Há no Brasil 49 juizados especializados em violência doméstica contra a mulher. “Os juizados estão abarrotados de processos”, afirmou nesta quarta-feira (24/11), em João Pessoa, a juíza Adriana Ramos, presidente do Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid), na abertura do segundo encontro da categoria. Para ela, o número de varas especializadas é insuficiente, e as existentes sofrem com a falta de estrutura e de equipes especializadas.
Na palestra de abertura do II Fonavid, a ministra Eliana Calmon, corregedora Nacional de Justiça, ressaltou que quatro estados, entre eles a Paraíba, ainda não implantaram varas especializadas em violência doméstica. Além disso, os tribunais não têm dado a devida importância aos juizados que tem que estar estruturados para cumprir seu papel e coibir a violência contra a mulher. As vítimas são principalmente as mulheres de famílias de baixa renda. Outro problema é que o trabalho exige qualificação do magistrado.
“Lamentavelmente não temos selecionado bem os magistrados que estão à frente desses juizados”, afirmou. Os tribunais tratam o assunto como “uma coisa menor”, quando na realidade a violência doméstica envolve relações humanas, o que exige maior preparo do magistrado. Ela citou como exemplo o caso de Elisa Samudio, namorada de Bruno, ex-goleiro do Flamengo, que acabou assassinada. Elisa pediu proteção várias vezes e a juíza negou.
Eliana Calmou citou também o caso do juiz que, ao julgar uma causa envolvendo a aplicação da Lei Maria da Penha, atacou a mulher, responsabilizando-a por todos os males do mundo. “É estarrecedor”. A corregedora foi aplaudida pelos magistrados ao contar que defendeu o afastamento do juiz para submetê-lo a um exame de sanidade mental.
Todos equívocos e interpretações estão sendo registradas no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), informou a ministra. “Quando o CNJ exige que os estados façam especialização não é perfumaria, é de importância fundamental”, explicou.
Segundo a desembargadora Maria de Fátima Bezerra Cavalcanti, presidente em exercício do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), o tribunal fez um levantamento dos processos envolvendo violência contra a mulher e concluiu que a quantidade não justificava a criação de um juizado especial. Depois mudou de posição. Aguarda a aprovação da nova lei estadual da magistratura para instalar a vara especializada.
Para a juíza Adriana Ramos, com a Lei Maria da Penha os juízes ficaram muito expostos e aumentou muito a cobrança da sociedade, que não aceita pena que não seja a prisão. “Será que as mulheres que sofreram com a violência querem o encarceramento? A pena de prisão é a melhor para esses casos?”, questionou a presidente do Fonavid.
Polêmica – A Lei Maria da Penha, como ficou conhecida a lei que pune a violência domestica contra a mulher, causou polêmicas e foi até considerada inconstitucional. E uma interpretação equivocada do princípio constitucional da igualdade, afirmou Eliana Calmon. A sociedade brasileira ainda é machista e discriminatória. “As mulheres que alcançam um certo nivel não conhecem a discriminação, não sofrem na pele como as mulheres de baixa renda”, afirmou.
Um exemplo de discriminação é que as mulheres ingressavam no Judiciário por concurso, mas não ascendiam a cargos de maior relevância. “Ate 1995 não tínhamos nenhuma mulher nos tribunais superiores”, relembrou Eliana Calmon, a primeira mulher a ocupar o cargo de ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Em política pública temos que discriminar para igualar”, comentou. Para ela, a Lei Maria da Penha tem como objetivo principal a proteção da família. A proteção a mulher é conseqüência.
Gilson Euzébio
Agencia CNJ de Noticias