Projeto de justiça restaurativa avança na construção de redes em 10 estados

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Após selecionar 10 tribunais para apoiar a estruturação de núcleos de Justiça Restaurativa, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) iniciou as ações de estruturação de serviços e redes com as esquipes locais. Em maio, foram realizados mais de 15 encontros on-line com magistrados e servidores participantes para um mapeamento detalhado de práticas, projetos e iniciativas já existentes sobre a temática nos estados e para a construção e o fortalecimento de redes locais, que auxiliarão no desenvolvimento das atividades.

Participam do projeto Rede Justiça Restaurativa os tribunais do Acre, Alagoas, Amapá, Ceará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Note, Roraima e Rondônia, assim como o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (Mato Grosso do Sul e São Paulo). A ação irá apoiar as cortes locais a estruturar núcleos restaurativos que atendam ao sistema de justiça criminal e ao sistema de justiça juvenil e socioeducativo, colaborando para a resolução pacífica de conflitos.

O coordenador do Comitê Gestor Nacional da Justiça Restaurativa, conselheiro Luiz Fernando Tomasi Keppen, destacou o esforço das equipes envolvidas para dar seguimento ao projeto. “No cenário atual, com a pandemia de coronavírus, tivemos que reorientar algumas ações. Mas o empenho dos gestores permitiu que os 10 tribunais escolhidos passassem a ser acompanhados no desenvolvimento da política restaurativa.”

“O avanço do projeto e o envolvimento dos tribunais a despeito do contexto de pandemia mostram como há uma demanda importante para ampliação da justiça restaurativa no país que atenda tanto a justiça criminal quanto o sistema socioeducativo. Há uma política nacional gerida pelo comitê do CNJ e que prevê a implementação de núcleos em todas os estados. O projeto Rede Justiça restaurativa está de acordo com a política nacional e é facilitador para seu desenvolvimento”, avalia o juiz auxiliar do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) Antônio Tavares.

O projeto tem auxílio técnico do programa Justiça Presente, parceria iniciada em janeiro de 2019 entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública, para superar desafios estruturais no sistema prisional e socioeducativo. Em fevereiro, o CNJ firmou parceria com o Centro de Direitos Humanos e Educação Popular de Campo Limpo (CDHEP) para promover as ações de Justiça Restaurativa.

Adaptação

Por conta da pandemia de Covid-19, o projeto foi adequado, com a substituição das capacitações presenciais pelo levantamento de redes e reuniões on-line com cerca de 80 pessoas de 10 unidades da federação, com encontros específicos para magistrados. Servidores foram divididos em núcleos, para facilitar a troca de informações. Também houve encontros gerais, com todos os participantes.

A estruturação da Rede Justiça Restaurativa leva em consideração aspectos como o mapeamento de atores institucionais, o delineamento de almejos de justiça restaurativa de acordo com os contextos locais, a articulação de redes comunitárias e atores da sociedade civil e a sensibilização e formação de funcionários dos sistemas de justiça, entre outros pontos.

O CDHEP elaborou uma série de documentos que auxiliarão na análise dos levantamentos e na construção da rede, além de realizar pesquisa junto a órgãos e entidades como Ministério Público, Defensoria Pública e Ordem dos Advogados do Brasil, além de universidades e projetos comunitários.

A escolha das unidades atendeu a critérios objetivos, como o grau de desenvolvimento de ações restaurativas em cada local, existência de normativa para guiar os trabalhos, disponibilidade de quadro de pessoal e quantidade de varas de abrangência e respectivas áreas. Os subsídios para a seleção foram fornecidos pelo Mapeamento dos Programas de Justiça Restaurativa, realizado pelo Comitê Gestor de Justiça Restaurativa do CNJ em 2019.

A juíza federal Katia Herminia Martins Lazarano Roncada, do TRF-3, elogiou a iniciativa do CNJ para a troca de experiências entre os estados. “Essas rodadas iniciais para levantamento de práticas e formação de rede já permitiu, em primeiro lugar, o estabelecimento de um vínculo entre os juízes participantes, que tiveram a oportunidade de partilhar as conquistas, as boas-práticas já alcançadas, mas também dividir as necessidades para o fortalecimento da atuação.”

A juíza ainda avalia como fundamental o engajamento dos magistrados para a readequação de papeis. “Antes o juiz era alguém que dava a última palavra e, agora, um partícipe no contexto de facilitar para que haja um encontro transformador, em que as necessidades das pessoas envolvidas no conflito sejam efetivamente vistas, permitindo a participação, o empoderamento e o reconhecimento da corresponsabilidade, de modo a construir relações mais saudáveis e acolhedoras.”

A iniciativa também promoverá estudos de casos, formação e supervisão de equipes e o acompanhamento dos resultados obtidos, como foco na sensibilização de atores chave como magistrados, promotores e defensores e também na sustentabilidade das ações. Como explica a coordenadora do Eixo que atua com justiça restaurativa no programa, Fabiana Leite, o mapeamento de práticas e a construção de rede são essenciais para o sucesso do projeto.

“A justiça restaurativa trabalha o conflito em dimensão holística, convidando todos os atores para conseguir agir no contexto da violência”, diz. “Um recorte fundamental do projeto Rede Justiça restaurativa é atuar na justiça criminal. O grande desafio é trazer resultados na reversão de processos de criminalização e no encarceramento de pessoas.”

A coordenadora de Justiça Restaurativa no CDHEP, Petronella Maria Boonen, destaca a amplitude que o projeto ganha com a formação das redes. “Quanto mais ampla a abordagem restaurativa, mais amplos serão os resultados. “Uma vez construída e estabelecida a rede, isso vai se refletir na diminuição de reincidência e no trato de injustiças estruturais, que produzem mais violência.”

Política judiciária

A política nacional judiciária de justiça restaurativa é guiada Resolução CNJ nº 225/2016, que apresenta as diretrizes para as ações do Judiciário na área. De acordo com a normativa, a justiça restaurativa “constitui-se como um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado”.

A atuação do projeto Rede Justiça Restaurativa no tema envolverá metodologias diversas, tais como a Conferência Restaurativa Vítima-Ofensor-Comunidade, mais conhecida como VOC, assim como Processos Circulares de Construção de Paz e Conferência de Grupo Familiar. Em comum, todas envolvem a participação da vítima e do ofensor, assim como as famílias dos envolvidos e outros membros da comunidade.

Iuri Tôrres
Agência CNJ de Notícias