenção são um destino mais adequado para o gasto público, pois evita o duplo revés da violência seguida do aprisionamento, além de potencializar capacidades humanas. Nossas políticas públicas precisam seguir o caminho apontado pelas evidências”, avalia o supervisor do DMF, Mário Guerreiro.

Na avaliação do Coordenador da Unidade de Estado de Direito do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), Nívio Nascimento, o Fazendo Justiça certamente contribuiu para a importante redução nas taxas de encarceramento no país. O UNODC vem trabalhando nas ações do programa no campo das audiências de custódia. “Essa iniciativa inovadora envolvendo o trabalho conjunto de CNJ, PNUD e UNODC mostra que é possível encontrar soluções para a superlotação carcerária por meio de evidências. O UNODC contribuiu para a racionalização da porta de entrada por meio do fortalecimento de audiências de custódia que resultou, entre outras conquistas, na redução da conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva conforme apontado pelo relatório”, aponta.

Quanto à porta de saída do sistema prisional, o CNJ vem estruturando políticas de cidadania por meio do programa Fazendo Justiça objetivando a quebra do ciclo da violência e da criminalidade. Com a metodologia dos Escritórios Sociais já presentes em 17 unidades da federação, o CNJ induz os poderes públicos locais a atuarem de forma colaborativa para oferecerem em um só lugar diferentes serviços para os egressos e seus familiares. Em 2021, os equipamentos passam a operar integrados ao Começar de Novo, nova fase da primeira política nacional de egressos criada pelo CNJ ainda em 2009 com foco em inserção produtiva.

Durante a pandemia de Covid-19, o CNJ segue com apoio técnico ao judiciário nacional para reduzir contágios e mortes, oferecendo apoio dos consultores do Fazendo Justiça alocados em diferentes unidades da federação, além de publicar boletins quinzenais com informações relevantes de acompanhamento e de emitir normativas e notas técnicas. Entre outros fatores, o Monitor da Violência credita a redução da superlotação prisional em 2020 aos efeitos da Recomendação 62/2020, que incentivou o Judiciário a rever a necessidade de prisão para determinados grupos, resultando na liberação emergencial de pelo menos 32 mil pessoas segundo dados de maio de 2020.

Para o professor em criminologia na Universidade de Kent (Inglaterra) Vitor Dieter, o trabalho feito pelo CNJ de forma alinhada ao Executivo vem obtendo resultados em escala local com reconhecimento global. “O Brasil é um dos poucos países que mais encarceram que estavam com aumento de prisões desde a década de 1990. Havia um risco de o país assumir a primeira posição, e isso é muito negativo, porque as condições carcerárias no Brasil já são muito precárias. Sem sombra de dúvidas, a razão pela qual tem se conseguido esse controle é principalmente graças ao CNJ e ao DMF, que tem tido essa atuação em conjunto com outras frentes do poder Executivo para frear esse encarceramento”.

Agência CNJ de Notícias