Os motivos que levam ao sub-registro civil e os meios para a erradicação do problema foram os principais aspectos discutidos nesta quarta-feira (10/11), durante a I Mesa de Debate sobre o Sub-Registro Civil no Estado do Rio de Janeiro, realizada no Tribunal de Justiça do Rio. O evento foi transmitido por teleconferência para outros municípios.
Durante o encontro, foram citados casos para ilustrar a importância do documento civil, como o de uma senhora que, aos 70 anos, estava preocupada em registrar-se para que não fosse enterrada como indigente; o de Bruno, de 20 anos, com retardo mental, que chegou sozinho à fila de uma ação social em São João de Meriti dizendo que não tinha documento e que desenvolveu epilepsia, inclusive sofrendo uma crise durante o atendimento, porque não tinha identificação civil para receber remédios controlados; o de Isaías, que foi menino de rua, respondia a processo criminal e queria reconhecer o filho, mas não tinha identidade; e o de Miriam e Marcelo, que não tinham o documento e, por isso, não podiam registrar seus seis filhos.
“Se não tivermos um papel, um documento que nos apresente à sociedade, não teremos o revestimento jurídico”, destacou o Corregedor-Geral da Justiça em exercício, desembargador Antonio José Azevedo Pinto, abrindo o evento. Ele ressaltou que o artigo primeiro da Constituição Federal nos fala da importância da cidadania e da dignidade da pessoa humana e que o Judiciário não pode atuar apenas quando existir o conflito. “A visão deve ser muito mais ampla, no sentido de fornecer elementos capazes para que todos sejam considerados cidadãos”, afirmou, lembrando ainda que, com o sub-registro, muitos brasileiros não são reconhecidos como cidadãos e que o TJRJ vem buscando combater o problema.
O desembargador Antonio Saldanha Palheiro, presidente da Comissão Estadual dos Juizados Especiais, ressaltou que os Juizados são portas de inclusão social dos consumidores e que, no âmbito social, o Tribunal de Justiça está na vanguarda. “Quando nascemos, temos vida, mas ainda não temos registro na sociedade. Isso é essencial para exercitarmos nossos direitos e deveres”, explicou.
Integrante da Comissão de Avaliação e Acompanhamento de Projetos Especiais, a desembargadora Cristina Tereza Gáulia afirmou que estamos quebrando paradigmas nos últimos anos e que o Tribunal de Justiça do Rio é o melhor do país. Ela enfatizou a importância da necessidade da construção de interfaces entre magistrados e cidadãos e entre os magistrados de primeiro e segundo graus, para que sejam conhecidas as histórias reais por trás dos processos. “Temos que atender as pessoas que batem às nossas portas. Todos nós precisamos pensar sobre erradicação do sub-registro. Somente seremos um bom Judiciário se combatermos as mazelas”, afirmou.
A coordenadora geral de Promoção de Registro Civil de Nascimento da Presidência da República, Beatriz Garrido, focou sua fala na integração entre o governo federal e o Estado do Rio e na necessidade do trabalho em rede. “Devemos garantir o direito ao nome e sobrenome como um direito humano, e não apenas um papel”, disse. Ela informou que a questão vem sendo trabalhada pelo governo federal de forma articulada, sobretudo nas regiões Norte e Nordeste, onde há muitos casos. “Temos que pensar em ações pontuais e também em ações estruturantes para que os índices não voltem a subir”, disse a coordenadora.
Para a juíza auxiliar da Corregedoria Marcela Assad Caram, hoje propiciamos a antecipação à procura, disponibilizando o acesso à cidadania, à dignidade da pessoa humana. “Não adiantam palavras bonitas se não pudermos fazer a diferença na vida das pessoas”, lembrou a juíza.
Legião – Já a juíza titular da 1ª Vara de Família de São João de Meriti, Raquel Crispino, coordenadora de um projeto sobre o assunto, destacou que há uma legião de ‘invisíveis’. “A certidão é a porta de entrada para a cidadania, mas ela tem estado fechada”. Segundo a juíza, muitas pessoas deixam de ser atendidas em postos de saúde ou são enterradas como indigentes por ausência do documento. Ela citou o caso de cerca de 15 pessoas da mesma família que viviam sem documento, porque não conseguiram segunda via da mãe e da avó, impossibilitando o registro dos descendentes.
Ela falou também sobre a necessidade de iniciativas como a instalação de postos de Registro Civil de Pessoas Naturais (RCNP) em maternidades e a produção, pelas Secretarias de Direitos humanos, de vídeos e cartilhas que tratam da importância do assunto e da gratuidade do registro. Destacou, também, que a atuação deve ocorrer em dois focos: possibilitar o registro de recém-nascidos, evitando que eles deixem de ser registrados, e o registro tardio.
Estiveram também presentes ao evento representantes da Defensoria Pública, do Ministério Público, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Associação de Notários e Registradores do Estado do Rio de Janeiro (Anoreg), da Secretaria Estadual de Saúde, do Instituto Félix Pacheco (IFP) e do Detran, entre outros.
Registro – Segundo o IBGE, sub-registro é o conjunto de nascidos não registrados no próprio ano ou até o primeiro trimestre do ano seguinte. Ainda de acordo com o Instituto, as principais causas de sub-registro são o fato de as mulheres esperarem os pais de seus filhos os reconhecerem; as distâncias até o cartório; o custo do deslocamento; o desconhecimento sobre a importância do registro; a ausência de cartórios em alguns locais, entre outras. De acordo com a lei 9.534, de 1997, o registro de nascimento é gratuito.
Fonte: TJRJ