A igualdade e o combate à discriminação racial se tornaram casos de monitoramento pelo Observatório Nacional sobre Questões Ambientais, Econômicas e Sociais de Alta Complexidade e Grande Impacto e Repercussão. A decisão faz parte da Portaria Conjunta nº 7/2020, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
O tema foi apresentado na reunião mensal do colegiado realizada na última terça-feira (1/9), com as presenças do presidente do CNJ, ministro Dias Toffoli, do sub-procurador geral da República, Alcides Martins, e das conselheiras do CNJ Maria Tereza Uille Gomes e Flávia Pessoa, além de representantes do meio jurídico e do Poder Executivo, como o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque; o reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, José Vicente; o advogado-geral da União, José Levi; e o defensor público da União, Gabriel Oliveira.
O monitoramento dos casos de discriminação racial foi proposto pelo reitor da Universidade Zumbi dos Palmares e integrante do Conselho Consultivo do Departamento de Pesquisa Judiciária (DPJ) do CNJ, José Vicente. “É sabido que o racismo estrutural e a discriminação no nosso país têm produzido danos e malefícios extraordinários e coloca em cheque o sentido de república, de democracia e do próprio sentido do nosso estado democrático de direito.”
Para ele, a solução passa por uma ação dirigida, com a formulação de políticas públicas e o monitoramento para compreender de que maneira o racismo apresenta suas manifestações nos mais diversos espaços públicos e privados. “[A inclusão do tema] vai servir de farol, um parâmetro, mas também de um local qualificado a partir do qual poderá se disponibilizar informações, dados, conteúdos significativos para contribuir na inauguração de uma construção e implementação no Sistema de Justiça que contemple essa dimensão.”
O ministro Dias Toffoli pontuou a importância do acompanhamento das questões relacionadas à igualdade racial pelo Observatório. “Em 13 anos de existência do CNJ, nenhuma pesquisa sobre a temática de ações relativas à questão racial havia sido feita, mas, há dois anos, ele foi incluído no DPJ e, agora, no Observatório Nacional”, disse. “Não dá para registrar que seja com satisfação, porque a satisfação nós teríamos e teremos quando nós vivermos em uma sociedade que materialmente cumpra os mandamentos da Constituição de igualdade em todos os seus termos e uma sociedade que não tenha discriminação de raça.”
A portaria que trata da inclusão sobre igualdade racial também prevê que o Observatório monitore a extração de potássio no município de Autazes (AM), por meio de realização de estudos estatísticos e indicadores para avaliar o impacto social, econômico e ambiental na região.
Dados Abertos
Durante a reunião, também foi assinado o Termo de Cooperação Técnica nº 26/2020, com o objetivo de padronizar, reunir e facilitar o acesso aos dados estatísticos, relatórios e painéis de Business Intelligence do CNJ, CNMP, AGU, CPU, CFOAB, Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais (Condege) e Conselho Nacional dos Direitos Humanos por meio do campo “Estatística”, a ser disponibilizado na página inicial dos respectivos sites oficiais. A iniciativa partiu da conselheira do CNJ Maria Tereza Uille, que também coordena o Comitê de Crise instituído pela Portaria nº 57/2020, que monitora os impactos da Covid-19 no sistema de Justiça.
Junto ao grupo composto por servidores do Poder Judiciário e Executivo, foi desenvolvido o primeiro Painel Nacional Interinstitucional de Dados Abertos. Uille, com informações de quase 100 mil processos referentes à Covid — compartilhados semanalmente entre AGU, DPU, MPF e CNJ. “Nós conseguimos cruzar os dados e em 31 de agosto foi objeto de assinatura de um Termo de Cooperação com o Ministério da Cidadania e Dataprev. É a primeira vez que, estrategicamente, estamos cuidando desses temas e tentando olhar com muito carinho para as pessoas de maior vulnerabilidade”, afirma Uille, em menção a parceria entre as instituições para monitoramento e verificação de dados sobre os indeferimentos do auxílio emergencial e a judicialização do tema.
Resultados
Ainda foi apresentado o relatório de atividades do Observatório Nacional, em um ano e oito meses de existência, com o monitoramento de 14 casos. Os resultados do Caso de Mariana e do Caso Pinheiro foram destaques na reunião.
O Caso Pinheiro começou a ser acompanhado em março de 2018, depois que moradores dos bairros Pinheiro, Bebedouro, Mutange e Bom Parto, em Maceió (AL), identificaram rachaduras em suas casas após um tremor de terra, durante a temporada de chuvas, alarmando a comunidade sobre o risco de afundamento. A área fica próxima de minas de extração de sal da Braskem, que acompanhou o caso junto a organismos do sistema de Justiça, em consequência da desocupação preventiva da população anunciada pela Defesa Civil.
Em janeiro de 2020, órgãos de promotoria e defesa públicas e a Braskem assinaram o maior acordo preventivo da história do Brasil. “Este foi um grande caso de prevenção de litígios que coloca a vida das pessoas a salvo de uma tragédia, que era praticamente uma tragédia anunciada”, segundo a conselheira Maria Tereza Uille, coordenadora do Observatório. Mais de sete mil imóveis foram desocupados, cinco mil famílias foram realocadas e mais de mil acordos de indenização já foram feitos com proprietários e inquilinos. Além disso, mais de 20 mil pessoas já estão morando fora das áreas de risco.
Sobre o caso de Mariana, foram destacadas decisões recentes da Justiça Federal em Minas Gerais, especialmente quanto aos auxílios financeiros aplicados durante a pandemia na região afetada. “Conseguiram viabilizar um total de R$ 1 bilhão em investimento em infraestrutura, construção de distrito industrial, saúde e fortalecimento da educação pública”, afirmou Uille. No Espírito Santo, foram R$ 80 milhões para a construção de equipamentos no Hospital Regional de Valadares, mais de 250 leitos para o SUS, R$ 60 milhões para reformas de creches para escolas do ensino fundamental, R$ 12 milhões para a construção de um distrito industrial em Rio Doce, com geração de emprego e renda.
Reconhecimento
Após a prestação de contas, os participantes da reunião reconheceram os resultados do Observatório Nacional enquanto fórum engajado com problemas brasileiros complexos, de alto impacto e repercussão social, econômica e ambiental. Uma placa de homenagem foi entregue em nome dos integrantes do Observatório ao ministro Dias Toffoli, “pela condução geradora de importante diálogo, interinstitucional em torno dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, Agenda 2030”. Toffoli agradeceu e afirmou que os resultados do Observatório Nacional são capazes de ilustrar “o poder mobilizador e transformador do diálogo e na integração entre os órgãos do sistema de justiça”.
Alcides Martins, em representação ao presidente do CNMP, Augusto Aras, destacou a sensibilidade de Toffoli em trazer temas para o Observatório, como a migração na fronteira do Brasil com a Venezuela e os casos da Boate Kiss (RS) e a Chacina de Unaí (MG). “Quanto à ação coordenada entre CNJ e CNMP, buscou sempre garantir a aplicação da lei e a proteção do direito das pessoas afetadas, com o contínuo aprimoramento da eficiência, transparência e responsabilidade do Poder Judiciário”, relatou Martins. Para ele, o Observatório Nacional tem prezado pela segurança jurídica e a paz social com o devido diálogo com os demais poderes da República, com as instituições essenciais, a Justiça e com toda a sociedade.
Clara Wardi
Agência CNJ de Notícias
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