Dez custodiados do Centro Regional de Recuperação de Itaituba (CRRI) participaram entre os dias 20 e 23 de julho do projeto Respirando Liberdade, iniciativa da Vara Criminal da Comarca do sudoeste paraense. Com participação voluntária, o projeto levou conhecimentos de técnicas de respiração, meditação e yoga aos internos por meio de curso.
O juiz titular Agenor de Andrade explica que o objetivo é oportunizar ao custodiado a participação em um programa denominado Prison, o qual consiste em cursos on-line ou, quando possível em função da pandemia, presenciais, sobre técnicas de respiração, meditação e yoga. A ideia é possibilitar o autoconhecimento e o equilíbrio para superação dos traumas e conflitos a fim de uma cultura de paz e sem violência.
O programa Prison integra uma ação global creditada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e é reconhecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Os primeiros cursos realizados no Brasil se iniciaram em 2002 nas cidades de Salvador (Presídio Advogado Ariston Cardoso), São Paulo (Penitenciária Feminina de Sant’Ana), Rio de Janeiro (Penitenciária Talavera Bruce e DEGASE) e Recife (FUNASE/PE). O programa já se expandiu para outras unidades do Rio de Janeiro e recentemente foi implementado no Complexo Penitenciário Público-Privado (CPPP) de Ribeirão das Neves, região Metropolitana de Belo Horizonte. Desde a sua criação, em 1992, mais de 800 mil presidiários e agentes prisionais, em cerca de 30 países, já experimentaram os benefícios das práticas ensinadas.
O projeto Respirando Liberdade, realizado em parceria CRRI, tem o apoio da fundação internacional Arte de Viver, organização humanitária e educacional, sem fins lucrativos, engajada em iniciativas de controle do estresse e ações sociais, operando em mais de 160 países.
De acordo com o magistrado, a adesão ao Respirando Liberdade ocorreu em junho 2019, quando as atribuições de cada órgão foram definidas, mediante videoconferência, com o propósito de garantir a logística com material e equipamentos necessários para a realização dos cursos na modalidade online junto aos custodiados.
Andrade contou que o primeiro curso foi realizado entre 6 e 9 de julho, com duração de 3 horas diárias, totalmente on-line, com participação dos diretores, da equipe técnica e agentes penitenciários do CRRI e da equipe técnica da Vara Criminal e do Setor Psicossocial da Comarca de Itaituba. Em seguida, entre 20 a 23 de julho, dez custodiados participaram de forma voluntária.
Metodologia
Durante os dias de curso, foram compartilhadas técnicas avançadas de respiração que removem o estresse acumulado no organismo e promovem um poderoso efeito de limpeza no corpo e na mente. A principal ferramenta do programa é uma técnica chamada Sudarshan Kriya (ação purificadora). Ela é uma ferramenta autocapacitadora, que transforma as emoções intensas e restaura a calma e a capacidade de concentração.
Em seu conjunto, essas técnicas podem auxiliar, segundo o juiz, os presos a lidar de forma mais construtiva com os sentimentos – muitas vezes profundamente enraizados – de medo, culpa, desespero, depressão e vingança. Sentimentos como agressividade, raiva e frustração passam a ceder espaço para o entusiasmo e um estado mental mais positivo. Dessa maneira, o Prison Program fornece uma base para o autogerenciamento, aumento da autoconfiança, fortalece os valores humanos e reduz a dependência de substâncias químicas viciantes.
“Os internos que passam pelos cursos têm a oportunidade de perceber com maior clareza a prisão como um espaço para auto reflexão, bem como são habilitados a lidar de forma mais positiva com futuras situações de conflito e estresse, tornando-se aptos a fazer uso dos conhecimentos e do conjunto de técnicas aprendidos para o resto de suas vidas”, avaliou o magistrado Agenor de Andrade.
Para o juiz, o projeto visa o resgate dos valores humanos no CRRI, contribuindo para a redução da violência dentro e fora do estabelecimento penal, o que traz impactos positivos na sociedade como um todo. “O programa Prison é composto por cursos ministrados nas próprias unidades prisionais, sendo o trabalho realizado de forma voluntária, por instrutores devidamente habilitados pela Arte de Viver”, explicou. O objetivo do programa é o gerenciamento prático e eficaz do estresse e das manifestações de violência, tendo por base principal o ensino de técnicas de respiração e de conhecimentos práticos sobre como lidar com as emoções.
Andrade explica que, para que se torne prática diária dos custodiados, após o curso haverá acompanhamento dos custodiados pelos voluntários por 40 dias consecutivos, no qual continuarão com as práticas de yoga, meditação e do Sudarshan Kriya, além de fazerem reflexões por meio de conhecimentos milenares de valores humanos universais. “Ressalte-se que o interno que participar das atividades poderá ganhar remição da sua pena pela prática diária do yoga e da meditação, conforme portaria da Vara de Execução Penal de Itaituba”, ponderou.
Experiência
O projeto Respirando Liberdade, segundo o magistrado, tem como missão a realização de novos cursos com novos grupos de custodiados, com número igual ou superior a dez por curso, até atingir 100% dos custodiados que aceitarem aderir ao projeto, sem prejuízo das demais ações e serviços que são desenvolvidos no CRRI.
“A experiência do projeto Respirando Liberdade poderá ser replicada em unidades prisionais de outros municípios. Os custodiados e servidores em seus depoimentos tem sido enfáticos quanto à importância para diminuição do estresse, para o equilíbrio pessoal e autoconhecimento, havendo ainda durante o curso a melhora na interação entre custodiados, destes para com os servidores e dos servidores entre eles e para com os custodiados”, afirma.
De acordo com o juiz Agenor de Andrade, os custodiados agradeceram a oportunidade de serem vistos como seres humanos, com direitos, com necessidades, valorizando-os, que apesar de ainda terem poucos dias de práticas nestas atividades, esta prática já está contribuindo para ressignificar seus pensamentos, visões de realidade e da vida dentro do presídio, na família e na sociedade.
“Em suas falas, os custodiados trazem a reflexão sobre o olhar e concepção negativa que a sociedade tem para com os presidiários, que apesar de ter cometido crimes, têm suas histórias de vida, que na maioria são oriundos de classes sociais baixas, historicamente excluídos, sem acesso às políticas públicas e, muitas vezes, cresceram em ambiente familiar e comunitário de violência”, diz o magistrado.
Fonte: TJPA