Processos de adoção são mais lentos no Centro-Oeste e Sul

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A burocracia ainda é o principal entrave ao processo de adoção no Brasil, cuja demora muitas vezes resulta nos chamados “filhos de abrigo”, ou seja, crianças que acabam passando sua infância inteira em unidades de acolhimento até atingir a maioridade. As regiões Nordeste e Sudeste apresentam processos de habilitação à adoção com menor tempo, enquanto no Centro-Oeste e Sul os processos de habilitação são mais demorados, atingindo tempos médios maiores do que dois anos.

Esse é um dos principais resultados obtidos na pesquisa “Tempo dos processos relacionados à adoção no Brasil – uma análise sobre os impactos da atuação do Poder Judiciário”, encomendada pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) à Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ).

A pesquisa analisou os entraves do processo de adoção em oito comarcas de diferentes regiões do país, escolhidas por apresentarem o maior número de processos relacionados à adoção. A pesquisa foi apresentada no início deste ano ao CNJ e tem por base dados de 2013 do Cadastro Nacional da Adoção (CNA) do CNJ – antes, portanto, de sua reformulação, que o tornou mais célere e abrangente.

O principal objetivo da pesquisa foi identificar o tempo médio total e por fases dos processos de guarda, desconstituição do poder familiar, medidas protetivas de acolhimento e adoção. Os resultados levam em conta a peculiaridade de cada estado. Em Brasília, por exemplo, o tempo médio de destituição familiar é de quase quatro anos. De acordo com os pesquisadores, um motivo que explicaria a demora seria o envio frequente de cartas precatórias aos municípios satélites de Brasília, que demoravam muito para retornar.

No estado de São Paulo, os processos de adoção e perda de poder familiar são mais céleres na capital e nas cidades de São José dos Campos e Campinas, e mais demorados em Bauru, Guarulhos, Sorocaba e Osasco. Em relação aos processos de medidas protetivas, foram observados cenários bem diferentes nas comarcas. Em Osasco, a pesquisa notou que os processos são praticamente intermináveis.

Na região Sul e em Belém (PA), de acordo com a pesquisa, os tempos medianos são superiores a três anos, enquanto no Nordeste pelo menos 90% dos processos observados apresentaram tempo inferior a 400 dias. A vara de Recife foi a que apresentou menor tempo mediano do processo.

Os pesquisadores sugerem uma série de medidas para melhorar o sistema de adoção como, por exemplo, agilizar a guarda da criança e cumprir prazos; evoluir o diálogo entre juízes, setor técnico e promotoria; aprimorar os cursos com adotantes; reduzir a insistência em manter as famílias biológicas, permitindo assim a destituição para que se possa fazer a adoção e criação de uma vara especializada somente em adoção e destituição.

Filhos de abrigo

Atualmente, há 33.474 pretendentes a adoção no Cadastro Nacional, sendo que, destes, apenas 21% aceitam adotar irmãos e apenas 308 aceitam adotar crianças com 10 anos de idade. A exigência de pouca idade ou de recém-nascidos faz com que o CNA possua elevada quantidade de crianças acima de dez anos – 4.322 das atuais 5.530 cadastradas. Essas crianças são vulgarmente chamadas de “filhos de abrigo”, pois acabam passando toda a infância nas unidades de acolhimento.

Levando em consideração essa realidade, a pesquisa apresenta diversas sugestões para o aprimoramento dos abrigos, como investimento na formação do adolescente, maior ocupação e atividades dos abrigados fora do turno escolar, separação das crianças por idade, preparo psicológico de adolescentes próximos dos 18 anos e investimento para que as equipes dos abrigos sejam mais fixas, porque a alta rotatividade causa prejuízo para as crianças e adolescentes que acabam não criando vínculos duradouros.

Processo de adoção em outros países

A pesquisa relata um pouco do processo de adoção internacional em outros países, como nos Estados Unidos, Canadá, Holanda, Argentina e Reino Unido. Nos Estados Unidos, por exemplo, a adoção pode se dar por meio de agências oficiais de adoção ou de forma independente, acordado entre os pretendentes e aos pais que desejam dar o filho à adoção. Quase metade das adoções (41%) ocorre perante aos serviços sociais públicos e lares provisórios (foster cares), tendo em vista que a guarda das crianças para adoção é entregue a famílias que são remuneradas para tanto.

Os EUA adotaram em 2011 cerca de 2.600 crianças vindas da China, já que, devido à proibição de uma família apresentar mais de dois filhos (ficando sujeitos a elevadas taxas em razão do segundo parto), os chineses mais carentes abandonam os segundos filhos e até o primeiro, se for uma menina.

No Canadá, as crianças mais velhas e adolescentes são encaminhadas pelo Estado a lares provisórios (foster cares), enquanto os bebês recém-nascidos, normalmente, são colocados para adoção por agências privadas; em média, é preciso esperar oito anos por um recém-nascido saudável por meio dos sistemas governamentais, o que explica a opção pela adoção privada, que apresenta um custo elevado.

Já na Holanda, de 1955 até a atualidade, dois terços das crianças adotadas vieram de outros países. O desestímulo à adoção doméstica é explicado pela possibilidade legal de os verdadeiros pais reclamarem a guarda durante o primeiro ano e o tempo médio de duração do processo, de quatro anos a partir da primeira solicitação. Os candidatos com 41 anos podem adotar apenas crianças acima de 1 ano. De 42 a 45, somente crianças acima de 2 anos. Se o candidato completar 46 anos sem concluir o processo é impedido de adotar.

Perfil das crianças que vão para adoção

A pesquisa revela, embora sem entrar com profundidade no assunto, que as crianças que participam de processos de afastamento e destituição do poder familiar compartilham três principais características: muitos irmãos, famílias desestruturadas e pais dependentes químicos (especialmente de crack). Muitos deles vêm de família de origem pobre e suas idades são das mais diversas, a maioria na faixa de 0 a 6 anos.

Atualmente, o Cadastro Nacional de Adoção contabiliza em seus registros 33,5 mil pretendentes e cerca de 5,7 mil crianças em busca de uma nova família. A nova versão do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), elaborado pela Corregedoria Nacional de Justiça, foi apresentada em maio e já está em funcionamento. As mudanças tornaram o cadastro mais moderno, simplificado e proativo, facilitando-se o preenchimento pelo juiz e o cruzamento de dados entre os pretendentes e as crianças de todo o Brasil.

A nova tecnologia permitirá que o juiz seja informado, assim que preencher o cadastro de uma criança, sobre a existência de pretendentes na fila de adoção em busca daquele tipo de perfil. O mesmo ocorrerá quando o magistrado cadastrar novo pretendente, recebendo imediatamente a notificação da existência de crianças com as características desejadas.

A inovação funcionará, inclusive, nos casos de crianças e pretendentes cujos processos estejam tramitando em varas de comarcas diferentes. Nessas situações, sempre respeitando a precedência na fila de adoção, os juízes responsáveis serão notificados eletronicamente para que entrem em contato um com o outro e, assim, deem prosseguimento à adoção.

Luiza de Carvalho Fariello
Agência CNJ de Notícias