Participação em Audiências da Corte IDH
O CNJ, em decorrência das atribuições elencadas na Resolução n. 364/2021, é destinatário de convocações da Corte IDH para participar, na condição de mecanismo nacional independente, de Audiências públicas sobre casos em trâmite naquele tribunal relacionados ao Estado Brasileiro.
Aqui são apresentados o teor das manifestações orais realizadas pelos representantes do CNJ nas Audiências públicas convocadas pela Corte IDH em relação a casos envolvendo o Estado brasileiro.
MANIFESTAÇÃO DO EMBAIXADOR RICARDO NEIVA TAVARES – ASSESSOR-CHEFE DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO STF
Bom dia! Sou Ricardo Neiva Tavares, Embaixador da Carreira Diplomática brasileira, cedido pelo Itamaraty ao Supremo Tribunal Federal, desde o ano passado, onde sou chefe da Área Internacional na Presidência do STF.
O Presidente do STF é também Presidente do Conselho Nacional de Justiça e, nesse contexto, integro a representação do CNJ, juntamente com o seu Secretário-Geral, Juiz Valter Shuenquener, e com o Juiz-Auxiliar da Presidência, Dr. Luís Lanfredi.
Gostaria de saudar, em meu nome e em nome dos integrantes do CNJ, a senhora Presidenta da Corte e os demais Juízes que a integram, bem como todos os participantes dessa audiência.
Tendo em vista o disposto no Artigo operativo 5 da Resolução da Corte de 28 de janeiro último, que solicita um informe oral ao CNJ na presente audiência, como outra fonte de informação, passo a palavra ao Dr. Valter Shuenquener, que abordará aspectos institucionais das atividades do CNJ e sua relação com a Corte, e, em seguida, o Dr. Luís Lanfredi discorrerá sobre a atuação do CNJ com base no Caso Ximenes Lopes.
Muito obrigado!
Assista à intervenção do Assessor-Chefe de Assuntos Internacionais do STF na Audiência Pública de supervisão do Caso Ximenes Lopes, realizada no dia 23 de abril de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ VALTER SHUENQUENER DE ARAÚJO – SECRETÁRIO-GERAL DO CNJ
Nossos cumprimentos aos Juízes e Juízas da Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao Senhor Secretário Executivo e aos demais participantes desta reunião.
Primeiramente, compartilho com todos as saudações do Ministro Luiz Fux, Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, agradecendo-lhes, mais uma vez, pelo espaço deste lugar de fala.
A Constituição Brasileira de 1988 alçou a dignidade da pessoa humana à condição de valor central da ordem jurídica brasileira. E foi inspirado nesse paradigma que o Brasil reconheceu a competência contenciosa da Corte, em 1998. O Conselho Nacional de Justiça compreende a importância das decisões que emanam desta Corte e tanto é assim que para fortalecer o sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, editou a Resolução n. 364, no final do ano de 2020, criando a Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões deste Tribunal, cujo objetivo principal é “adotar as providências necessárias para monitorar e fiscalizar as medidas adotadas pelo Poder Público para o cumprimento das sentenças, medidas provisórias e opiniões consultivas proferidas pela Corte Interamericana envolvendo o Estado brasileiro”.
E em nossa primeira participação nesta bancada quero enfatizar aos Juízes e Juízas deste Tribunal o compromisso e a viva disposição do Conselho Nacional de Justiça para atuar pelo fortalecimento das garantias e direitos da pessoa humana, de modo a se superar situações e contextos que depreciem ou impeçam a concretização e a efetividade das expressões de todos os indivíduos.
A partir da recém-criada Unidade de Monitoramento e Fiscalização das Decisões desta Corte, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, vamos envidar todos os esforços necessários e possíveis para incrementar a capacidade de interlocução interinstitucional que o CNJ desenvolveu em seus 15 anos de existência e seu próprio mandato de aprimorar o funcionamento dos órgãos do sistema de justiça, para que se implementem todos os compromissos do Estado Brasileiro na promoção dos direitos humanos essenciais.
Passo a palavra ao Juiz Luís Geraldo Lanfredi, que é Coordenador Institucional da referida Unidade, para as considerações oficiais e os encaminhamentos que serão adotados pelo Conselho Nacional de Justiça, tendo por marco a decisão do caso Ximenes Lopes
Assista à intervenção do Secretário Geral do CNJ na Audiência Pública de supervisão do Caso Ximenes Lopes, realizada no dia 23 de abril de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ LUÍS GERALDO LANFREDI – COORDENADOR INSTITUCIONAL DA UMF
Honorável Juíza Presidente,
Honoráveis Juízes Interamericanos,
Saudações cordiais a todos e todas que participam desta audiência pública! A sentença do caso Ximenes Lopes aponta como pendência para esta atividade de supervisão de suas determinações, e como medida de reparação, “a realização de capacitações aos profissionais que lidam com as questões de saúde mental”.
Aqui, como bem está dito na decisão da Corte Interamericana, trata-se de uma garantia de não repetição, edificada sob a lógica da reparação integral, premissa que norteia todo o sistema regional de proteção de direitos humanos.
Essa medida pendente, tal como a compreendemos, destina-se não apenas aos agentes de saúde que intervêm no contexto de saúde mental, mas também alcança os atores do sistema de justiça.
Por outro lado, “não há discricionariedade ampla do Estado sobre o conteúdo das capacitações”. Isto porque para se garantir a efetividade do parágrafo 250 da sentença, consideramos que essas atividades formativas, as quais devem acontecer tanto com a natureza de formação inicial ou continuada, devem estar comprometidas com um enfoque pré-determinado: os parâmetros
internacionais sobre saúde mental a partir de uma perspectiva de direitos humanos. Pois bem, o que o Conselho Nacional de Justiça já fez a respeito desse contexto? No ano de 2012, realizou o seminário “Saúde Mental e Lei: os desafios da implantação da Lei 10.216/01”, legislação essa que, aprovada pelo Parlamento brasileiro, redefiniu os parâmetros da atenção à saúde mental no
país. Esse seminário alcançou juízes e juízas de todo o território brasileiro.
Por outro lado, como desdobramento do seu mandato normativo-regulamentar, o Conselho Nacional de Justiça editou dois atos: a Resolução 113, de 2010, para dispor que “as medidas de segurança devem ser executadas nos termos da Lei 10.216/01” e a Recomendação 35, de 2011, que estabeleceu diretrizes para a desinstitucionalização das pessoas com deficiência psicossocial submetidas à medida de segurança.
Para esses três movimentos, frise-se, a ideia foi referendar a lógica da internação como ultima ratio e o redirecionamento do modelo assistencial de saúde mental para serviços substitutivos em meio aberto.
Porém, compreende-se a possibilidade de se fazer mais, de modo a avançar- -se na sedimentação dos parâmetros internacionais entre todos os atores que guardam alguma relação com o contexto da saúde mental.
Por esse motivo, com o fim de atuar para o integral cumprimento da sentença da Corte Interamericana, o Conselho Nacional de Justiça propõe-se a algumas atividades, a saber:
(1) Criação de Grupo de Trabalho para explorar o potencial de trabalho dos parâmetros internacionais sobre Saúde Mental, visando extrair dele, entre outras, a proposição de cursos de capacitação online, podcasts e um calendário anual de eventos de formação inicial e continuada para fomentar a especialização da atuação dos profissionais e gestores da saúde e de atores do sistema de justiça que lidam com esse contexto;
(2) Regulamentação de inspeções em hospitais psiquiátricos e outros espaços em que haja internação involuntária ou privação de liberdade de pacientes judiciários em conflito com a lei, no âmbito do sistema de justiça;
(3) Fortalecimento da atuação institucional de órgãos independentes que já realizam essas inspeções, em particular o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT);
(4) Edição de Resolução para a orientação destinada a juízes e juízas de todo o país sobre as formas de atuação especial para prevenir e reprimir as situações de tortura.
É o que tínhamos para apresentar!
Muito obrigado!
Assista à intervenção do Juiz Coordenador da UMF/CNJ na Audiência Pública de supervisão do Caso Ximenes Lopes, realizada no dia 23 de abril de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ VALTER SHUENQUENER DE ARAÚJO – SECRETÁRIO-GERAL DO CNJ
“Nossos cumprimentos aos Juízes e Juízas da Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao Senhor Secretário Geral da Corte, bem como aos representantes do Estado Brasileiro, aos representantes dos beneficiários das medidas provisórias e demais participantes desta reunião. Primeiramente, compartilho com todos as saudações do Ministro Luiz Fux, Presidente do STF e do CNJ, agradecendo-lhes pela distinção do convite para estar nesta reunião e colaborar com o adequado encaminhamento das pendências processuais existentes.
É por intermédio da atuação da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões da Corte Interamericana, que o CNJ pretende intervir com sua capacidade de ação e interlocução para compor junto aos quatro contextos de privação de liberdade (Unis, Curado, Pedrinhas e Plácido), objetos das medidas provisórias estabelecidas por esta Colenda Corte de Direitos Humanos, sobretudo com ênfase na análise dos impactos da pandemia de coronavírus nesses estabelecimentos.
É importante ressaltar, nesse sentido, que, exatamente no dia 17 de março de 2020, o Conselho Nacional de Justiça editou a Recomendação nº 62, com o objetivo de instar os tribunais e magistrados à adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19) no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo.
A partir deste ato normativo, atualizado pela Recomendação nº 91 de 15 de março de 2021, o CNJ buscou adequar os contextos de privação de liberdade aos protocolos de identificação, notificação e tratamento da emergência de saúde pública, inclusive com a previsão de medidas de descontingenciamento da população prisional.
Importante ressaltar que ao ensejo da renovação da Recomendação original, houve menção expressa à priorização, com relação às atividades de monitoramento, dos estabelecimentos que estão objeto de tutelas de urgência proferidas pela Comissão IDH e pela Corte IDH.
Ao ensejo da preparação desta audiência pública, além do levantamento de dados junto ao Poder Público, este Conselho Nacional de Justiça, importante destacar, promoveu reuniões com os representantes dos beneficiários das quatro medidas provisórias, a fim de melhor diagnosticar os entraves afetos aos respectivos contextos de privação de liberdade.
Para as considerações sobre os principais desafios detectados e os compromissos que o CNJ passará a administrar, passo a palavra ao Juiz Luís Geraldo Lanfredi, Coordenador Institucional da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões da Corte IDH (UMF).
Muito obrigado”.
Assista à intervenção do Secretário Geral do CNJ na Audiência Pública conjunta de monitoramento das Medidas Provisórias adotadas em relação ao Brasil realizada no dia 2 de junho de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ LUÍS GERALDO LANFREDI – COORDENADOR INSTITUCIONAL DA UMF
“Honorável Juíza Presidente, Honoráveis Juízes, Demais presentes, A realidade dos estabelecimentos prisionais cotejados nesta reunião bem retrata a situação adversa de tantos outros espaços de privação de liberdade no Brasil.
Não por menos, em setembro de 2015, a Suprema Corte brasileira admitiu a caracterização de um “estado de coisas inconstitucional” a qualificar, negativamente, o sistema prisional brasileiro.
Desde essa ocasião, o Conselho Nacional de Justiça vem desempenhando o papel de articular, em parceria com outros atores, políticas públicas comprometidas com a neutralização de todas essas adversidades que representam impasses estruturais e descaso com a dignidade humana.
Especificamente, no final de 2018, a partir de recursos oriundos do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), o Conselho Nacional de Justiça colocou em ação o “Programa Justiça Presente”, iniciativa que conta com as parcerias do PNUD e do Ministério da Justiça e Segurança Pública, e se destina a restabelecer um funcionamento satisfatório e devolver sentido prático útil para o sistema prisional brasileiro.
Com o início da gestão do Ministro Luiz Fux, a política fortaleceu-se ainda mais, eis que foi ampliada e deu ensejo a um novo ciclo, renomeado como “Programa Fazendo Justiça”.
O “Programa Fazendo Justiça”, de modo geral, (a) fomenta a qualificação de etapas do ciclo penal e do ciclo socioeducativo, (b) promove o diálogo interinstitucional e articulações entre os diferentes níveis federativos e (c) contempla ações customizadas para cada unidade da federação, submetendo-as à prévia pactuação com os Estados e Tribunais locais.
Após reuniões e o contato direto com os beneficiários das medidas provisórias analisadas nesta audiência, o Conselho Nacional de Justiça reafirma seu compromisso com a integralidade das ações desenhadas para a implementação da política pública vigente, as quais se reputam coerentes com o diagnóstico e a solução dos problemas que ainda se fazem presentes em cada uma dessas
realidades.
Importante enfatizar, desde logo, que a implementação da política não pressupõe a exclusiva atuação do CNJ.
Antes, necessita do engajamento dos Estados (e suas respectivas Administrações Prisionais), dos Tribunais locais, dos municípios e da própria sociedade civil organizada.
Pois bem, diante dos quatro contextos prisionais analisados nesta audiência, detectamos quatro situações que se sobressaem e precisam ser equacionadas:
1. A dificuldade em se definir critérios e se chegar à capacidade-limite de cada estabelecimento prisional;
2. Entraves para a admissibilidade e a efetivação de medidas que permitam reduzir e manter equilibrada a equação: vagas disponíveis – vagas ocupadas, para cada unidade prisional;
3. O agravamento de problemas sanitários preexistentes (em razão da notória insalubridade desses ambientes e do acesso precário à saúde), decorrência das consequências que advêm da pandemia da COVID-19;
4. Enfrentamento da tortura e da violência intramuros mediante protocolos uniformes de ação.
Com relação ao primeiro aspecto, o CNJ já tem, pronta, proposta de Resolução (ainda pendente de apreciação e deliberação), para que as inspeções judiciais obrigatórias e mensais passem a certificar se as vagas anunciadas para cada estabelecimento estão de acordo com a Resolução 09/2011 do CNPCT (critério já indicado pela Corte IDH em suas últimas resoluções), o que permitirá aos
Órgãos de controle e à sociedade civil exigir providências efetivas quando ultrapassada a capacidade máxima indicada.
No que tange ao segundo problema [dificuldades em se descongestionar “a porta de saída” do sistema penal], a Corte determinou, nas Resoluções do Curado e do Plácido Sá Carvalho, o cômputo em dobro do prazo vivenciado em privação de liberdade em condições degradantes.
A experiência com o Plácido Sá Carvalho serve como um ótimo exemplo para a viabilização de uma iniciativa ainda mais ampla:
“a central de vagas”, ação específica do Programa Fazendo Justiça.
De fato, o cômputo em dobro é uma entre várias medidas compensatórias com aptidão para flexibilizar a porta de saída do sistema prisional.
Daí que o CNJ irá propor a institucionalização local de “centrais de vagas” como estratégia para a evitar ou mesmo minimizar as condições de superlotação das unidades prisionais, tendo por especial enfoque os estabelecimentos que estão sendo cotejados nesta data.
Com relação ao terceiro dilema, [respeito ao enfrentamento à pandemia e aos problemas sanitários nos estabelecimentos], apesar das providências sobre a COVID-19 adotadas, o acesso à saúde em ambiente prisional segue como grande desafio a ser equacionado.
É por essa razão que o CNJ irá recomendar aos grupos locais de monitoramento do sistema prisional (GMFs) o acompanhamento dos comitês gestores da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), para o fim de buscar o fortalecimento e o incremento das ações e o reforço das equipes de saúde dentro das unidades prisionais.
A propósito, a atuação para o fortalecimento da política nacional de acesso à saúde prisional (PNAISP) é uma outra ação específica do Programa Fazendo Justiça.
Finalmente, com à tortura e à violência intramuros, a pandemia trouxe a necessidade de distanciamento social.
E essa particularidade, por sua vez, tem dificultado as visitas e a participação social no acompanhamento da execução das penas, ao que se soma a dificuldade de acesso à informação de todas as ordens.
Como encaminhamentos, o Conselho Nacional de Justiça compromete-se com a elaboração de orientação técnica para viabilizar a retomada das visitas de inspeção de representantes dos peticionários, da Defensoria Pública, do Ministério Público e dos Conselhos de Direitos, em conformidade com protocolos de biossegurança que, de serem bem cumpridos, não podem impedir a realização das visitas no curso da pandemia.
Ademais, diante de relatos de tortura relacionados com a questão do uso de armamentos menos letais, o CNJ promoverá a tradução das “Regras de Havana” e difundirá capacitação específica sobre os parâmetros internacionais que regulamentam essa matéria.
Finalmente, com relação ao potencial cenário de subnotificação sobre a ocorrência de tortura intramuros, o Conselho Nacional de Justiça propõe-se a estruturar um fluxo para encaminhamento de denúncias de tortura e outras violações de direitos no sistema prisional.
Tudo isso, evidentemente, sem prejuízo da disponibilização de canal livre e desembaraçado para utilização pelos beneficiários das medidas provisórias, a fim de que intervenções urgentes sejam requeridas e demandas diretamente ao Conselho Nacional de Justiça, enquanto instância de acompanhamento e de defesa da eficácia das decisões da Corte IDH.
Em breve síntese, é o que nos propomos.
Seguimos à disposição para outros esclarecimentos”.
Assista à intervenção do Juiz Coordenador da UMF/CNJ na Audiência Pública conjunta de monitoramento das Medidas Provisórias adotadas em relação ao Brasil realizada no dia 2 de junho de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ VALTER SHUENQUENER DE ARAÚJO – SECRETÁRIO-GERAL DO CNJ
Nossos cumprimentos aos Juízes, Juízas e ao Senhor Secretário Geral da Corte Interamericana de Direitos Humanos, bem como aos representantes do Estado Brasileiro, às vítimas, familiares e aos demais participantes desta reunião.
Primeiramente, compartilho com todos as saudações do Ministro Luiz Fux, Presidente do STF e do CNJ, agradecendo-lhes, uma vez mais, pela distinção do convite para estar presente nesta audiência e colaborar com o adequado encaminhamento das medidas de reparação e eventuais pendências existentes com relação às sentenças que advêm do Caso Gomes Lund e do Caso Herzog no
que diz respeito ao âmbito do Poder Judiciário.
Nesta oportunidade, é de suma importância delimitar as atribuições constitucionais do Conselho Nacional de Justiça, a fim de melhor aclarar as possibilidades da atuação do Órgão, no que concerne ao cumprimento das medidas de reparação ordenadas pela Corte IDH e que são objeto da presente audiência.
O Conselho Nacional de Justiça é um Órgão que integra a estrutura do Poder Judiciário brasileiro e tem como missão promover o desenvolvimento do sistema judiciário nacional em benefício da sociedade. O CNJ não pretende, por estar além de suas atribuições, assumir, em nome do Brasil, obrigações no plano internacional e nem mesmo fazer análise de mérito sobre decisões judiciais brasileiras ou sobre as obrigações assumidas pelo Estado brasileiro na referida esfera. Em suas atribuições, o CNJ dissemina políticas judiciárias e realiza o controle da atuação administrativa e financeira dos diferentes Tribunais do país
Neste escopo, o CNJ detém o poder de expedir atos regulamentares para disciplinar condutas e impor padrões de comportamento funcional aos membros do Judiciário nacional.
Conforme decidido na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.367, de 2006, o alcance das atribuições constitucionais do CNJ restringe-se, contudo, aos Órgãos e juízes situados hierarquicamente abaixo do Supremo Tribunal Federal, sendo este Órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro.
Desta forma, o CNJ não tem atribuições sobre o STF ou sobre as condutas de seus ministros, estando, ao contrário, igualmente sujeito ao controle jurisdicional da Corte Suprema do país.
É importante repisar essa particularidade, notadamente em consideração a aspectos que delineiam o contexto fático do Casos Gomes Lund e Herzog, já que cabe, exclusivamente, ao Supremo Tribunal Federal a análise jurisdicional alusiva à aplicação da Lei n. 6.683/79 (Lei de Anistia), controvérsia essa enfrentada, nomeadamente, nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 153 e ADPF 320, ainda em tramitação naquela Máxima Corte.
Partindo desta premissa, o Conselho Nacional de Justiça, por intermédio da atuação da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões da Corte Interamericana (UMF), pretende apenas atuar nesses casos hoje debatidos, colocando em ação sua capacidade de interlocução institucional, a fim de buscar, junto ao Poder Judiciário, encaminhamentos adequados, nos limites de
suas atribuições constitucionais, para o cumprimento dos pontos resolutivos pendentes de ambas as sentenças da Corte IDH.
Ao ensejo da preparação para esta audiência pública, a UMF/CNJ promoveu reuniões com as vítimas, familiares e seus respectivos representantes, a fim de melhor identificar abordagens possíveis de serem adotadas pelo Conselho Nacional de Justiça, visando à concretização da decisão da Corte Interamericana no que diz respeito a medidas que podem ser adotadas no âmbito do Poder Judiciário brasileiro. Para as considerações sobre os principais desafios detectados e sobre as possibilidades de atuação do CNJ, passo a palavra ao Juiz
Luís Geraldo Lanfredi, Coordenador Institucional da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões da Corte IDH (UMF).
Muito obrigado
Assista à intervenção do Secretário Geral do CNJ na Audiência Pública conjunta, realizada no dia 24 de junho de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ LUÍS GERALDO LANFREDI – COORDENADOR INSTITUCIONAL DA UMF
Honorável Juíza Presidente, da Corte Interamericana, Honoráveis Juízes Interamericanos, Srs e Sras Peticionários e Representantes da Delegação do Estado Brasileiro,Demais presentes, Bom dia!
Passo a tratar das medidas de reparação pendentes e para as quais o CNJ pode se engajar, nos limites de seu mandato, de modo a fomentar o cumprimento das sentenças, em conjunto com os demais atores.
Em relação ao Caso Gomes Lund, um dos pontos pendentes de cumprimento se refere à tipificação das desaparições forçadas.
Conforme destacado pelas partes, em maio de 2016, o Estado Brasileiro internalizou a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas. Esse importante tratado internacional de direitos humanos, relativo à proteção contra o desaparecimento forçado ou involuntário de pessoas, passou a integrar o ordenamento jurídico brasileiro com hierarquia de norma supralegal, de acordo com o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal.
Ao adotar referida Convenção, o Estado brasileiro se soma à preocupação mundial expressa pelas Nações Unidas na Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados, votada por sua Assembleia Geral, em 18 de dezembro de 1992, por meio da Resolução n. 47/133.
Para o fim de tipificar o crime de desaparecimento forçado, está tramitando o projeto de lei 6.240/2013 no Congresso Nacional.
Um outro projeto de lei, o 5.215/2020, dispõe sobre prevenção e repressão ao desaparecimento forçado de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas.
Ambos aguardam apreciação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara de Deputados.
Pois bem, o CNJ irá fomentar a mobilização de parlamentares, a partir da construção de nota técnica que nos permita avançar na construção do melhor desenho normativo, de modo a contribuir com as regras do processo legislativo brasileiro.
Também vamos nos colocar à disposição do Poder Executivo, do Poder Legislativo e dos Peticionários, para organizar ou participar de eventos que pautem o tema, tendo em vista que o Poder Judiciário tem sido chamado a intervir e a se manifestar sobre o mesmo tema.
Em relação às ações sobre buscas e identificação dos restos mortais das vítimas, conforme já noticiado nos autos, essa questão foi objeto de ação que tramitou na 1ª Vara Federal do Distrito Federal . Em análise ao andamento processual, há sentença definitiva transitada em julgado, de modo que o processo se encontra em fase de cumprimento de sentença. Vamos assumir o monitoramento da execução desta ação, propondo a criação de uma mesa dialógica, para estabelecer um plano de trabalho que contemple a composição de equipes, a previsão orçamentária e metas a serem cumpridas, seguindo as manifestações do Ministério Público e dos demais atores envolvidos, nos moldes como têm ocorrido com os processos estruturais.
Além desses encaminhamentos, o CNJ, considerando reuniões com os peticionários do Caso Herzog e também do caso Gomes Lund, colheu demandas de encaminhamentos complementares, no sentido de estimular a construção de parâmetros interpretativos que possam sensibilizar o sistema de Justiça como um todo.
Entre as sugestões colhidas, pretendemos organizar um painel no sítio eletrônico do CNJ, com o fim de conferir visibilidade mais ágil e direta de juízes e juízas com a produção jurisprudencial do tribunal interamericano. Esse encaminhamento é uma das ações já contempladas no plano de ação desta Unidade de Monitoramento, e já se encontra em fase de implantação.
Agradeço a atenção de todos e colocamo-nos à disposição para esclarecimentos.
Assista à intervenção do Juiz Coordenador da UMF/CNJ na Audiência Pública conjunta, realizada no dia 24 de junho de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ VALTER SHUENQUENER DE ARAÚJO – SECRETÁRIO-GERAL DO CNJ
Nossos cumprimentos aos Juízes, Juízas e ao Senhor Secretário Geral da Corte Interamericana de Direitos Humanos, bem como aos representantes do Estado Brasileiro e faço uma saudação especial ao Embaixador do Brasil na Costa Rica Embaixador Antonio Francisco da costa e Silva Neto, cumprimentando, também, o representante do CNMP Conselheiro Marcelo Weitzel, as vítimas, familiares e os demais participantes desta reunião.
Primeiramente, compartilho com todos as saudações do Ministro Luiz Fux, Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, agradecendo-lhes, uma vez mais, pela distinção do convite para estar presente nesta audiência e colaborar, no que diz respeito ao âmbito do Poder Judiciário, com o adequado encaminhamento das medidas de reparação relacionadas ao Caso Favela Nova Brasília.
Nesta oportunidade, reiteramos que a recorrência de eventos análogos àqueles ocorridos no contexto fático do Caso Favela Nova Brasília, a exemplo da (já citada) operação policial realizada em maio na Favela do Jacarezinho, impõe ao Judiciário Brasileiro o dever de delinear políticas judiciárias que coíbam a prática de atos arbitrários por parte dos agentes da força de segurança pública e que contemplem medidas de combate ao racismo estrutural.
Na sua missão de promover o desenvolvimento do sistema judiciário nacional, o Conselho Nacional de Justiça já buscou enfrentar esse duplo desafio quando regulamentou, por exemplo, as Audiências de Custódia como mecanismo para controle judicial de prisões e de eventual violência na abordagem policial, bem como quando instituiu, em 2020, o Grupo de Trabalho de Políticas Judiciárias sobre a Igualdade Racial, a fim de institucionalizar a discussão sobre o racismo no Poder Judiciário brasileiro e de propor ações concretas a serem desenvolvidas em todos os segmentos da Justiça.
Nesse sentido, a atuação do CNJ nos seus 16 anos de existência vem, cada vez mais, se aproximando de um aperfeiçoamento do Poder Judiciário nacional pautado na defesa dos direitos humanos, na participação da sociedade civil e nos valores de justiça e paz social.
Não se descuida, contudo, que as temáticas de violência policial em desfavor de vítimas negras ou de parâmetros para investigações na hipótese de supostas mortes, tortura ou violência sexual decorrentes de intervenção policial excedem as atribuições constitucionais do CNJ e constituem temas de alta complexidade, os quais exigem a cooperação indissociável entre as instâncias do Poder Público e a sociedade civil.
Nessa perspectiva, os aspectos atinentes à atuação dos agentes de segurança pública no Rio de Janeiro são objeto da (também já citada) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, em trâmite no Supremo Tribunal Federal.
Nesse processo estruturante, o STF tem promovido a implementação progressiva das complexas garantias de não repetição ditadas pela Corte IDH, garantindo igualmente a participação de representantes da sociedade civil.
Nesse sentido, no âmbito da ADPF 635, promoveu-se audiência pública com ampla participação social, em 16 e 19 de maio de 2021, para discussão dos parâmetros que devem nortear metas e políticas públicas voltadas à redução da letalidade e da violência policial.
O Conselho Nacional de Justiça, por intermédio da atuação da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões da Corte Interamericana (UMF), apresentará abordagens adicionais passíveis de implementação no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, visando à efetivação dos pontos resolutivos determinados pela Corte IDH na Sentença do Caso Favela Nova Brasília.
Para as considerações sobre as possibilidades de atuação do CNJ, passo a palavra ao Juiz Luís Geraldo Lanfredi, Coordenador Institucional da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões da Corte IDH (UMF).
Muito obrigado.
Assista à intervenção do Secretário Geral do CNJ na Audiência Pública de supervisão do Caso Favela Nova Brasília, realizada no dia 20 de agosto de 2021.
MANIFESTAÇÃO DO JUIZ LUÍS GERALDO LANFREDI – COORDENADOR INSTITUCIONAL DA UMF
Honorável Juíza Presidente da Corte Interamericana,
Honoráveis Juízes Interamericanos,
Sras e Srs Peticionários e Representantes da Delegação do Estado Brasileiro,
Demais presentes,
Bom dia!
Passo a tratar das medidas de reparação pendentes e para as quais o Conselho Nacional de Justiça cuidará, nos limites de seu mandato, de modo a fomentar o cumprimento dos pontos resolutivos da sentença, em conjunto com os demais atores que participam desta reunião.
O caso Cosme Genoveva e outros (conhecido como “Favela Nova Brasília”) versa sobre a responsabilidade internacional do Estado brasileiro pela violação ao direito à vida e à integridade pessoal das vítimas – 26 homens vítimas de homicídio e 3 mulheres vítimas de violência sexual – durante operações policiais realizadas na Favela Nova Brasília, Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, em 2 incursões ocorridas nos dias 18 de outubro de 1994 e em 8 de maio de 1995.
Trata, também, da responsabilidade do Estado pelo respeito aos direitos dos familiares e das vítimas, relacionados com a proteção das garantias judiciais.
O presente caso remete a parâmetros sobre o dever de investigar com a devida diligência, bem como impõe a obediência aos estândares de imparcialidade, independência, respeito e duração em prazo razoável do processo.
Considerando o contexto subjacente, e para contribuir para a transformação da realidade das violações de direitos humanos expostas no âmbito deste caso, o CNJ assumirá os seguintes encaminhamentos:
(1) Como já se tem feito com relação à participação nas audiências de supervisão anteriores, o CNJ irá publicar o Sumário Executivo sobre o Caso Favela Nova Brasília em seu sítio na internet, em formato que possa contribuir para a difusão do conhecimento deste caso e dos parâmetros e reparações fixadas por essa honorável Corte Interamericana.
(2) Com relação ao ponto resolutivo n. 15, o CNJ irá propor (como sugestão) ao Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro, em diálogo com o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, a produção de relatório anual estatístico sobre as investigações realizadas em incidentes relacionados à intervenção policial com resultado morte. Ademais, o CNJ recomendará ao Poder Executivo Federal que os dados coletados junto aos Estados Federados a respeito dos índices de letalidade policial sejam expostos de forma detalhada no painel do SINESP – Sistema de Informações Nacional de Segurança Pública, de forma a se garantir transparência e a indução de desenho e avaliação de políticas públicas nacionais e locais, importantes para superar o ciclo de violações reportado neste processo. Em conformidade com as informações obtidas a partir de reuniões prévias a esta audiência com a sociedade civil, para que os dados sejam aptos a refletir a realidade vivida, o CNJ zelará para que os indicadores de performance judicial levem em conta não apenas o número de inquéritos relatados pelas polícias judiciárias e as denúncias oferecidas pelo ministério público, como também apontem o número de inquéritos arquivados (pois esse indicador se conecta com a superação da cultura dos “autos de resistência”).
(3) Em atenção ao ponto resolutivo 18, o CNJ promoverá sugestão dirigida às Academias de Polícia Civil, Militar e Federal, assim como para o Conselho Nacional de Saúde, a fim de que promovam a incorporação dos parâmetros internacionais e interamericanos de atendimento a vítimas de violência sexual e de investigação do crime, na programação de cursos de formação sob suas responsabilidades.
(4) Para a construção de propostas que conduzam às reformas estruturais entretidas com a produção de laudos produzidos de forma independente, o CNJ realizará mapeamento nacional sobre a existência de corpos periciais independentes da polícia civil, como forma de compreender em que medida os Estados estão enfrentando essa questão, o que resultará em estudo sobre eventuais experiências exitosas e novos modelos que possam replicados na Federação brasileira.
(5) Em relação ao ponto resolutivo 19, o CNJ compromete-se com a realização de estudo (via orientação técnica), para ser encaminhado ao Poder Legislativo, defendendo a adequação do art. 11 do Projeto de Lei 8.045/2010 aos parâmetros interamericanos, uma vez que a redação desse dispositivo está conforme e se mostra idôneo para aclarar os direitos constitucionais e convencionais das vítimas, reforçando os parâmetros interamericanos contidos no presente ponto resolutivo e no parágrafo 329 da sentença do Caso Favela Nova Brasília (acesso aos autos do inquérito);
(6) Ainda sobre o mesmo ponto resolutivo, o CNJ intensificará esforços para a aplicabilidade das suas Resoluções 253/2018 e 386/2021, adotando “orientação técnica” que explicite os direitos da vítima em participar de todas as etapas da apuração da responsabilidade de autores de crimes que repercutam violações a direitos humanos, incluídas aqui a etapa investigatória e a fase de conhecimento.
(7) O CNJ também promoverá publicação que busque resgatar as experiências de vítimas habilitadas como assistentes de acusação, em casos de graves violações a direitos humanos que tramitaram perante o sistema interamericano. A documentação e registro das experiências vividas pode ser útil para conferir visibilidade ao tema da participação da vítima no processo.
(8) Finalmente, com relação ao ponto resolutivo n. 20, o CNJ incidirá para a inclusão, junto a editais de concursos públicos para o ingresso na magistratura, de conteúdos atinentes ao estudo das violências, da violência institucional e da violência policial, assim como dos parâmetros internacionais relativos ao uso excessivo da força. Fomentará, inclusive, a disseminação de cursos de formação e de atualização, destinados a membros e servidores do Poder Judiciário, com esses mesmos conteúdos, a fim de que magistrados e magistradas do Poder Judiciário e seus servidores tenham conhecimento mais profundo e estruturado sobre contextos assemelhados a casos como o subjacente, que eventualmente estejam sob sua responsabilidade, em todos os âmbitos de atuação, desde a audiência de custódia, passando pelo controle judicial do arquivamento do inquérito, como também em casos que demandam responsabilidade da Fazenda Pública, em que se discute a indenização por responsabilidade estatal por conta da violência policial.
Todas essas medidas serão objeto de debate com os/as representantes das organizações peticionárias deste caso, a fim de que a construção coletiva de soluções nos leve a resultados eficazes e efetivos, autorizando intervenções imediatas pelo Conselho Nacional de Justiça, enquanto instância de acompanhamento e de defesa da eficácia das decisões da Corte IDH.
Em breve síntese, é o que nos propomos.
Seguimos à disposição para outros esclarecimentos.
Assista à intervenção do Juiz Coordenador da UMF/CNJ na Audiência Pública de supervisão do Caso Favela Nova Brasília, realizada no dia 20 de agosto de 2021.