Idealizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e já incorporado por 11 estados brasileiros, o projeto Audiência de Custódia chegou à Paraíba na última sexta-feira (14/8) com o objetivo de revolucionar o tratamento da questão penal e carcerária no estado. Se antes os presos em flagrante podiam levar meses até serem ouvidos por um juiz e a prisão preventiva era a principal medida adotada, agora eles devem ser apresentados em juízo no prazo de 24 horas e a liberdade provisória deve ser a regra nos casos envolvendo menor gravidade.
O lançamento do projeto ocorreu em solenidade no Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba (TJPB), que além de assinar termo de adesão e descerrar placa comemorativa, realizou a audiência de custódia inaugural com a presença do presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski. O caso envolvia a prisão em flagrante de um homem de 20 anos, supostamente envolvido na ocultação de uma arma de fogo na vizinhança. Desempregado e dividindo casa com mãe, mulher e filha, ele recebeu a chance de responder ao processo em liberdade com a condição de informar eventuais mudanças de endereço.
Ao final da audiência, a juíza Higyna Josita explicou aos presentes que longe de trazer impunidade, o projeto resulta em mais segurança por impedir que pessoas de baixa periculosidade entrem em prisões sem real necessidade e saiam piores que chegaram. “Antes de preso este é um ser humano e falamos dos casos de menor potencial ofensivo. A sociedade pode ficar tranquila que vamos continuar fazendo nosso papel de prender aqueles que forem perigosos”, disse. Somente em João Pessoa, cerca de 45 pessoas são presas em flagrante semanalmente.
Vantagens – O presidente do CNJ destacou em coletiva de imprensa que além de dar efetividade a normas nacionais e internacionais, o projeto confere mais celeridade ao processo. “Todos puderam presenciar que em cinco minutos esse assunto foi resolvido. Normalmente o preso aguarda meses, os processos vão se acumulando e um dia o juiz assoberbado pega a pilha já com uma promoção do Ministério Público, que em geral é pela prisão preventiva, e tende a acompanhar. Agora fazemos uma revolução não só do ponto de vista do tempo, mas permitimos que o juiz olhe olho no olho, sentindo de perto se ele merece ou não ser libertado”, disse.
O ministro também informou que o projeto amplia a chance de o custodiado ser reintegrado à sociedade, objetivo fim do sistema carcerário brasileiro. “Com a audiência de custódia não significa que o preso em flagrante não responderá ao processo, mas ele poderá retomar sua vida, voltará a sua família, será reincorporado ao seio da comunidade e poderá ser recuperado e se tornar um cidadão prestante”, completou.
Alterações – O Fórum Criminal de João Pessoa passou por reforma para abrigar o projeto a partir de orientações do CNJ – o sexto andar agora tem duas salas de audiências, salas de entrevistas, dois gabinetes de juízes, dois cartórios, celas gradeadas e entradas independentes. Foram escalados dois juízes, três servidores, um oficial de Justiça e um assessor. O projeto funcionará em fase piloto em João Pessoa, mas o tribunal já estuda a ampliação para Campina Grande, segunda maior cidade, e em sequência para todo o estado.
Integrante do grupo gestor da Audiência de Custódia na Paraíba, o juiz auxiliar da Presidência do TJPB Carlos Neves explicou que o programa funcionará em regime de plantão em João Pessoa, com um dia reservado para realizar as audiências de custódia. As audiências de sábado e domingo serão transferidas para o início da semana. “Diante da demanda prevista, foi o que estabelecemos sem prejuízo de aumentar esse quadro. Nenhum preso será incluído no sistema penitenciário sem audiência de custódia”, explicou.
O juiz ainda informou que o projeto recebeu o apoio de todos os poderes e órgãos públicos, como a Defensoria Pública, o Ministério Público e o Executivo, que segundo ele, está tomando providências para fornecer estruturas como tornozeleiras eletrônicas e equipes multidisciplinares para atender ao custodiados.
Projeto – A apresentação do preso a um juiz no menor prazo possível deriva do Pacto de San José da Costa Rica, de 1992, do qual o Brasil é signatário. Se antes os presos aguardavam meses até a primeira audiência, agora o juiz pode avaliar se a prisão é legal e adequada, com mais elementos para decidir pela liberdade provisória se for o caso. Essa lógica tem reduzido as prisões desnecessárias em até 40% em todo o país.
As audiências de custódia estão priorizando o tratamento individualizado de cada flagrante, atendendo a preceitos constitucionais como a razoabilidade e a presunção de inocência até julgamento definitivo do processo. O projeto também coloca o tema penal em foco, mudando a perspectiva dos atores do sistema de Justiça para uma visão mais humanizada e reintegrativa dos envolvidos.
Acesse aqui o álbum de fotos do evento, na Paraíba.
Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias