Proibição do nepotismo é principal ação do CNJ nos seis primeiros meses de funcionamento

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O veto ao nepotismo no Judiciário pode ser considerado como a principal realização do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nos seus primeiros seis meses de atuação. Além da Resolução nº 07, que proibiu a contratação de parentes até terceiro grau para o exercício de cargos e funções comissionadas nos tribunais, o Conselho decretou o fim das férias coletivas nos Tribunais de 2º grau e estabeleceu a promoção de magistrados por voto aberto e fundamentado.

O CNJ adotou ainda medidas como a autorização da unificação do recesso forense de final de ano, atendendo a requerimento de entidades de advogados, e apreciou projetos relativos à criação de cargos no Judiciário da União, apresentando pareceres ao Congresso Nacional buscando enquadra-los em limites orçamentários e torna-los mais racionais.

O ministro Nelson Jobim, que preside o STF e o CNJ, considera excelente o trabalho desenvolvido no período. "O nosso foco é o cidadão, pois somos servidores da Nação brasileira. Demos em 2005 passos efetivos para uma Justiça mais eficiente. Essa é a grande contribuição que podemos dar para o desenvolvimento econômico e a justiça social", destaca Jobim.

Segundo o conselheiro Paulo Schmitd, entre as principais conquistas está o enfrentamento da condenável prática do nepotismo. "Essa é a medida que mais teve repercussão e que mais angariou simpatias, pois desprivatiza a coisa pública. Agora, mais do que nunca, será importante o apoio da sociedade, das entidades da magistratura e de servidores públicos, para que essa prática seja eliminada", afirmou ele.

Para o conselheiro Douglas Rodrigues, apesar das dificuldades de ordem estrutural, o CNJ tem conseguido demonstrar à sociedade brasileira o compromisso com a construção de um novo Poder Judiciário. "Algumas das decisões proferidas, rompendo com práticas administrativas censuráveis, estão incomodando os setores mais retrógrados do Poder Judiciário. São emblemáticas, nesse sentido, as decisões que envolveram o fim do nepotismo e da votação secreta e sem fundamentação nas promoções por merecimento de juízes", disse Douglas.

Competência – Criado em junho deste ano para exercer o chamado "controle externo do Judiciário", o CNJ tem como atribuição zelar pela autonomia daquele Poder e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, expedindo atos normativos e recomendações. Outra função do Conselho é o planejamento estratégico e a elaboração dos planos de metas e programas de avaliação institucional.

Cabe ainda ao CNJ receber reclamações contra membros ou órgãos do Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro. No exercício dessa atribuição, pode julgar processos disciplinares, determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas.

De acordo com o conselheiro Paulo Lobo, outro ponto importante nestes seis meses de atuação é que "o Conselho afastou o receio de se transformar em uma grande corregedoria, privilegiando uma agenda propositiva, com iniciativas que têm recebido o aplauso da população e da mídia, mediante resoluções e recomendações".

"Temos aqui que ressaltar a aproximação das associações representativas da magistratura nacional, que perceberam que o CNJ é parceiro nas lutas comuns em prol de um Judiciário mais democrático, mais eficiente, mais acessível e mais transparente", disse Lobo.

Corregedoria – A corregedoria é responsável pela apreciação das reclamações disciplinares protocoladas no CNJ. Entre suas principais ações está a abertura do primeiro processo disciplinar contra um desembargador. Segundo a reclamação, o magistrado teria recebido uma camionete S-10 para influenciar o resultado de ação judicial em favorecimento a um Sindicato de Belo Horizonte e Região Metropolitana.

Outra ação relevante foi a determinação para o afastamento do Desembargador Luiz Zveiter do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), que acarretou a publicação da resolução número 10, estabelecendo prazo até 31 de dezembro de 2005 para o desligamento de todos os atuais membros do Judiciário que exerçam funções nos Tribunais de Justiça Desportiva e em Comissões Disciplinares. Segundo afirmou o corregedor nacional de Justiça, ministro Antonio de Pádua Ribeiro, hoje são cerca de cem os magistrados que se encontram ocupando essas funções em todo o Brasil e que deverão ausentar-se dos cargos.

Para o ministro, não é permitido ao  desembargador o exercício de cargo de direção ou cargo técnico de sociedade civil, associação ou fundação de qualquer natureza ou finalidade. Essa, como argumentou em seu voto, é a forma que a sociedade encontrou de assegurar a independência e o cumprimento, pelo magistrado, de seus deveres e funções, com presteza, correção e pontualidade.

Outra decisão importante foi a que determinou prazo de 60 dias para a Justiça de Goiás julgar uma ação demarcatória que tramitava há 38 anos na Comarca de Iaciara. A medida teve como objetivo coibir a morosidade no Judiciário e garantir o respeito ao direito constitucional à razoável duração dos processos judiciais.

Comissões – As seis comissões do CNJ produziram vários resultados durante esse primeiro semestre. Diagnósticos foram traçados e agora o Conselho se prepara para a adoção de medidas que vão aperfeiçoar os mais diversos segmentos do Judiciário.

Esse é o caso, por exemplo, da Comissão dos Juizados Especiais que elaborou uma verdadeira radiografia do funcionamento daquele setor. A pesquisa foi realizada com base em informações enviadas ao Conselho pelos juízes que atuam naqueles órgãos.

Com base nessas informações, o grupo recomendou aos Juizados Especiais Federais e Estaduais a definição de metas regionais, estaduais e seccionais para os indicadores estratégicos; a elaboração de planos de ação para atingir as metas; a elaboração e implementação das prioridades operacionais estratégicas estabelecidas pelos juizes coordenadores dos juizados especiais; o incentivo a fóruns e debates sobre questões procedimentais e mudanças legislativas nos juizados especiais.

As medidas também foram recomendadas aos tribunais, conselhos administrativos, escolas de magistratura e diretorias de foro.

Já a Comissão de Informatização criou o Banco de Soluções do Judiciário, que pretende reunir todos os sistemas de informática desenvolvidos pelos próprios tribunais e ainda os adquiridos – com todos os direitos reservados – por aqueles órgãos. O banco ficará disponível a todo o Poder Judiciário. Assim, cada tribunal, por meio desse intercâmbio de informações, poderá ter acesso aos sistemas utilizados nas outras Cortes de Justiça, adquirir novos programas e aprimorar seu respectivo setor de informática.

Com isso, o grupo espera vencer um dos principais problemas enfrentados pela área de informática dos tribunais: a grande diversidade de sistemas e modelos adotados.

A Comissão de Estatística apresentou as diretrizes para a consolidação do sistema que vai colher dados sobre o Poder Judiciário de todo o País. Segundo a Emenda Constitucional nº 45, cabe ao CNJ elaborar um relatório estatístico semestral sobre processos e sentenças da Justiça e um anual, propondo providências para melhorar a gestão daquele  Poder e também das atividades do Conselho. O segundo relatório estatístico nacional sobre o Judiciário está em fase de validação final e será divulgado em fevereiro próximo. "Um sistema nacional de estatísticas confiável, transparente e eficiente é um passo imprescindível para que a agenda de reformas gerenciais do Judiciário prossiga", destaca o conselheiro Joaquim Falcão.

Ouros três grupos trabalham dentro do Conselho: as Comissões sobre Especialização de Varas, Câmaras e Turmas; de Fundos, Depósitos Judiciais e Custas, além da que discute a regulamentação da Emenda Constitucional número 45.

Segundo a conselheira Germana Moraes, a partir das propostas das comissões, será possível constituir grupos permanentes e formular um planejamento para a reforma de gerenciamento. "O CNJ inaugurou uma prática de gestão participativa, ao expedir aos órgãos judiciários a Recomendação nº 1, que contém sugestões feitas pelos juízes coordenadores para o aperfeiçoamento dos Juizados Especiais", afirmou ela.

Já para o conselheiro Cláudio Godoy, "a atuação das comissões, algumas com relatórios já apresentados e propostas veiculadas, é um vigoroso exemplo do quanto pode ser importante a existência de um órgão nacional de fixação de políticas de gestão. Assuntos como a informatização, a especialização, o funcionamento dos Juizados foram levados a extenso debate, inclusive, o que é relevante, com a elaboração de um diagnóstico detalhado, sem dúvida móvel da construção de uma nova mentalidade administrativa do Judiciário".

Ouvidorias – O Conselho Nacional de Justiça abriu, no último dia 13 de dezembro, consulta pública para a elaboração de resolução que cria as "Ouvidorias de Justiça". Os novos órgãos vão funcionar como representações do CNJ nos Estados e terão entre suas funções receber reclamações por excesso de prazo no julgamento de processos e apresentar, anualmente, sugestões de medidas para a melhoria do Judiciário local. As contribuições para elaboração da nova norma devem ser enviadas ao Conselho até o próximo dia 11 de fevereiro, como informado no site do CNJ.

De posse das sugestões, o CNJ vai distribuí-las a um conselheiro, para a relatoria do processo e confecção da nova proposta de resolução. O assunto deve voltar ao plenário do Conselho em março; a implantação das ouvidorias será no mês de abril.

"Os principais objetivos dos novos órgãos são aproximar o CNJ da população, visando ampliar o acesso aos serviços judiciários e aprimorar a sua eficácia", esclarece o juiz Flávio Dino, que coordena os trabalhos da Secretaria Geral do CNJ.  

Apoio – Uma das principais conquistas do CNJ foi a obtenção do apoio da comunidade jurídica, que na época de criação do Conselho foi em grande parte desfavorável a ele. Segundo o conselheiro Paulo Schimitd, "o que fica claro – e as medidas normativas do CNJ dão mostras disso – é que não está em curso uma guerra pela disputa do poder, mas sim um processo de reconstrução do judiciário, com norte na transparência, na democracia interna e busca de melhor prestação jurisdicional".

No caso do nepotismo, por exemplo, o Conselho recebeu manifestações de apoio de entidades como o Conselho Federal da OAB, da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).

Além disso, pesquisa recente desenvolvida pela Fundação Getúlio Vargas para a AMB mostrou que 70% dos juízes repudiam a prática do nepotismo. Ainda de acordo com o estudo, mais de 90% concordam com a votação aberta para a promoção de magistrados. Portanto, fica evidente que as decisões do Conselho têm agradado à magistratura, levando em consideração que esse levantamento é um dos mais completos já realizados em todo o país.

"O controle, interno ou externo, limita o poder e  isso, com certeza, não é bem visto para quem o detém. Está justificada aí, a resistência apresentado ao CNJ. Ouvi de um magistrado que, para alguns Tribunais, até a criação do Conselho, o céu era o limite. Isto   incentiva-nos  a continuar no caminho traçado , ou seja, fortalecer o Judiciário e colaborar para a solução dos problemas da Justiça brasileira, pelos quais todos somos responsáveis", afirmou a conselheira Ruth Carvalho.

Desafios e Perspectivas –  Para o próximo ano, um dos principais assuntos que o CNJ vai tratar é a definição do teto salarial da magistratura. Tema polêmico, o Conselho recolheu informações e sugestões com os tribunais e com as associações, visando normatizar nos próximos meses essa questão, que apresenta tópicos ainda "dúbios" sobre a aplicação da Emenda 47/2005 e da Lei 11.143/2005, que fixou teto para todos os servidores públicos do Brasil, nos três Poderes.

Entre os pontos mais controversos está a definição de quais as verbas indenizatórias que devem ser incluídas no cálculo do teto.

Além disso, segundo o conselheiro Alexandre de Moraes, 2006 será o ano em que o Conselho poderá planejar estrategicamente a própria carreira do Judiciário, desde a formação das bancas de concurso e os requisitos para ingresso na magistratura, até os cursos de aperfeiçoamento e a Escola Nacional da Magistratura.

"Acredito que o próximo ano será focado para as duas grandes missões do CNJ: a agilização da prestação jurisdicional e ampliação do acesso à Justiça", afirmou ele.

Neste ponto, há um consenso entre os membros do Conselho. O conselheiro Jirair Meguerian acredita que o principal e o mais difícil desafio a ser suplantado pelo CNJ é o da morosidade da Justiça. "A lentidão é fruto mais da legislação processual e da exagerada possibilidade de recursos do que do mau funcionamento do próprio Judiciário. Ocorre que a sociedade não quer imputar responsabilidades, quer ver soluções, daí a importância desse fato, constituindo-se no maior e mais difícil desafio a ser enfrentado pelo Conselho", justifica Jirair.