Violência doméstica: perspectiva de gênero deve integrar decisões judiciais

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Fórum de Violência Doméstica de Taguatinga, em Brasília (DF). Foto: Gil Ferreira/CNJ
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“Não vos contenteis de cumprir os deveres do ofício. Vereis desde logo que, para ser um pouco úteis, devereis abandonar os caminhos batidos. Tudo o que fizerdes de bom será um acréscimo. Gosteis ou não, tendes um papel social a desempenhar. Sois assistentes sociais. Vossa decisão não termina numa folha de papel. Ela corta na carne viva. Não fecheis vossos corações ao sofrimento nem vossos ouvidos ao clamor.”

Com o texto “Arenga aos Magistrados que Estreiam”, do magistrado francês Oswald Baudot, a conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Ivana Farina defendeu nessa quinta-feira (22/10) a necessidade de a magistratura entender e levar em conta as perspectivas de gênero nos seus julgamentos. Ela participou de painel no XII Fórum de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar (Fonavid).

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No CNJ, o tema já tem consenso: no início de outubro, o plenário do órgão aprovou recomendação aos tribunais de Justiça para que promovam capacitação em direitos fundamentais, com perspectiva de gênero, a todos os magistrados e magistradas que atuam em juizados ou varas com competência para aplicar a Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha. A medida, assinada pelo ministro Luiz Fux, presidente do CNJ, foi aprovada por unanimidade.

“O Sistema de Justiça precisa abordar essa questão de maneira nova e que traduza o rompimento com esse quadro desigual, violento, estereotipado e discriminatório”, afirmou Ivana. “Nós poderemos ter respostas que interpretam as realidades sob várias perspectivas, ou as respostas que fazem uma repetição de discriminações, de desigualdades estruturais, de violações.”

A conselheira lembrou que a desigualdade de gênero que permeia a sociedade também está visível no próprio sistema de Justiça. Ela citou o diagnóstico elaborado pelo CNJ em 2019, que revelou a falta de paridade entre homens e mulheres no Judiciário. “É fácil perceber que um Judiciário desigual em gênero não entregará à sociedade a garantia de diversidade de participação que existe na diversidade social para onde o julgamento é direcionado.”

Justiça pela Paz em Casa

A conselheira do CNJ Maria Cristiana Ziouva também participou do painel e explicou que duas edições deste ano da Semana Justiça pela Paz em Casa, previstas para agosto e novembro, foram suspensas com a situação de pandemia do Covid-19. Realizada três vezes por ano pelos tribunais em parceria com o CNJ, o projeto promove palestras, ações de cidadania e uma espécie de mutirão de julgamentos e análises de processos sobre o tema.

Para tomar a decisão da suspensão, o CNJ ouviu representantes do Fonavid e do Colégio de Coordenadores da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário Brasileiro (Cocevid), que não consideraram possível manter a normalidade dos julgamentos frente às dificuldades de se colher provas, ouvir testemunhas e fazer Tribunais de Júri. “Para que não passassem em branco, as 17ª e 18ª edições, que não puderam ser realizadas esse ano, foram destacadas durante o Fonavid.”

Maria Cristiana Ziouva reconheceu o importante papel que cumprem magistrados e magistradas que lidam com os casos de violência contra a mulher e que “têm sensibilidade e coragem para entregar uma Justiça mais humana, acessível e compromissada”. “Vamos acreditar que nós operamos o Direito com essas convicções: com a mão estendida e com compromisso.”

O XII Fonavid termina nesta sexta-feira (23/10) e está trazendo pontos de vistas de professores, psicólogos, economistas e juristas sobre o tema que movimenta mais de um milhão de processos no Judiciário brasileiro – a violência doméstica contra a mulher. Esse ano, o enfoque foi voltado ao impacto da Covid-19 na vida das brasileiras.

Regina Bandeira
Agência CNJ de Notícias