Na sexta-feira (23/10), a juíza coordenadora da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), Rosa Geane Nascimento, e os magistrados Antônio Henrique de Almeida Santos, titular da 17ª Vara Cível e presidente do Foeji, e Haroldo Rigo, titular da comarca de Carira (SE), participaram da live “Encontro Estadual sobre Medidas Socioeducativas em meio aberto: do dito ao feito”.
O evento é uma parceria entre o Poder Judiciário, em uma ação do Programa Fazendo Justiça, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e o governo estadual, por meio da Secretaria da Inclusão e Assistência Social. Ele reuniu gestores, coordenadores e equipes psicossociais de instituições, os CREAS e os CRAS.
A abertura do evento foi realizada por Thiago Malaquias, coordenador do Nupeia, e Ana Paula Lopes, ativista da UNEGRO Sergipe. Eles instigaram os participantes a pensar as medidas socioeducativas de forma crítica, abordando a desigualdade social e enxergando os adolescentes a partir de uma totalidade, a partir de uma identidade histórica e não apenas do ato infracional.
O convite do encontro foi pensar quem são os adolescentes em cumprimento das medidas socioeducativas, uma vez que, segundo os interlocutores, flagrantemente são negros, inseridos no sistema por atos de roubo e tráfico, crimes clássicos de uma desigualdade social. E foi deixada para os participantes uma reflexão sobre uma transformação estrutural e histórica do sistema.
A juíza Rosa Geane explicou que o Plano Municipal de Atendimento Socioeducativo está implantado em 80% dos municípios de Sergipe. Ela informou que o TJSE realiza, desde 2010, as audiências concentradas, primeiramente no acolhimento e, em sequência, na socioeducação, com acompanhamento institucional e com ênfase na manutenção dos vínculos comunitários e familiares e no cumprimento dos prazos legais.
Rosa Geane ainda apresentou projetos desenvolvidos pela Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ) do TJSE. Um proporciona assistência religiosa e ecumênica aos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, o Projeto Presença. O outro, em fase de elaboração, vai ofertar oportunidade de primeiro emprego nas unidades do Poder Judiciário.
“A perspectiva da CIJ é mudança de paradigma, voltada para o acolhimento dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, desde a porta de entrada no sistema. Não estamos confortáveis com dados e com a realidade e precisamos encarar com maturidade e sensibilidade que as pessoas com maior vulnerabilidade social sofrem uma maior penalização”, explicou.
Ela explicou as ações que o TJSE busca fortalecer. “Queremos um enfrentamento e criação de alternativas à internação, fortalecendo a liberdade assistida, a prestação de serviço à comunidade e a Justiça Restaurativa, que traz uma mentalidade de construção de paz. Temos a consciência que se não dermos uma assistência para quem está vulnerável, uma assistência para o adolescente que cumpre a sua medida e para aqueles que estão saindo do sistema socioeducativo, teremos como resultado a reiteração em ato infracional.”
O juiz auxiliar da Presidência do CNJ, Antônio Tavares, que coordena o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), destacou que, conforme pesquisa realizada em 2019, 117 mil adolescentes cumpriam medidas socioeducativas em meio aberto no Brasil. Em 82% dessas medidas, como a prestação de serviço à comunidade e a liberdade assistida, há a possibilidade de continuidade do vínculo familiar e comunitário, o que resulta em uma maior proteção social e na possibilidade de políticas públicas mais eficientes.
A secretária da Inclusão e Assistência Social de Sergipe, Lêda Lúcia Couto, explicou que o evento é um espaço de discussão das medidas socioeducativas em meio aberto, cuja expectativa é contribuir para o fortalecimento do meio aberto como uma importante ferramenta de acesso à proteção social. Ela destacou que, do ponto de vista sociológico, os adolescentes que estão na socioeducação necessitam, como outros adolescentes, de ações preventivas e inclusivas, de políticas públicas sociais de proteção.
O juiz Antônio Henrique apresentou os dados referentes aos processos de competência da 17ª Vara Cível que, além de julgar os processos de ato infracional, aplica as medidas de meio aberto em Aracaju e as medidas em meio fechado de todo o estado. Segundo ele, são 504 processos em execução, sendo 339 em meio aberto, referente apenas à capital. E 165 em meio fechado, sendo 140 de medidas de internação e 25 de semiliberdade.
Ao final, apresentou uma proposta para os participantes. “A coleta de dados é fundamentais para traçar um diagnóstico especifico dos nossos adolescentes e nos apontar para uma direção, para uma política efetiva. Minha proposta é criar um fórum permanente, analisar os problemas, os meios que detemos, as necessidades e possibilidades e buscarmos juntos solucionar esses problemas.”
Juiz titular da comarca de Carira, Haroldo Rigo falou sobre a abordagem no sistema socioeducativo dos círculos restaurativos de construção de paz e a reconstrução dos vínculos sociais, familiares e comunitários, utilizando-se a Justiça Restaurativa como ferramenta de ressignificação das estruturas de atendimento aos adolescentes em conflito com a lei. “Para além de um projeto, programa ou política pública, a Justiça Restaurativa é uma nova linguagem, nova forma de abordar o diálogo do sistema de Justiça com a rede e com a comunidade.”
Ele explicou como a Justiça Restaurativa inova para buscar soluções mais efetivas. “Enquanto a justiça tradicional busca coibir as violações da lei e do Estado, com imposição de culpa e na punição do ofensor, a Justiça Restaurativa trabalha a violação sob a ótica das pessoas e dos relacionamentos que foram rompidos a partir do conflito que gerou as violações. Assim, a responsabilização se dá a partir da reparação dos danos, da necessidade da vítima e também do ofensor que têm causas antecedentes que o levaram a essa realidade.”
Fonte: TJSE