Com menos de duas décadas de existência, os sistemas de juizados já apresentam problemas e pedem revisão de regras e de métodos. O principal ponto de preocupação é a sobrecarga do sistema, uma vez que as demandas aumentam sem a devida correspondência de recursos e de pessoal. O resultado é a crescente demora na solução de litígios, com mais de 1.000 dias em determinados casos, quando é considerada normal uma média de 60 dias.
De acordo com o ex-presidente do Fórum Nacional dos Juizados Especiais (Fonaje), juiz Mario Kono de Oliveira, a facilidade de acesso à Justiça e o bom funcionamento dos juizados levou a demanda a aumentar muito, e a estrutura do Judiciário se mostrou insuficiente para atendê-la. “Ficaram prejudicadas as conciliações, que praticamente deixaram de existir, e aumentou a morosidade”, argumenta.
A falta de estrutura, de magistrados e de pessoal é apontada como um dos maiores problemas. Segundo dados do Justiça em Números 2014, os juizados estaduais têm 832 magistrados com atuação exclusiva, sendo que 1,5 mil acumulam a função com varas comuns. Nos juizados federais, são 250 juízes com atuação exclusiva e 219 acumulando a função com as varas federais.
Resistência – Para o atual presidente do Fonaje, Gustavo Gastal, ainda há certa resistência dos tribunais em relação aos juizados, o que acaba dificultando a ampliação do sistema. “Apesar de 20 anos de vigência da lei, a cultura ainda não foi suficientemente amadurecida nos tribunais. A maioria dos colegas desconhece a realidade dos juizados e já houve casos de tribunais que preteriram juízes do sistema nas promoções”, aponta. Ele lembra que a discriminação não faz sentido, pois sem os juizados a Justiça comum estaria ainda mais assoberbada.
O conselheiro do CNJ Guilherme Calmon, que foi coordenador dos juizados federais da 2ª Região, defende evolução no tratamento do sistema especial. “É necessária mudança de cultura dos tribunais e dos juízes, pois os juizados não representam um modelo de menor importância ou de menor efetividade”, diz.
Competência – O juiz e ex-conselheiro do CNJ Guilherme Vasi Werner credita à flexibilidade de competências parte do problema dos juizados. “Como competência é de escolha do autor, a demanda migra conforme conveniência para a parte ou para o advogado, e isso dificulta o planejamento. O tribunal não sabe se implanta novo juizado, se implanta vara cível”, aponta. De acordo com ele, uma das soluções para enfrentar os números crescentes é investir na figura dos juízes leigos, prevista na legislação. O juiz leigo atua nesses juizados como auxiliar do magistrado que dirige o processo, realizando diversas tarefas sob a supervisão do juiz togado.
Integrante da Turma Nacional de Uniformização, o juiz federal João Lazzari acredita que a ampliação de estrutura não é a única solução para o impasse dos juizados federais. “O que tem hoje é distanciamento entre decisão e ação administrativa. Tem que ter harmonização na parte da administração pública para observar o que tem sido decidido”, aponta. Assim como outros especialistas, ele defende acordos e convênios com órgãos competentes e o fortalecimento da conciliação.
Lazzari ainda defende adoção de tutela coletiva pelo Ministério Público ou entes legitimados para que ações sobre o mesmo motivo deixem de ser individualizadas, o que acaba sobrecarregando ainda mais o sistema. O juiz lembra que o novo Código de Processo Civil (CPC) traz essa possibilidade, o que pode trazer reflexos positivos para os juizados.
Além da melhor canalização de recursos financeiros, de pessoal e de tecnologia, com implantação de processo eletrônico eficiente, os magistrados apontam ainda a necessidade de planejamento estratégico e de padronização de procedimentos e de gestão, inclusive com capacitação de servidores e de magistrados.
A vazão de processos passa, inclusive, pela atuação dos tribunais superiores. “É importante que determinados assuntos possam ter sua solução rapidamente alcançada pelos tribunais superiores de modo que haja a mesma solução adotada pelos juizados”, argumenta o conselheiro do CNJ Guilherme Calmon.
Ele também recomenda a especialização de juizados sobre matérias para um tratamento adequado a demandas sensíveis, como juizados do idoso, de acidentes de trânsito, e do meio ambiente. O próprio CNJ capitaneou a instalação de juizados em aeroportos, durante a Copa do Mundo.
Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias