Unidades de internação de adolescentes têm déficit de 559 vagas

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O relatório anual do programa Justiça ao Jovem foi apresentado e aprovado  nesta terça-feira (5/03) durante a sessão plenária do Conselho Nacional de Justiça, pelo conselheiro Walter Nunes da Silva Jr. O programa, que realizou um diagnóstico do sistema socioeducativo dos adolescentes em conflito com a lei, visitou, em 2010, 18 estados, incluindo toda a região norte e nordeste, os Estados de Goiás e Santa Catarina e o Distrito Federal. Foram 116 unidades de internação visitadas, com um total de 5.305 adolescentes internos; no entanto, as unidades apresentam 4.746 vagas, o que revela um déficit de 559 vagas no sistema. O relatório conclui que o tratamento dado aos adolescentes em conflito com a lei não difere em nada daquele dispensado aos adultos encarcerados, quando não é pior. Os diagnósticos apresentados pelo Justiça ao Jovem resultaram, por vezes, na recomendação do fechamento de unidades de internação por falta de condições adequadas de sobrevivência. “Há um descompasso muito grande entre o discurso e a prática, o Executivo não investe nos estabelecimentos nem na reeducação”, diz o conselheiro Walter Nunes.

Em dezembro de 2010, foi decretada a interdição do Centro Educacional São Lucas, no município de São José, em Santa Catarina, após denúncias de tortura e outros tipos de agressão a adolescentes que cumprem medidas socioeducativas. O CNJ também recomendou o fechamento da unidade Plantão Interinstitucional de Atendimento (Pliat), de Florianópolis, onde há idêntica situação de violência. Em ambas unidades, a equipe do CNJ concluiu, após relatar diversos episódios de tortura, que os ambientes eram semelhantes a uma masmorra da Idade Média. Este ano, foi determinada a desocupação gradual do Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje), de Brasília. A recomendação ao governo do Distrito Federal (DF) foi enviada em dezembro após o programa Justiça ao Jovem visitar as quatro unidades de internação do DF, e constatar a necessidade de melhorias para garantir a ressocialização dos menores. “Vamos encaminhar o relatório ao Executivo, ao Ministério da Justiça, Secretaria de Direitos Humanos e governos estaduais”, diz o ministro Cezar Peluso, presidente do CNJ. De acordo com o presidente, a situação atual é da maior gravidade, revelando o sistema arcaico e medieval de nossas cadeias.

Falta de controle – De acordo com o relatório apresentado nesta terça-feira, após as visitas em todo o país constatou-se que inexiste um controle efetivo a respeito da população de jovens internados, seja por parte do judiciário, seja pelo gestor do sistema. Em nenhum estado visitado se viu integração informatizada entre os diversos atores do sistema de justiça para os adolescentes, como o Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Gestor do Sistema, Unidades de Internação, etc.
Segundo o relatório, a falta de uma forma de controle mais efetivo permite que adolescentes sejam transferidos de unidades sem qualquer autorização ou mesmo conhecimento do juízo responsável, dificultando o acompanhamento da execução da pena. Muitos jovens se encontram recolhidos quando poderiam estar livres ou em cumprimento de medida em meio aberto ou semiliberdade.

Péssimas condições – O relatório demonstra que a maioria das unidades visitadas se encontra deteriorada, uma boa parte sem qualquer condição de abrigar com dignidade um ser humano, quanto mais adolescentes, com pessoal em número defasado, sem qualquer proposta ou projeto pedagógico.

Muitas unidades são antigas, ainda com conceito arquitetônico prisional e segregador, isso quando não são delegacias interditadas para adultos, e reformadas para receber os jovens em custódia. O problema da superlotação é recorrente, com jovens amontoados em locais insalubres e sem qualquer condição de higiene.

Não existe nas unidades de internação oficinas profissionalizantes (quando existem, falta material ou professores), nem atividades físicas e de lazer. “Isso desmistifica a crença de que adolescentes ficam impunes. Eles são mantidos em condições semelhantes a dos adultos. Ficam 24 horas presos sem qualquer atividade, o máximo é banho de sol e aula, quando há”, diz o conselheiro Walter Nunes.

O relatório conclui que, sem um projeto pedagógico, as unidades se transformam em verdadeiras prisões, onde apenas a segregação e o isolamento são realidades. Além disso, a violência acaba por ser a única forma de relacionamento entre jovens e educadores, monitores ou agentes de segurança.

É muito precária a assistência médica nas unidades de internação. Poucas dispõem de unidades de saúde, que, quando existentes, salvo raríssimas exceções, estão mal aparelhadas e com escassez de remédios e medicamentos. Os atendimentos médicos e odontológicos limitam-se, no mais das vezes, a situações de urgência, recorrendo-se ao Sistema Único de Saúde – SUS dos municípios. Apenas nos estados da Bahia e do Pará foram encontradas unidades de atendimento e custódia de adolescentes com comprometimento psiquiátrico.

Recomendações – Em todos os estados visitados, o CNJ reuniu-se com as autoridades competentes e sugeriu uma série de recomendações ao poder Judiciário e ao Executivo. Dentre as principais recomendações feitas ao Poder Judiciário, estão a regionalização e especialização de Varas da Infância e da Juventude com competência, exclusiva ou não, para a Execução de Medida Socioeducativa e a criação de um sistema informatizado para controle e acompanhamento dos autos de execução das medidas socioeducativas.

Já ao Poder Executivo, o CNJ recomendou principalmente o cumprimento dos padrões mínimos de salubridade e higiene nas unidades de internação, a implantação de atendimento psicossocial nas unidades, com equipes próprias e especializadas, e a melhoria da qualidade e quantidade da alimentação fornecida aos adolescentes. A garantia de escolarização para todos os internos também é uma recomendação constante do CNJ em todas as visitas realizadas.

Luiza de Carvalho
Gilson Euzébio
Agência CNJ de Notícias