A excessiva judicialização de questões relativas à saúde, tanto pública quanto privada, levou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a criar, por meio da resolução nº 238, os Núcleos de Apoio Técnico Judiciário para Demandas da Saúde (NAT-JUS). No Amapá, o núcleo funciona há seis meses no Fórum da Comarca de Macapá, e nesse período já adensou notas técnicas e recomendações em 100 processos.
A coordenadora do NAT-JUS no estado, Deire Sandre Corrêa, informa que essa preocupação do CNJ surgiu em 2010, com a constatação da excessiva judicialização das questões relativas à saúde, quando o Judiciário acabava interferindo nas políticas públicas do setor. “Isso ocorria, por exemplo, quando uma decisão fazia o sequestro de valores para beneficiar um único paciente, deslocando recursos que seriam para políticas voltadas para a coletividade. As políticas públicas de saúde acabavam se desestruturando”, explica Deire.
O CNJ fiscaliza os tribunais para o cumprimento da resolução nº 238. O Tribunal de Justiça do Amapá implantou o NAT-JUS em novembro de 2016, com a resolução 1111/2016, por meio de um Termo de Cooperação Técnica com o Governo do Estado e a Prefeitura de Macapá. O TJAP ofereceu a estrutura física e um servidor. O estado disponibilizou dois médicos, que também são professores do curso de Medicina da Unifap. A Prefeitura, por sua vez, ofertou um farmacêutico. Além dessa equipe permanente, um enfermeiro e uma médica psiquiatra, do quadro do Judiciário, participam quando há demanda específica de suas áreas.
Para que o trabalho da equipe seja feito com excelência, o CNJ promove constante qualificação do corpo técnico, por meio de acordo de cooperação com o Ministério da Saúde e o Hospital Sírio Libanês.
Deire explica que as demandas nascem nas varas cíveis ou de fazenda pública e exemplifica: “Um medicamento que não está sendo fornecido pelo Estado, o paciente ingressa com ação na justiça, mas o juiz não possui conhecimento técnico específico para saber se há um outro medicamento que possa substituir aquele reivindicado, ou se existe risco real para aquele paciente ao ficar sem o medicamento. O processo é encaminhado para o NAT-JUS, para que seja emitida uma nota técnica, que é adensada ao processo, subsidiando o juiz na sua decisão”.
A médica Maribel Santos integra o NAT-JUS e vê no projeto um forte instrumento para organização do sistema de saúde no Amapá. “Quando o desembargador Carlos Tork nos chamou colocando a proposta, entendi que seria um marco para algo que sempre esperamos na saúde pública. Acreditamos que o NAT-JUS é um grande instrumento que pode interferir para a organização desse sistema”, avalia.
Na percepção da médica, o NAT-JUS executa um processo educativo a partir da informação. “O Judiciário recebe uma informação técnica, sugerindo ou indicando uma decisão mais tranquila e justa”, afirma. A responsabilidade da equipe, ao elaborar uma nota técnica, exige pesquisa detalhada nas bases de dados que são reconhecidas nacional e internacionalmente. “Precisamos dar informações atualizadas sobre procedimentos, cirurgias, medicamentos e outros. A partir dessa informação é que o juiz vai tomar sua decisão”, explica.
A judicialização da saúde não ocorre apenas quando se trata de serviço público, mas também envolve a rede privada. “O NAT-JUS alcança a capital, os municípios, os planos de saúde, as entidades privadas em todas as situações”, esclarece a médica.
Diferente das regiões Centro Oeste, Sul e Sudeste, onde predomina a judicialização por medicamentos, nas regiões Norte e Nordeste, a predominância se dá por conta de procedimentos médicos. “Recebemos processos, em número significativos, por exemplo, sobre endoscopia digestiva ou urografia, procedimentos básicos, que seriam rotinas no serviço”, relata a médica. As cirurgias ortopédicas e a falha nos equipamentos de exames de imagem também são recorrentes nos processos.
Maribel Santos defende o fortalecimento de uma rede de órgãos que atuam na busca de soluções para as demandas de saúde. “Aqui, no NAT-JUS, estamos sentindo que há necessidade de conversar com SESA, SEMSA e Ministério Público, para que possamos entrar em alinhamento das nossas ações, evitando que muitas questões cheguem à Justiça”, finaliza.
Fonte: TJAP