O sociólogo e jurista português Boaventura de Sousa Santos atribuiu aos juízes parte da missão de reduzir as injustiças sociais e a responsabilidade do Poder Judiciário na preservação da democracia, nesta terça-feira (30/10), em Brasília. Palestrante convidado para encerrar o Seminário Justiça em Números 2012, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Sousa Santos citou 15 juízes assassinados durante o período em que pesquisava na Colômbia (entre 1995 e 1999) como exemplo do preço que os magistrados pagam por combater as injustiças – à época, a violência no campo e o narcotráfico.
“Essa é a dimensão da responsabilidade do sistema judicial em uma sociedade que é complexa e injusta; portanto, nós, integrantes do sistema de Justiça, não podemos resolver toda a injustiça, mas, se não fizermos a nossa cota-parte na redução da injustiça, de duas, uma: ou seremos ostracizados pela população ou então nos tornaremos uma instituição irrelevante”, afirmou o estudioso, que dirige o Observatório Permanente da Justiça Portuguesa.
O sociólogo lembrou os anos em que estudou no Brasil, onde viveu em favelas do Rio de Janeiro, nos anos 1970. Também contou como, a partir de vivências na comunidade do Jacarezinho, criou o conceito de “Direito de Pasárgada” (nome que serviu de apelido à comunidade onde morou durante a ditadura), espécie de sistema de Direito paralelo à Justiça Estatal, operado pela Associação de Moradores da favela na falta da presença do Estado.
“Os tribunais não têm de resolver a questão social, mas têm de dar a sua contrapartida para a democratização do país, para a preservação da democracia, para a aproximação dos cidadãos à Justiça. Na sociedade em que vivemos hoje, com grande concentração de terras, com grande violência extrajudicial, os tribunais têm de ser muito fortes – e isso não é fácil”, disse.
Presidente – Na apresentação do sociólogo português, o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Ayres Britto, ressaltou outro lado pouco conhecido de Boaventura de Sousa Santos: o lado poeta. “No seu livro Escrita INKZ: antimanifesto para uma arte incapaz, encontrei poemas encantadores, que me levam a afirmar que o livro foi o melhor que li no Brasil nos últimos 10 anos”, disse Ayres Britto. Na saudação de boas-vindas ao jurista, Ayres Britto lembrou que o CNJ representa uma tentativa de se criar um órgão de vanguarda, “no sentido republicano, com os valores republicanos que dão sentido e grandeza a nossa instituição e a nosso país”, concluiu.
O conselheiro Neves Amorim, outro integrante da mesa, usou o elevado número de processos que tramitam na Justiça brasileira – 90 milhões, segundo o Justiça em Números 2011 – no seu apelo por mudanças no Poder Judiciário. “Tirando os incapazes, as crianças, enfim, é praticamente um processo por pessoa no Brasil. Ou nós criamos Justiça com nova estratégia, nova gestão, nova mentalidade ou não vamos atingir o objetivo da cidadania para qual o Judiciário foi criado. O CNJ tem mostrado que Justiça tem de ser mais cidadã, uma casa onde o cidadão vem solucionar seus problemas”, afirmou.
Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias