Ver de perto a situação do acolhimento de imigrantes venezuelanos no Brasil, com foco na situação de crianças e adolescentes, foi o objetivo de missão realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em Roraima. A partir das visitas aos abrigos locais e da atuação do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR), o CNJ vai discutir o diagnóstico da situação e propor soluções que atendam às condições legais do cuidado com a infância.
A comitiva do CNJ, composta pelo coordenador do Fórum Nacional da Infância e da Juventude (Foninj), conselheiro Luciano Frota, e das juízas auxiliares da Presidência e da Corregedoria, respectivamente, Lívia Peres e Sandra Silvestre, conheceu a Operação Acolhida, promovida pelo Exército brasileiro. A força-tarefa envolve o Poder Público local e federal, a sociedade civil e organizações internacionais. Com os dados colhidos durante visitas a abrigos de Boa Vista e Pacaraima, o grupo pretende subsidiar a atuação do CNJ quanto ao enfrentamento de questões relativas à regularização migratória de crianças e adolescentes venezuelanos imigrantes em território nacional.
Na avaliação dos representantes do CNJ, os locais que recebem as famílias venezuelanas têm estrutura adequada para o acolhimento. No entanto, já não há mais espaço para mais pessoas. De acordo com dados da Operação, Roraima tem o segundo maior fluxo imigratório do mundo. Até o final de 2019, o Brasil recebeu, por dia, 523 imigrantes. Em média, 50% desse contingente permanece em território nacional e a outra metade apenas passa pelo Brasil com destino a outros países.
Garantia de direitos
O conselheiro Luciano Frota afirmou que o envolvimento do Judiciário na questão tem o objetivo de garantir os direitos constitucionais e o cumprimento de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. Além disso, ao conhecer como funciona o fluxo da imigração, o Judiciário pretende trabalhar na proteção prioritária de crianças e adolescentes, que é a situação emergencial.
Frota afirmou que o Foninj deve avaliar, a partir de fevereiro, propostas de aproximação com a Casa Civil, órgão que coordena a Operação Acolhida. A ideia é criar um grupo para participar das discussões junto ao governo federal, evitando problemas com os compromissos do Brasil em relação à defesa prioritária das crianças.
Além disso, as condições dos abrigos devem ser verificadas, a fim de minorar o sofrimento das famílias. “É preciso reaparelhar os abrigos para atender aos requisitos legais. Há uma absoluta necessidade de sustento. O CNJ deve participar mais ativamente, em parceria com o TJRR”, disse o conselheiro.
Outra preocupação é com a uniformização dos dados dos imigrantes, que diferem nos registros da Operação, dos órgãos internacionais e da Casa Civil. “Hoje, cada instituição tem um sistema próprio, que não se comunica com os demais e os dados se chocam. É preciso ter informações mais confiáveis para pensar em uma política mais efetiva”, afirmou a juíza auxiliar da Presidência do CNJ, Lívia Peres.
O monitoramento das ocupações e da interiorização das famílias também está na pauta. A Organização Internacional de Migração (OIM), agência da Organização das Nações Unidas (ONU), possui informações sobre os abrigos e ocupações, mas não há dados sobre os que estão em situação de rua. Atualmente, há 2.840 pessoas em ocupações. Quanto à interiorização, que pretende levar as famílias para outros estados do Brasil, ainda faltam dados sobre quantas famílias saíram de Roraima e os locais que as receberam.
Segundo o Exército, de março de 2018 a janeiro de 2020, 26.434 pessoas foram interiorizadas. O que se pretende é capacitar as pessoas para que possam encontrar emprego, além de trabalhar pela reunificação familiar e social dos imigrantes.
Aumento da demanda judicial
O número de processos na Vara da Infância e Juventude de Roraima também sofreu um impacto relevante desde o início do processo imigratório. De acordo com a Corregedoria Nacional de Justiça, o TJRR possui cerca de 4 mil processos sobre o assunto, dos quais a metade é referente aos venezuelanos. Para a juíza auxiliar da Corregedoria Sandra Silvestre, o CNJ está dando suporte para que o tribunal consiga atender as demandas.
“O TJRR é proativo e busca rapidamente soluções rápidas para o enfrentamento do aumento da demanda. Eles possuem estatísticas específicas sobre os venezuelanos e por isso conseguem identificar os processos referentes aos imigrantes”, disse. De acordo com a magistrada, o tribunal trabalhou na melhoria significativa dos projetos, tornando o atendimento da Justiça Itinerante nos abrigos permanente e contínua; e deve inaugurar, esta semana, um posto de atendimento da Justiça, em Pacaraima, com a Operação Acolhida.
O próximo passo do Foninj será compartilhar os dados da missão com o Observatório Nacional de Casos Complexos, de Grande Impacto e Repercussão, que também acompanha os desdobramentos da entrada de venezuelanos no Brasil. “A ideia é que tenhamos um trabalho integrado do CNJ”, afirmou Frota.
Lenir Camimura Herculano
Agência CNJ de Notícias