O presidente do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), desembargador Gilberto Marques Filho, e o corregedor-geral da Justiça, desembargador Walter Carlos Lemes realizaram na última quarta-feira (3/1) inspeção no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, onde ocorreu rebelião que deixou nove mortos e levou à fuga de quase 200 homens. A visita segue determinação da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Cármen Lúcia. Após a vistoria, será produzido, em até 48 horas, um relatório da situação da penitenciária.
Além de vistoriar às instalações, o magistrado conversou com presidiários, acompanhado da juíza-auxiliar da corregedoria Sirlei Martins da Costa e da titular da 1ª Vara de Execução Penal de Goiânia, Telma Aparecida Alves. O objetivo foi ouvir relatos sobre a rebelião e, também, sobre o dia a dia no local. Ao deixar o presídio, o desembargador falou com a imprensa local sobre a falta de investimentos em cárceres que, em sua opinião, é nacional. “Apesar de ser incumbência do Governo Estadual, não podemos culpá-lo. É uma responsabilidade que deveria ser da União, que tem força e recursos para assumir o sistema prisional. O Estado não tem condições de assumir sozinho esse papel”, frisou.
Antes de assumir a presidência do TJGO, Gilberto Marques Filho esteve à frente da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Goiás (CGJGO), onde liderou um levantamento inédito e completo sobre todas as unidades prisionais do Estado. “Nossas equipes percorreram mais de 6 mil quilômetros e foram em comarcas nas quais tinha apenas uma única cela. Repassamos todos os dados para as autoridades competentes. O STF, bem como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), estavam cientes da situação”, declarou o magistrado.
Rebelião
O motim foi promovido nas alas da Colônia Agroindustrial, que abrangem presos do regime semiaberto. Além das mortes, 10 homens ficaram feridos, sendo que dois ainda estão hospitalizados. Oitenta e oito detentos ainda estão foragidos. Na rebelião, celas e colchões foram incendiados. As áreas atingidas foram esvaziadas, com a transferência temporária dos reeducandos para outras unidades próximas.
Segundo a direção da colônia, há 1.254 detentos, sendo que a maior parte (784) fica encarcerada em tempo integral, por falta de emprego (cerca de 500) ou por bloqueios judiciais, como a espera de audiências ou decisões (cerca de 200). Para esse montante, que, na prática, continua em regime fechado, seriam, apenas, 380 vagas.
Apenas 470 sentenciados do semiaberto trabalham durante o dia e retornam apenas à noite. Só é permitida a saída diária nesses casos, para emprego com vínculo comprovado. Para esse grupo, também há superlotação, uma vez que os dormitórios comportariam, somente, 250 pessoas.
Além do preconceito no mercado de trabalho, os detentos têm dificuldade prática para conseguir empregos – como não podem deixar a unidade, as vagas são procuradas por seus familiares. Dentro do sistema prisional do semiaberto, não há estrutura empregatícia, como ocorre no fechado, apenas vagas nas quais há deficiência de servidores, como auxiliares de serviços gerais, limpeza e jardinagem.
Segundo o superintendente de Reintegração Social e Cidadania, Fabrício Bonfim, enfrentar a questão é imprescindível para a pacificação social. “Com a superlotação, todos os esforços são concentrados na disciplina e na custódia dos presos, e as atividades educativas são deixadas de lado. Se ele recebe qualificação, ele terá mais chances na vida. Não é um discurso romantizado de direitos humanos, é estatística: o preso que trabalha reincide menos no crime, apenas dessa forma é possível mudar, de forma efetiva, a segurança pública”, acredita.
A diretora da unidade, Edleidy Pereira dos Santos Rodrigues, também aponta as deficiências estruturais e de pessoal como entraves na custódia e ressocialização. “O CNJ indica que deve haver um agente prisional para cada preso. Aqui, são cinco agentes para 1,2 mil presos. Além disso, não há armamento apropriado para adentrar nas celas e pavilhões. Sofremos com racionamento de água e energia elétrica e os presos reclamam disso. É desumano”, afirma.
Também participaram da vistoria, o procurador-geral da Justiça, Benedito Torres Neto; ouvidor do Poder Judiciário, desembargador Itamar de Lima; o defensor público de Goiás, Rafael Mourthé Terra Santos; representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO), Roberto Serra Silva Maia; Ssuperintendente executivo da Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária (SSPAP), coronel Edson Costa; comandante-geral da Polícia Militar, coronel Divino Alves de Oliveira; e o Superintendente Executivo de Administração Penitenciária, tenente-coronel Newton Nery de Castilho.
Fonte: TJGO