Comissões para inclusão de deficientes atuam em 90 tribunais

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Na Comarca de Cristalina, os alunos da Escola Especial Dr. João Rennó Salomon, mantida pela Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE-GO), têm o Fórum da cidade como laboratório para se profissionalizarem e terem uma experiência de trabalho. Uma parceria lançada no último mês de agosto entre o Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) e a APAE abriu vagas de estágio não remuneradas para jovens e adultos com deficiência. A parceria está em consonância com a Resolução CNJ 230/2016, que determina que todos os tribunais instituam internamente uma Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão. Atualmente, pelo menos 90 tribunais já estão cumprindo a determinação.

A juíza Priscila Lopes, de Cristalina, conta que o projeto surgiu de uma conversa entre os magistrados. “Queremos unir as funções do Judiciário, porque, além de pacificar a sociedade resolvendo os conflitos, também é importante implementar direitos fundamentais. Acredito que com o projeto estamos implementando um grande direito fundamental, que é o direito a igualdade”, salienta. A magistrada destaca que dificilmente essas pessoas teriam acesso ao fórum se não fosse por meio do projeto. “Aqui eles vão saber como funcionam as atividades e nos ajudar. Inicialmente, o objetivo é fazer com que eles aprendam tarefas simples, mas nós vamos visualizar em cada um deles o que têm para nos oferecer porque cada um tem sua individualidade e pode contribuir de forma diferente com os serviços judiciários”, explica.

Para o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, a legislação brasileira passou por importantes mudanças nos últimos anos. No entanto, apesar das conquistas recentes, há muito a avançar.

“Hoje é o dia Nacional da Luta das Pessoas com Deficiência e não podemos deixar passar essa data sem reforçar o caráter constitucional da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI), em vigor desde 2016, que reconheceu que todas as pessoas têm capacidade de ter e exercer seus direitos civis, independentemente de possuir deficiência. Isso inclui o direito de casar, votar, possuir bens, poder trabalhar, entre outros”, enfatizou Dias Toffoli. “A própria Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência foi uma importante mudança de paradigma para a sociedade”, completou. 

Quase 24% da população brasileira é composta por pessoas que possuem algum tipo de deficiência. De acordo com o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil, vivem 45 milhões de Pessoas com Deficiência (PCDs). Conforme o IBGE, homens e mulheres de 16 a 64 anos com deficiência no grau severo ou mental/intelectual participam menos do mercado de trabalho.

A diretora da Apae de Cristalina, Cristina Maróstica, diz que trabalhar significa para essas pessoas inclusão, respeito e autonomia. Para ela, o convívio com eles é agregador para todos. “O projeto é um avanço na vida dessas pessoas. O Judiciário está abrindo portas para a Apae de Cristalina. Isso é inclusão de verdade. O olhar dos juízes para esses jovens adultos é único e eles serão gratos pelo resta da vida”, analisa, ao citar o aumento da qualidade de vida e o respeito à diversidade.

Outros estados

A Comissão de Acessibilidade do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) instituiu um plano de ação para melhor atender as demandas provenientes das Comarcas e demais órgãos da Corte. O objetivo do Plano Plurianual de Acessibilidade foi justamente definir estratégias de inclusão e superação de barreiras, segundo critérios de urgência e de disponibilidade orçamentária. Para consolidar os trabalhos e garantir a sua eficácia, a Comissão de Acessibilidade do TJ-PR fez uma divisão em seis eixos temáticos de estudo: capacitação de magistrados, servidores e terceirizados; adaptações arquitetônicas que atendam à inclusão e acessibilidade; disponibilização de mobiliário e ferramentas de tecnologia adequados aos servidores, magistrados e jurisdicionados com deficiência, regulamentação legal que inclua os direitos das pessoas com deficiência; assistência médica e social voltada aos servidores e magistrados com deficiência e projetos externos que promovam a inclusão de pessoas com deficiência.

No Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJ-DFT), Ernandes Feitosa é analista judiciário, cego e trabalha com auxílio do sistema de JAWS, que transforma em áudio o conteúdo da tela. Além disso, o tribunal possui uma van adaptada para o transporte de servidores com deficiência que apresentam barreiras para acessar o local de trabalho. 

Resolução

A adoção das comissões, informada pelos tribunais ao CNJ, inclui a Justiça Estadual, Federal, Eleitoral, Trabalhista e Militar de acordo com a Resolução 230 do CNJ. As comissões são compostas por magistrados e servidores e são responsáveis por fiscalizar e planejar os projetos arquitetônicos de acessibilidade, os projetos pedagógicos de treinamento e capacitação dos profissionais que trabalhem com pessoas com deficiência.

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As ações em andamento no Judiciário envolvem, entre outras, a contratação de intérprete de Libras (linguagem de sinais) para as audiências e os julgamentos, a adoção de sistemas para possibilitar o trabalho de deficientes visuais e a capacitação de juízes e servidores sobre o tema da acessibilidade. No próprio CNJ, onde existem nove servidores com deficiência mais alguns colaboradores terceirizados, a Seção de Arquitetura (SARQT) tem buscado atender às questões de acessibilidade asseguradas pela Norma Brasileira Regulamentadora n. 9050 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Piso tátil, leitura das sinalizações visuais em braille, corrimões e rampas de acesso são exemplos do trabalho realizado para garantir acessibilidade dentro do Conselho. 

Legislação

Norma constitucional no Brasil desde 2008, a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI), definem pessoas com deficiência como “aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”. As mudanças legais trouxeram também alterações na nomenclatura dos tipos de deficiência. Entre as principais mudanças está a troca do termo “pessoa portadora de deficiência” por “pessoa com deficiência”. 

Paula Andrade
Agência CNJ de Notícias