O Brasil discute cooperação jurídica com vários países para solucionar o drama de 304 crianças que entraram ou foram retiradas do território nacional sem autorização da família ou outros responsáveis, segundo dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), atualizados em junho. Dos pedidos de cooperação jurídica internacional em tramitação, 79% são de países que pedem o retorno de crianças trazidas para o Brasil. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com o objetivo de aprimorar a atuação dos magistrados brasileiros, elabora uma cartilha sobre a Convenção da Haia de 1980, que padroniza os procedimentos indicados para os casos de sequestro internacional de crianças.
“Um dos fatores que motivaram a elaboração da cartilha foi ainda haver desconhecimento a respeito das diretrizes da Convenção da Haia sobre os aspectos civis do Sequestro Internacional de Crianças, inclusive, por parte dos juízes. Provavelmente o conteúdo da cartilha ficará pronto até o final de outubro. Assim, será possível encaminhar o texto para publicação”, informou o conselheiro do CNJ Guilherme Calmon, coordenador do grupo de trabalho que discute propostas de fomento à participação do Brasil na cooperação jurídica internacional.
O grupo foi criado pela Portaria n. 190, de 24 de outubro de 2013, da Presidência do CNJ, com a atribuição de elaborar diagnóstico sobre os principais problemas enfrentados pelos tribunais brasileiros em relação à cooperação jurídica internacional em matéria civil e penal. A partir do diagnóstico, serão adotadas medidas para orientar os magistrados e apresentadas propostas de atos normativos que, depois de aprovados pelo Plenário do CNJ, deverão ser aplicados em todo o Judiciário nacional.
Além do coordenador Guilherme Calmon, participam do grupo o conselheiro do CNJ Saulo Casali Bahia, a desembargadora Mônica Jacqueline Sifuentes Pacheco de Medeiros, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), o juiz José Carlos Dantas (TRF5), o juiz Marcelo De Nardi (TRF4), a juíza Marcela Brandão e o juiz Wilney Magno, ambos do TRF2.
Padrão – A convenção que será a base da cartilha do CNJ foi assinada em 25 de outubro de 1980, na cidade de Haia, na Holanda, e tem o Brasil entre os países signatários. Ela considera ilegal a transferência ou retenção de uma criança quando há violação ao direito de guarda atribuído a pessoa, instituição ou outro organismo, previsto pela legislação do país de onde ela foi retirada.
A convenção padroniza as medidas a serem adotadas pelos países contratantes para garantir o retorno imediato das crianças que foram retiradas de seus lares ilegalmente. Ela também prevê que cada país designará sua respectiva Autoridade Central, encarregada de dar cumprimento às obrigações destinadas à solução desse tipo de ilegalidade. No Brasil, onde a convenção entrou em vigor em 2000, a partir do Decreto Presidencial n. 3.413, de 14 de abril daquele ano, a Autoridade Central é a SDH/PR.
Um dos procedimentos indicados pela convenção é a mediação, destinada a facilitar a comunicação entre as partes em conflito, com incentivo para que elas assumam a responsabilidade pela busca de uma solução. Outra medida é a conciliação, que orienta e ajuda as partes a buscarem acordo para o impasse. Por sua vez, a arbitragem atribui a solução a um árbitro designado. Além desses temas, a cartilha do CNJ vai abordar o papel da Autoridade Central, o encaminhamento de casos à Advocacia-Geral da União (AGU) e os documentos necessários para a instrução da petição inicial.
Registro de sequestros – Segundo a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, 304 crianças que entraram ou foram retiradas ilegalmente do território nacional são objeto de 243 pedidos de cooperação jurídica internacional. Do total de pedidos, apenas 21% foram apresentados pelo Brasil, relativos a crianças retiradas do país ilegalmente. Os 79% restantes foram protocolados por países estrangeiros e tratam de crianças trazidas para o Brasil. Nesse segundo grupo, Portugal é recordista em número de pedidos (37), seguido de Itália (20) e Estados Unidos (16).
A SDH/PR interpreta o expressivo número de pedidos apresentados por países estrangeiros como um dos efeitos da crise econômica internacional, que tem obrigado brasileiros a retornar ao Brasil, acompanhados de seus filhos. Na maioria dos casos, o retorno acontece sem o cumprimento das formalidades necessárias. Já em relação ao baixo índice de pedidos relacionados a crianças retiradas do Brasil, a SDH/PR aponta como causa um maior rigor nos procedimentos exigidos para a saída de crianças brasileiras do território nacional.
Jorge Vasconcellos
Agência CNJ de Notícias
Matéria atualizada em 17/10/14, às 12h36.