Nesta terça-feira (22/5), durante sua 272ª Sessão Plenária, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) retomou o julgamento de um pedido de providências em que a Associação de Direito de Família e das Sucessões pleiteia a inconstitucionalidade da lavratura em cartórios de escrituras de “união poliafetiva”, constituída por três ou mais pessoas. O pedido de providências foi proposto contra dois cartórios de comarcas paulistas, em São Vicente e em Tupã, que teriam lavrados escrituras de uniões estáveis poliafetivas.
O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do conselheiro Valdetário Monteiro. Até então, acompanhando o voto do relator, Corregedor Nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha quatro conselheiros tinham votado pela procedência do pedido – ou seja, pela proibição dos cartórios de lavrarem este tipo de escritura.
Para o ministro Noronha, a legislação avançou ao reconhecer direitos como o divórcio, a união estável para casais hetero e homoafetivos, mas sempre com o propósito de incentivar a consolidação das relações no casamento e da família, e no sentido de preservar a monogamia.
“Todos os povos respeitaram a monogamia como condição para uma convivência duradoura. A legislação foi criada para proteger a família legalmente constituída, por isso a fidelidade como exigência das uniões homoafetivas. Se as uniões poliafetivas não podem levar ao casamento porque constituiria crime de bigamia ou poligamia, então não podemos reconhecer essa situação”, disse o relator.
Para o ministro Noronha, seria muita precipitação o plenário avançar para legitimar algo que não caberia ao CNJ. “Cabe-nos vedar, porque não encontra amparo na legislação. Não quero ser tomado por um moralista, não estou julgando pelo meu pensamento, mas com a consciência jurídica”, disse. Seguiram seu voto os conselheiros Valtércio de Oliveira, Iracema do Vale, Márcio Schiefler e Fernando Mattos.
Duas divergências
O conselheiro ministro Aloysio Corrêa da Veiga a primeira divergência em relação ao voto do relator. Para Corrêa da Veiga, é possível lavrar escrituras públicas em que se registre a convivência de três ou mais pessoas por coabitação. Contudo, de acordo com o seu voto, não se pode equiparar essas escrituras à união estável e à família.
“Não se pode negar a existência da pretensão de lavrar uma escritura pública em que haja convivência entre homens e mulheres que resolvam definir obrigações e dever de coabitação”, disse Corrêa, cujo voto, pela parcial procedência do pedido, foi acompanhado pelos conselheiros Arnaldo Hossepian e Daldice Santana.
O conselheiro Luciano Frota inaugurou a segunda divergência em relação ao voto do relator, ministro Noronha, no sentido de total improcedência do pedido – ou seja, pela permissão de que os cartórios lavrem escrituras de união estável poliafetiva.
Para o conselheiro Frota, o direito deve acompanhar a dinâmica das transformações sociais e o nosso sistema jurídico possibilita a atualização de seu conteúdo, ajustando-se à realidade da sociedade.
Luciano Frota citou, em seu voto, a desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), Maria Berenice Dias, para quem hoje o que identifica uma família é o afeto, onde se encontra o sonho de felicidade: a Justiça precisa se atentar a essa realidade.
“Não cabe ao Estado determinar qual tipo de família deve existir, as pessoas têm o direito de formular seus planos de vida e projetos pessoais”, disse Frota. E citou a doutrina de Maria Berenice: “A intervenção do Estado na família deve ser apenas no sentido de proteção, e não de exclusão”.
O julgamento foi suspenso por um pedido de vista do conselheiro Valdetário Monteiro. Cinco conselheiros ainda não votaram. O atual resultado do julgamento é provisório, pois é possível que conselheiros alterem os votos já proferidos, o que pode acontecer até o final do julgamento.
Item julgado: 0001459-08.2016.2.00.0000.
Luiza Fariello
Agência CNJ de Notícias